Natal é tempo de dar e receber presentes. Sei que o espírito da festa se expressa melhor em dar do que em receber. Trata-se de uma ocasião em que o outro se constitui em alvo da nossa generosidade. Nela não cabe o cinismo com o qual um conhecido político cunhou a frase: “É dando que se recebe.”
Eu sempre dou mais do que recebo. Não faço lista, deixo isso a cargo da minha mulher. Mas não há dúvida de que é preciso dispor de uma verba extra para atender aos que, por um motivo ou outro, fazem jus aos mimos.
Manda o espírito natalino que a doação seja espontânea. Em tese, devemos dar presentes àqueles por quem temos apreço e sobretudo estima. Antes de ser uma “coisa” o presente é um sinal de afeto, um gesto de carinho. Na prática não é bem assim. Com exceção de alguns parentes e amigos, para os quais a dádiva sai mesmo do coração, presenteamos para evitar ressentimentos. Para atender à expectativa dos que, se nada recebessem, nos hostilizariam pelo resto do ano.
A publicidade tenta nos convencer de que dar presentes é uma forma de demonstrar amor. Por baixo desse argumento altruísta, no entanto, operam os insaciáveis tentáculos do consumo. Para satisfazer o círculo restrito e remoto de presenteáveis muitas pessoas se endividam, vendem objetos de valor, entram no cheque especial – o que vem a ser uma mina para os bancos.
Um dos efeitos desse imperativo de brindar a todos é que os presentes caem de qualidade. Não importa o que é dado, mas o gesto de dar. Pode ser uma caixa de chocolate rançoso, um daqueles vinhos capazes de provocar enxaqueca em elefante ou um perfume que também pode ser usado como repelente de insetos. Muitas vezes o presenteado nem abre a embalagem; guarda-a para passar a outrem e, assim, também cumprir o ritual.
Um meio comum de dar presentes nesta época é a brincadeira do amigo-oculto, que envolve pessoas do mês grupo social ou profissional. Essa prática tem seus riscos; o beneficiário, como o nome diz, é secreto, e pode ser alguém pelo qual não se tem estima. Nesse caso vai ser necessária alguma hipocrisia para lhe exaltar as qualidades naquele breve discurso que antecede a entrega. Isso pode ser motivo de queixa, ou mesmo de ruptura nas relações, já que muitas vezes o presenteador procura traduzir no que escolhe o que sente pelo outro.
Enfim, sou pela seletividade na escolha de quem deve receber presentes. Devemos presentear muito poucos e lhes dar o melhor que pudermos comprar. Entrariam na lista apenas aqueles que se lembraram de nós durante o ano, nos sorriram mais do que fizeram cara feia, ou de algum modo nos ajudaram a tocar a vida.
A essas pessoas daríamos um presente personalizado, com dizeres escritos num caprichado cartão. Aos outros bastariam os votos – sinceros! – de um Feliz Natal. A data, afinal de contas, pede isso.