No segundo domingo do mês agosto celebramos o Dia dos Pais. Fiz muitos almoços para o meu querido pai, e para os pais dos meus dois filhos. Eram momentos de compartilhar alegrias do domingo com a família. Mas também sempre tive um olho bem aberto para pensar sobre a paternidade e os pais ao meu redor. Não gostava muito do que via. Sempre me inquietei com a exaustão e sobrecarga da minha mãe. Amava/amo meu pai, mas estava sempre atenta às minhas questões sobre a sua ausência, o seu silêncio, e o seu lugar de liberdade e distância do dia a dia de uma casa com quatro filhas. Era assim em todas as famílias.
Mais tarde, eu própria senti na pele a exaustão física e mental de trabalhar, pensar, tocar a casa, e cuidar muito solitária dos dois filhos. Os pais? Presentes quando não tinham que sair dos seus caminhos todos – trabalho, compromissos e prioridades. Sempre sofri muito com essa falta de equidade no trabalho de cuidar dos filhos. E eu não tinha rede de apoio, embora tivesse uma funcionária doméstica. Mas como conciliar tudo de uma família nas costas de uma mulher? Há 40 anos, pouco se falava sobre isso e eu sentia, mas não tinha os nomes a nomear as atitudes, coisas e comportamentos.
Como fico feliz de que tudo anda mudando a passos largos. Como me emociono ao ouvir Chico Bosco (escritor e integrante do programa GNT, Papo de Segunda) a falar dos filhos e de como é envolvido na vida deles em tempo integral. Tendo que arrumar tempo para febre, carência, dever da escola e as suas críticas literárias, casamento, samba e futebol. E vida intelectual. Chegou a guarda compartilhada em caso de separação, e o mais surpreendente, a pedido dos pais, que não queriam perder a intimidade com o filho.
Dentro de casa também tenho o exemplo de filho e sobrinhos que fazem parte de uma paternidade mais presente, do século XXI. Educam, passam noites acordados, são presentes com os filhos, pequenos e adolescentes, no dia e na noite. E as mães? Aproveitam como podem a partilha dessa carga mental exaustiva e paralisante. Ainda não é tudo, mas já vejo com muita alegria isto ao meu redor.
Mas nem tudo. Pois ainda é tão grande a ausência, o abandono e o descaso dos pais para com as mulheres e os seus filhos. Homens que, mesmo casados e pais de família, sobrecarregam as mães com toda a criação, educação e o dia a dia extenuante de ter filhos. E eles, os provedores, se bastam no sustento. E muitos ainda que, ao se separarem, abandonam os seus filhos de todas e quaisquer responsabilidades: financeira, afetiva, subjetiva, física e simbólica. E o sofrimento que causam? Infinito. Conheço tantos da minha geração que nunca souberam separar ex-mulher de filhos, e fazem abusos parentais, desaparecem, causando uma dor profunda nesses filhos. Parece coisa do passado, mas muito ainda vejo dessa ferida narcísica da paternidade.
Sigo continuando a achar dificílimo ter e educar filho. Tarefa hercúlea e que, na nossa sociedade, tem poucas políticas públicas para a maternidade e filhos, como creches integrais. Falo de um lugar de uma mulher branca, classe média, profissional que sempre teve o seu sustento e contas pagas. Quando penso na mulher pobre tendo filho e tendo filho sozinha, e o marido alhures, aí sinto uma dor na alma. Mulheres que não sabem o que é divisão de trabalho, uma noite bem dormida, comida na mesa e um tempo todo seu.
Escuto histórias de antigamente das mulheres que pariam 10 a 12 filhos e fico a pensar que tais mulheres passaram 24 anos grávidas e cuidando de bebês, só para começar. Sem falar que os bebês são bebês pelo menos até os três anos. Que violência no corpo dessa mulher parideira! Não tem útero que aguente. E a vida dessas mulheres? Não tinham como fugir da prisão da maternidade. Sim, até a maternidade (tão sagrada e endeusada pela sociedade patriarcal), pode sim ser uma prisão. E solitária, pois pai nenhum deixava os seus afazeres ou ócios para ninar uma criança. E aqui faço referência a Rosiska Darcy de Oliveira, em seu livro Elogio da Diferença: O feminismo emergente, falando do legado deixado pelas mães na educação dos filhos, pelo simples fato da arte de contar histórias na hora do dormir. A beleza e o cuidado que isso proporciona no inconsciente de uma criança, na sua capacidade de transcender. Momentos simbólicos que nos acompanham para a vida toda.
Nesse Dia dos Pais, vivas aos pais que, junto com as mães, buscam um lugar amoroso e presente na vida dos seus filhos.