Epigrama I
De como os poetastros, camelôs de sua própria arte, com pompa e circunstância, outorgam para si o título de poetas
O que diabo é ser poeta? me pergunto todo dia...
Qualquer um assim se elege ou o elege a poesia?
Pelos versos que eu leio, quase sempre com senões,
cada vez mais admiro o poeta que é Camões!
Epigrama II
Aos amigos e poetas João Trindade e Linaldo Guedes
Ser rimada ou não rimada não define a poesia;
rima é um componente, instrumento de eufonia.
Inefável, inaudita, tem essência, tem constância;
metro e rima são só forma; a poesia, substância.
A rigor, nem de palavras, necessita a poesia:
numa música, numa imagem se desvela e se anuncia.
Se a poesia é o que se cria, se o poema é o ser criado,
não prescinde da estesis, sempre do palavreado.
O poeta não faz metro, Aristóteles já dizia;
O poeta tece tramas, alma de toda poesia.
Epigrama III
Construí meus epigramas, já na curva descendente,
com a poesia submissa a uma língua maldizente.
E por fim o que me resta? O que isto a mim destina?
A poesia em desterro e uma língua mais ferina.
Epigrama IV
Epigrama a partir do trecho 245ab do Fedro de Platão, aos Poetas e candidatos a...
O delírio com que a Musa agracia o poeta
o desperta, o transporta e o leva à sua meta,
ordenando o seu canto e os feitos mais antigos,
e ainda educando os epígonos amigos.
O que à porta da Poesia, só de técnica munido,
bate e pensa que, perfeito, será logo conhecido,
é poeta inacabado, pois a Musa rejeitada
tornará, com os delirantes, a poesia eclipsada.
Epigrama V
Ao Catão de subúrbio...
O poeta rancoroso, com o dedo sempre em riste,
recrimina todo o mundo; a um exame não resiste.
Falastrão e acusador, de moral que crê sem jaça,
é relapso, contudo; a preguiça nem disfarça.
Acredita-se intocável, por se crer um bom poeta:
capitula o bom caráter e persiste o mau esteta.
Epigrama VI
A poesia não terá, talvez, só arte poética,
sendo o epigrama o relho, pra quem age contra a ética.
Epigrama VII
O poeta-em-lá-menor, com empáfia se entedia:
A notícia ele requenta e requenta até poesia.
Epigrama VIII
Definição do poetastro enfatuado
Vou fruindo meu poeta, lá dos Matos da Bahia,
perguntando do sucesso e de tanta idolatria
que se faz a um ignorante, um ser bruto sem igual,
tendo ele respondido com seu verso magistral:
“– Eu lhe digo, de início, com um verso três por dez,
e depois em redondilhos, quem não vale dez mil-réis:
Entre catervas de asno se meteu,
E entre corjas de bestas se aclamou,
Naquela Salamanca o doutorou,
E nesta salacega floresceu”.
Com a primeira explicação, já Gregório satisfez,
mas seguindo adiante, completou o entremez:
“O saber muito abatido,
A ignorância, e ignorante
Mui ufano, e mui farfante
Sem pena ou contradição:
Milagres do Brasil são”.
Eis aí, caros amigos, a ajuda de efeito,
de Gregório Matos Guerra, definido o tal sujeito.
Epigrama VIII
Incomodam minhas nugas a poetas laureados.
Se vos credes excelentes, porque estais incomodados?
Epigrama IX
Pior asno que existe é o asno enfatuado,
por dá cá aquela palha, já se toma por letrado;
manda todo o mundo ler e se vende como culto,
mas aquilo que publica, o diploma como estulto,
se tomando por poeta com um versinho tão raquítico,
um versinho ralo e reles, num poema sifilítico.
Se revolta quando fecha qualquer uma livraria,
a leitura, no entanto, nunca foi-lhe uma iguaria.
Seu nariz é empinado, é posudo, ar altivo,
mas no campo do saber, nunca passa de cattivo.
Quer saber reconhecê-lo, separá-lo da folia?
Muito fácil, pois um asno outro sempre elogia.
Epigrama X
De repente o Brasil, terra ruda e ignara,
é tomado de Ciência... – Nunca eu imaginara!
E quão múltiplo em saberes é do Face o morador:
É poeta, cientista, é jurista, historiador...
Mas os doutos que aqui troam, sem bemóis, nem sustenidos,
só expressam, em uníssono, o coral dos ressentidos.
Epigrama XI
O poeta da Eneida, sempre em Roma celebrado,
detestava exposição, se escondia incomodado.
Na província, é diferente; o poeta, a todo o custo,
com uns versos bem franzinos, quer a fama de venusto.
Epigrama XII
Os poetas miram alto, raros chegam aos astros,
mais comum é que ocorra se tornarem poetastros.
Epigrama XIII
Ambrosino já se vê, a medalha sobre o peito,
recebendo os encômios de escritor mais-que-perfeito;
o laurel de acadêmico, ostentando em pedestal,
e o broche na lapela, carimbando o imortal.
Ao espelho enfunado, num orgulho que transborda,
nem percebe mais a plebe – destacara-se da horda!
Não imagina Ambrosino, que à academia corre,
dar a outro orgulhoso, grande júbilo quando morre.