Com a esticada dos meus dias, curto o privilégio de ver a cidade de 1951 com seus 119 mil habitantes, na grande e rica João Pessoa de hoje, beirando o milhão. Rica, sim, com o metro quadrado de suas construções de elite o mais caro do Nordeste e um dos mais ansiados pelos que já renegam a angústia de vida no espaço-tempo das megalópoles.
É “um caminho sem volta”, como pressagia o relato de quem se dedica a acompanhar o salto da cidade provinciana para a que sobe da cota zero para penhascos da nova construção civil.
O informe de Glauco Morais neste jornal dá em que pensar, sobretudo num vivente da minha filosofia. Vejamos literalmente: “No último dia 17 de novembro, um seleto grupo de corretores de imóveis teve a chance de participar do Setai Connection, evento promovido pelo Grupo Guedes Pereira. Na ocasião, os gêmeos e corretores mais famosos do Brasil, Gustavo e Flávio Mendonça, replicaram a experiência adquirida no trato com produtos de alto padrão, as variáveis que circundam os imóveis de luxo, assim como os perfis e nuances dos clientes desse mercado”.
Empreendimento Setai Sandro Barros (J. Pessoa) Grupo GP
Por aí fica-se sabendo do “mais luxuoso” empreendimento em construção na Praia do Cabo Branco, o Setai Sandro Barros com assinatura de marca internacional. Decorrência de João Pessoa como novo destino de lazer capitalista do Centro-Sul. Explicação oferecida: um voo de São Paulo a João Pessoa se faz em três horas, tempo muitas vezes impossível de ser realizado de carro entre São Paulo e o litoral paulista. Some-se a isto a “sensação de paz e tranquilidade” propagada pela mídia espontânea. Sim, porque continuamos órfãos da televisiva, sem diferença de 1985 quando não conseguimos uma vinheta, uma linha da mídia brasileira para a significação nacional do nosso quarto centenário, um dos momentos significativos de nossa história.
Reconheça-se ou não, fizemos por isso. E me dou por feliz em manter-me entre os testemunhos, desde que José Américo realizou o sonho do presidente João Pessoa de levar a Pedro II, confronte o Palácio, até a beira-mar de Tambaú.
Depois da usina de luz (Energisa de hoje), tudo era mato. Galdino, velho contínuo do Palácio, tinha granja e no meio dessa granja uma boa casa herdada. O bonde passava atrás. Às direitas era o grande sítio de D. Julia Freire, com moradores pagando foro e a Prefeitura tentando seguir o traçado que veio dar na Torrelândia, homenagem do povo a Joaquim Torres, o empregado que fechava os olhos a quem atrasava o pagamento.
Tudo andava muito devagar: a estrada de Cabedelo, importante acesso ao nosso porto de exportações, veio livrar-se do areeiro no governo de João Agripino. A estrada central, sonho secular, a mesma coisa, deixada antes do Cajá em 1955. O Estado, com seu imposto próprio, o IVC, é quem bancava tudo. Nas safras do ouro branco permitiu a remodelação arquitetônica promovida por Camilo de Holanda. Na presidência de Epitácio, Sólon de Lucena conseguiu dar corda a Guedes Pereira, o prefeito que fez de uma lagoa infecta, onde a polícia e os feirantes lavavam os cavalos, o símbolo ou marca digital do nosso bucolismo.
Pulando muitos desses realizadores, governadores que foram prefeitos, e os sucessivos Damásios e Oliveiras Lima, chegamos aos gestores de hoje com a cidade querendo atravessar o rio-mar através da grande ponte que o avanço do turismo e da construção de elite prioriza em seus planos desde o governo Cássio. Doutor João Azevedo tem três anos para isto. Para mim, particularmente, não será a ponte que o grande investimento aguarda, mas a passagem mais fácil e até mais própria para a Igreja da Guia com seus cajus a despertar desejos nos anjos barrocos.