Os blocos de calcário cavados e arrastados penosamente por muques selvagens para terminar no mais suntuoso e melhor conjunto barroco “de todo o Estado do Brasil” - que é como “o livro das Grandezas” de 1618 considera a Igreja e Convento de Santo Antônio, da Paraíba – esses blocos continuam comunicando ao visitante de hoje a mesma forte emoção dos que se extasiaram ao subir os três degraus em curva ritmada anunciando o esplendor de arte e cantaria que os esperava lá dentro, em 1609.
Quatro séculos se passaram e a mão-de-obra tabajara, presumivelmente guiada por Frei Francisco dos Santos, pioneiro da arquitetura no Brasil, continua desafiante e nova.
O que é bom custa a envelhecer. Chega a morrer antes do tempo, como morreu a maioria dos poetas geniais, ou como morreram Crispim, Adalberto, Martinho, Juca Pontes, Barreto Neto, Jurandy Moura, Sivuca, espíritos que continuam a nos fazer companhia. Mas não envelhecem. Comparecem solidariamente a todas as nossas solidões. Nas mínimas coisas ou nas horas mais graves.
Houve um momento em que um refrão me sustentou: “Se Nathanael saiu desta (era o sanatório) por que não sairei também?” Crispim tentou ensinar-me a não gastar com o que não for preciso. Ele, como sempre o vemos, vestia bem, usava a mais bela gravata, tentava o melhor vinho, e quando, certa vez, reparei de leve sobre essa sua queda pelo supérfluo soube reagir sem qualquer leveza: “Seria supérfluo se não fizesse parte da minha natureza e, externamente, da minha civilização e da minha cultura”. Continua na contemporaneidade com um rosto, um riso, um olhar de claridade sempre novos.
Convento Santo Antônio Gilberto Sturcket / G. Earth
Lembrança ou luminosidade? As gotas do tempo que orvalhavam os seus cabelos jovens perdiam seu tempo.
O que é bom, pois, sobra em fadiga e tempo para envelhecer. E se a obra é de lei, como o conjunto de Santo Antônio e São Francisco, quanto mais anos, mais nova.
Acontece também com as coisas miúdas. Em 1954, auxiliar de tesoureiro da API, ganhei duas cadeiras simples da antiga Gerdal para a sala da casinha que eu acabava de alugar na Alberto de Brito. José Leal me deu as cadeiras porque estavam velhas de uns dez anos, encardidas, comprometendo a novidade do mobiliário que uma verba no orçamento havia garantido. Com o Coração de Jesus trazido por minha mãe do interior, uma mesinha de oratório de pés torneados e a máquina de costura comprada no ano das cheia, 1924, a Felix & Guerra de Alagoa Grande, a doação da cadeira fechou o firo.
Pois bem, é essa cadeirinha que vem me arrimando desde a primeira crônica escrita numa “Lettera” semi-portátil financiada pelo banco de Newton Rique, através da velha API. Superada, a “Lettera” está aqui numa brecha do guarda-roupa, ainda integrada ao meu veio de boas lembranças. E a cadeirinha continua imune ao tempo e aos desgastes de mais de seis décadas de assento.