Há anos que deixei de ir ao cemitério no Dia de Finados. Justificava que aquilo era bobagem, pura vaidade para dar satisfação aos outro...

Hodie mihi, cras tibi

cemiterio dia finados epitafio
Há anos que deixei de ir ao cemitério no Dia de Finados. Justificava que aquilo era bobagem, pura vaidade para dar satisfação aos outros e que não servia de nada para quem já tinha partido.

Neste ano, no entanto, mudei de pensamento e fiz diferente: comprei flores, acendi velas e andei por entre as alamedas estreitas da “última morada” de minha cidade, Pocinhos, parando em vários túmulos para ver fotos e ler epitáfios.

cemiterio dia finados epitafio
PMBH
O que me levou a mudar de ideia? Bem, creio que realmente a visita àquele lugar não é mesmo para os mortos. É para que os vivos ressignifiquem a própria vida e pensem na sua condição de reles mortais. No mais, encontramos tanta gente que não víamos nos últimos tempos! Parar para conversar, lembrar de algum fato da juventude e ainda ficar sabendo a quantas anda a vida dos outros fazem toda a diferença.

O clima é de festa. Os jazigos, todos bem limpos (pelo menos nessa data), com muita água, sabão e cera líquida. São flores para todos os lados, em jarros de tudo quanto é tipo e tamanho, e as fotografias, antes guardadas e amarelecidas, ficam expostas para o deleite de olhares curiosos, porém consternados.

Alguns morreram faz tempo e outros se foram recentemente. Para os que nos deixaram há pouco, a atenção é redobrada e especial. Ainda restam lágrimas e a incredulidade diante do acontecido. “Era tão jovem”; “Uma pessoa tão boa”; “Descansou”; “Agora está nos braços do Pai”.

cemiterio dia finados epitafio
Agência Brasília
Não deixa de ser uma tradição interessante. Se o morto puder ver aquilo tudo, as homenagens, a reverência, sua vida passada a limpo e laureada pelo destaque das coisas boas que fez e representou, talvez seja um conforto para ele, por ser lembrado, quer nas reminiscências adormecidas que vêm à tona, quer nas orações feitas às pressas, nas palavras de carinho, repetidas cada vez que alguém se aproxima uns dos outros, na saudade esmaecida, no entanto, naquela ocasião, ativada e restabelecida.

Valeu a pena ter ido ao cemitério no Dia de Finados, mesmo com o sol escaldante, e disputar espaço entre as lápides tomadas por pessoas. Valeu também a pena ler de novo a famosa frase em latim que me intrigava quando eu ia lá, afixada na entrada do campo-santo, bem em cima do pesado portão de ferro: Hodie mihi, cras tibi (Hoje eu, amanhã você).

Que essa dura sentença demore muito a se consumar. Amém!

cemiterio dia finados epitafio
Cemitério de Pocinhos (PB) Acervo da autora

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também