Era uma tarde solitária. Não para nós. Para ela própria. Mas a solidão não era total. Havia vento, muito vento. Nuvens densas desfilava...

Que cante a vida

silencio solidao mar reflexao
Era uma tarde solitária. Não para nós. Para ela própria. Mas a solidão não era total. Havia vento, muito vento. Nuvens densas desfilavam rápidas pelo céu, o dia todo. Velozmente. Dançavam em variadas formas. Umas passavam por cima, mais lentas, mais iluminadas, outras corriam por baixo, escuras, rápidas. Talvez tenha sido essa correnteza de nuvens que carregou a chuva, ansiosamente esperada desde ontem...

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Tiffany
O vento é um grande protagonista dos cenários, das paisagens naturais. Não somente no céu mostra-se ágil e voluptuoso, mas igualmente cá embaixo, nas plantas, nos coqueiros, na relva, no capim. É admirável como em tudo ele se movimenta. E até canta pelas frestas das janelas, dos telhados. Canta e faz o mar cantar também, e mais alto. As ondas sempre aceitam seu convite à dança, animam-se e se ouvem com mais vigor.

Com as ondas o mar forma uma verdadeira orquestra. Se a gente parar e deixar-se pairar, poderá escutar suas nuances sonoras finamente variadas. Há todo tipo de voz, masculinas, femininas, infantis, sutis e robustas. E sua música, que chamam de marulho, é de uma riqueza fenomenal. Umas vozes se demoram em frases mais longas, outras são mais curtas. Umas ecoam ao longe, outras esbravejam bem perto. Graves, agudas, destacadas ou serenas, não há como dizer que o canto do mar é monótono. Nunca é o mesmo. Basta ter ouvidos e saber escutá-lo...

Eis que de repente a ventania some. Do nada. Tudo pára, até o instante. Agora, sem o sussurro do vento, faz-se um grande e profundo silêncio dentro de casa. E como é bom escutar este silêncio! Como é gostoso ouvir o som das coisas mudas.
silencio solidao mar reflexao
Piro4D
Nossas próprias pisadas, uma porta do armário ou uma gaveta que se abre, a água na torneira da pia, o zoar da geladeira, todos os ruídos ganham uma emoção de magia quando se irmanam à quietude. Barulho de chuva, então, nada mais inebriante.

A noite avança e o mar muda o tom. Seu canto agora soa longe e perto, ao mesmo tempo. Com eco e nitidez suas vozes continuam a se harmonizar com a calma e o sossego deixados pelo vento que se foi. E agora, será que chove? Seria completo, o paraíso. Chuva e silêncio só rimam com paz e aconchego.

Que coisa! Foi só falar que o vento sumiu, voltou a soprar uma leve brisa. Suavemente fria, macia, terna, carícia que envolve a pele e o doce momento. Pelo menos, isso. Já que o inverno está-se indo, idem as chuvas, que soprem as brisas, as ventanias, que cantem o mar, os grilos da noite, os bem-te-vis da manhã. Que cante a vida!

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  1. JOSE MARIO ESPINOLA23/9/23 19:10

    Deliciosa crônica. Especialmente para mim: o Vento é uma das personagens da minha vida. Junto com a chuva, a noite, as plantas, os bichos, as histórias de alma...
    Todos povoaram a minha infância, e ainda estão por aqui, me acompanhando.
    A brisa?! Ahh!!
    Que venham outras crônicas iguais a esta!
    Parabens, Germano!

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    Respostas
    1. Muito grato, ZM! Sua sensibilidade, reconhecida por quem o conhece, não surpreende

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  2. 👏👏👏👏👏👏👏👏❤️❤️❤️❤️❤️❤️❤️❤️🧵🪡✂️🍷

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  3. Ângela Bezerra de Castro23/9/23 22:25

    Linda é a crônica, em sua originalidade. Um texto todo elaborado a partir da sensibilidade auditiva. A expressão lírica eleva os sons da natureza à mesma dimensão da música.

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  4. Thalia Seixas24/9/23 16:30

    Tem toda a sua característica, seu design, seu traço...Com você subimos em ondas magníficas e chegamos em praias cheias de paz e do precioso silêncio que estes ambientes nos proporcionam!! Grata, amigo 'number one', por tão lindas palavras!!

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