No livro A República (380 a.C.), o filósofo Platão (428 a.C. — 347 a.C.) apresenta os diálogos de seu mestre, Sócrates (470 a.C. — 399 a.C.). Neste trabalho, os dois pensadores gregos expõem a maneira de governar a cidade para garantir a dignidade dos cidadãos, descrevendo e conceituando a Justiça. São abordadas as divisões de poder e os tipos de caráter que devem prevalecer entre os ocupantes de cargos públicos, sendo também discutido o que é necessário para promover o bem-estar social.
A filosofia de Platão educa os cidadãos a serem bons para si e para os outros, com o intuito de torná-los virtuosos para a prática do bem. Para isso, é preciso estabelecer uma conexão com a metafísica e compreender os fundamentos de tudo o que existe e o propósito da existência. Também é necessário utilizar a dialética, que consiste em um método de diálogo cujo objetivo é a contraposição e contradição de conceitos para acessar uma ideia universal.
O idealismo platônico estabelece a distinção entre o conhecimento sensível e o inteligível. O conhecimento sensível está relacionado ao “Mundo material”, no qual a realidade experimentada é ilusória e enganadora, sendo percebida pelos sentidos do corpo. Já o conhecimento inteligível está no “Mundo das ideias”, no qual se apreende a correspondência exata entre uma afirmação e a realidade da coisa que ela descreve, ou seja, a verdade sobre as coisas e a essência de algo, que possui características de eternidade e imutabilidade.
A realidade intelectual, acessível pela razão na busca pela verdade, descreve os conceitos dos seres e os objetos existentes no Universo. No processo para compreender a essência das coisas há necessidade de substituir o sensível ao inteligível. Dessa forma, o ser humano se liberta das aparências para se abrir ao conhecimento das ideias verdadeiras. Em sua obra, Platão recorre à dialética, essencialmente dialógica. O diálogo é a melhor maneira de buscar a verdade e o único meio para se chegar ao consenso, estabelecendo o que se diz e a razão pela qual se diz.
Os dez capítulos de A República são compostos por diálogos sobre política, educação, amor, amizade, imortalidade da alma e outros temas. No décimo capítulo, o filósofo aborda a função das manifestações artísticas na formação moral dos cidadãos e a contribuição da arte na busca pelo conhecimento do mundo, aproximando-se assim da verdade contida no “Mundo inteligível”, e a necessidade de distanciar-se do “Mundo sensível”.
Conforme os diálogos do livro 10, a visão de Platão sobre a arte e o artista revela que tanto a poesia quanto as outras formas de expressão artística, como esculturas, pinturas, música e outras artes, são consideradas imitações depreciativas e miméticas. Ou seja, são representações das coisas e eventos capturados pelos sentidos. Essas formas de arte corrompem os indivíduos, afastando-os da verdade e resultando em opiniões confusas sobre ideias estéticas e a percepção do mundo. No entanto, no sétimo capítulo, que trata da “Alegoria da Caverna”, o filósofo grego apresenta a tese de que os cidadãos podem alcançar o conhecimento verdadeiro e escapar das ilusões superficiais.
Ao usar a imagem de uma caverna para descrever a realidade sensível à qual os seres humanos estão expostos, Platão descreve prisioneiros acorrentados e imóveis, que só podem ver as próprias sombras refletidas no fundo da caverna diante deles. São prisioneiros dos costumes, das práticas e dos hábitos, e estão destinados a enxergar as coisas de forma limitada, reduzida, como meras sombras. Quando há a possibilidade de libertação de um dos prisioneiros da caverna, mediante um impulso ou estímulo que nele desperte a curiosidade de ir além de seus limites, Platão retrata a transição para a libertação desses prisioneiros como algo complexo e penoso. A força do hábito faz com que ele se sinta confortável em suas antigas condições e estranhe a nova realidade. No entanto, gradualmente, ele se adapta à sua nova situação. É durante esse processo de adaptação que o prisioneiro se aproxima da verdade, primeiro olhando as sombras, depois os objetos, até finalmente poder encarar o próprio Sol, sem ser ofuscado por ele.
O Sol representa o grau máximo da realidade, a totalidade do ser, a própria essência do Bem (Mundo intelectual) — através da metáfora da luz como iluminação — tornando o invisível visível, contrastando com a escuridão e as trevas. Ao alcançar a visão do Sol, o prisioneiro conclui o processo de transformação de sua condição inicial, adquirindo conhecimento. Ele vê diretamente a fonte de toda a luz (o ser, a realidade) e compreende a totalidade, superando a visão parcial das etapas anteriores.
De acordo com Platão, as manifestações artísticas no “Mundo sensível” se distanciam cada vez mais da contemplação da verdade presente no “Mundo intelectual”. Ao criticar as ações do artista-imitador, o filósofo grego diz: “Portanto, a arte de imitar está muito longe da verdade e realiza tudo, aparentemente, atingindo apenas uma pequena parte de cada coisa, que não passa de uma aparição” (PLATÃO, 2011, p. 598a-e). No mesmo parágrafo, o pensador diz: “As multidões ignorantes não conseguem distinguir com clareza a imitação da realidade e assim aceitam os artistas miméticos como sábios e fontes confiáveis de educação moral” (Ibid., p. 598c-602b).