As idades já são avançadas. As peles, pintura gasta, reboco disforme, cimento esburacado, revelam mais que idades. Na verdade, indi...

Quietas ruas

parahyba joao pessoa nostalgia centro historico
As idades já são avançadas. As peles, pintura gasta, reboco disforme, cimento esburacado, revelam mais que idades. Na verdade, indicam o descuido dos entes próximos, os herdeiros, os habitantes, os passantes. Elas resistem, são guardiãs de muitas histórias, testemunhas de transformações. Os ossos, tijolos ou pedras, fortes, sustentam as estruturas e resistem aos desafios que os séculos impõem. O homem continua a ser, ora o inventor e restaurador, do mesmo modo o aniquilador que faz desmoronar as mais fortes com força bruta e tantas vezes estúpida.

Os tempos trouxeram visões diversas. Dos homens a guiar carros de bois e carroças puxadas a cavalos, aos bondes por também tração animal, os elétricos, os primeiros carros a gasolina, diesel e álcool. Os homens brancos coloniais e roupas espalhafatosas europeias, os negros fortes e escravizados e os indígenas também forçados a viver sem liberdades. Todos passaram por elas, subindo e descendo ladeiras, ampliando tudo no entorno.

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Centro Histórico de João Pessoa (PB) @fazendohistoria

As luzes noturnas das estrelas, das velas, lampiões, lamparinas, candeeiros à base de óleo de baleia. A rede elétrica produzida pela força da água em correntezas distantes no São Francisco. O chão da terra batida, das pedras sabão, dos paralelepípedos por fim cobertos pelo asfalto negro. Tudo foi pisado por pés descalços, de couro grosso de tanto andar, ou refinadas solas de finas e delicadas do pouco esforço.

Elas também foram confidentes de inúmeros amores. De rapazes passando com buquês de flores na mão, com caixas de chocolate ou lágrimas nos olhos. De garotas suspirando na janela, nas calçadas. De beijos ardentes em tantas épocas e nos parques e barracas da antiga Festa das Neves. E por elas desfilaram as marchinhas de velhos carnavais quando o lança-perfume era brincadeira inocente. Pacatas, foram palcos de serenatas noite adentro. E talvez até de duelos de morte.

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Festa das Neves / Ladeira da Borborema / Carnaval @Joao Luiz Pereira Neto

E foram passagem para grupos de estudantes, jovens em fardamento completo, com camiseta de abotoar devidamente ensacada, com bolso ostentando o emblema escolar, calça com vinco, cinto e sapato social engraxado a luzir. Também viram os modernos alunos de calças rasgadas da última moda, dos celulares conectados a todos os mundos, dos muitos estilos e todas as liberdades.

Nas noturnas solidões, talvez hoje elas chorem ou apenas ignorem os motivos do afastamento de muitas pessoas que deixaram de ver o rio e se foram a abraçar o mar. Eram tempos, até outros séculos, para algumas ruas que vão sendo ignoradas, esquecidas, maltratadas. O tempo que tudo muda, imparável, tempo que altera até o ritmo temporal, que até os nomes modifica

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Centro Histórico de João Pessoa (PB @Joao Luiz Pereira Neto
As ruas da antiga cidade de Nossa Senhora das Neves. Históricas ruas da velha Parahyba, da nova e antiga João Pessoa. Eram a Rua da Baixa (Rua Direita e hoje a Duque de Caxias), Rua das Convertidas (Maciel Pinheiro), a Estrada do Carro (Rua Barão do Triunfo), Rua da Imperatriz (Rua da República), Rua Nova (Rua General Osório). E as ladeiras de São Francisco e Borborema ligando a Cidade Baixa e a Alta.

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  1. 👏👏👏👏👏👏👏👏🪡✂️🧵

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  2. Excelente texto! Tomara que emocione os gestores e se planeje uma restauração nesses patrimônios que conta nossa história

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