Gosto de falar do que entendo e do que vivenciei durante as quase cinco décadas que eu dediquei ao ensino. Por isto mesmo, em determinados momentos, acho importante fazer a diferença entre conhecimento e opinião, o que não constitui nenhuma novidade, tendo em vista que Platão cansou de fazer isto, nos embates de Sócrates com os sofistas. Para facilitar o entendimento, sugiro a leitura gostosa e rápida do diálogo Íon.
Em quase cinquenta de ensino, tendo passado por todos os níveis, da 5ª série à pós-graduação, com a experiência de supervisão de um pós-doutorado, e de ensino, durante 4 semestres, na Universidade de Paris X – Nanterre, creio haver-me habilitado para falar de Bibliotecas e de Educação.
Fundei duas bibliotecas, uma no Colégio 2001, quando ali era professor, após o meu amigo, o proprietário e diretor Roberson Ramos de Vasconcelos, ter concordado com a minha solicitação. Outra, na Universidade Federal da Paraíba. Sei quanto custa instalar uma biblioteca do zero. Sei quanto custa manter uma biblioteca, com a preocupação constante de atualização do seu acervo. Some-se a isto a necessidade de um ambiente preparado para acolher os livros e os que os consultam, o que supõe a existência de catalogação, de fichários, e, claro, de bibliotecários no setor de serviço.
Não sei como se encontra a biblioteca do antigo 2001, vez que o colégio já não existe com este nome. Falarei, portanto, da biblioteca do Curso de Letras Clássicas, da Universidade Federal da Paraíba. Depois de muita luta, para evitar o desaparecimento da Língua Latina do curso de Letras – é isto mesmo que vocês estão lendo! –, levei a guerra adiante e consegui fundar, no ano de 2009, o curso de Licenciatura em Letras Clássicas, habilitando os seus estudantes ao ensino do grego e do latim.
Como parte do projeto, o curso teria direito a uma sala e a uma compra de livros, que deveriam ser integrados à Biblioteca Central. Recebemos a sala, não sem uma vigilância diária, para que ela não fosse utilizada como moeda de troca, nas vergonhosas barganhas da política universitária. Dos livros, apesar dos reiterados pedidos, até hoje não tivemos notícia. Solicitamos, para que se tenha uma ideia, a coleção completa dos clássicos greco-latinos da Les Belles Lettres de Paris, textos imprescindíveis para os estudiosos da área. O custo, na época, seria de cerca de 80. 000 reais, um troco diante das propinas que se distribuem neste país. Nada. Não chegou um único volume.
O curso, no entanto, precisava de uma biblioteca, pelos motivos óbvios – não se estuda sem livros, e porque haveria, como de fato ocorreu, uma visita do MEC para a sua avaliação. Sem biblioteca, receberíamos uma nota pífia e estaríamos fadados ao fechamento... Não podíamos contar com o acervo da Biblioteca Central que, na nossa área, era irrelevante. Acredito que continue assim. Reuni os professores, conversei com eles e decidimos formar a nossa biblioteca, comprando livros no exterior e dividindo a despesa entre nós. Foi o primeiro passo. Clamei por doações, elas vieram e continuam vindo, contribuindo para a formação de nossa biblioteca.
Depois que me aposentei, em 2022, fiz um pente fino na minha biblioteca pessoal, juntamente com a de minha esposa, professora do mesmo curso, e fizemos nova e substancial doação. Temos uma biblioteca, num bom ambiente, com atendimento aos alunos que nos procuram. Verba governamental? Zero! Estamos, na realidade, ameaçados de ter que integrar a nossa biblioteca à setorial, o que já foi ventilado pelos visitadores...
Como ficou a avaliação do curso pelo MEC? Passamos, nesse meio tempo por duas avaliações. Os professores que vieram nos avaliar, não encontraram problemas na biblioteca, na sala ou na capacitação dos professores. Mas, nas duas vezes, fomos avaliados com a nota 4 e não com 5, a nota máxima, por questões alheias à nossa alçada: Nossa sala, situada no segundo andar, era e continua sendo, inacessível a quem tem problemas de locomoção, pois esqueceram de colocar no projeto a construção de rampas de acesso...
O sentido deste texto, que cobre um brevíssimo espaço de tempo de 13 anos, é para que se entenda que educação, ensino universitário e pesquisa não se fazem com discurso, mas com grande trabalho e com investimento permanente, o que não existe, por não existir um Projeto de Estado para a Educação, colocado como cláusula pétrea na nossa Constituição. Projeto que não existe, nunca existiu e não existirá, porque não interessa a quem, em qualquer nível, põe as garras no poder. Tem razão, pois, o grande poeta Gregório de Matos, “quem tem mão de agarrar ligeiro trepa”.
Por outro lado, o que escrevo, já há bastante tempo, sobre educação não é uma opinião minha, mas uma argumentação proveniente de um conhecimento vivenciado como professor, que me permite vislumbrar como deveriam ser as escolas e as bibliotecas. Argumentação, claro, aberta ao debate.