Para desfrutar com mais intensidade o sabor das manhãs parisienses, costumava ir logo cedo à “boulangerie” mais próxima, no país onde há os melhores croissants e baguetes do mundo. A cidade ainda parecia adormecida, quase ninguém na rua, já que era inverno, quando os dias se encurtam e o Sol se atrasa.
Entregadores e alguns poucos executivos marcam o cotidiano dessa hora, a usufruir a brisa úmida, as calçadas recém-lavadas, o cheirinho de café, toasts e pão fresco. No caminho, o pátio ajardinado da milenar igreja de Saint Séverin, no Quartier Latin, chamava atenção e infundia sensação simultânea de história e misticismo, bucolismo e austeridade. Foi inevitável não parar para espiar, por entre as grades, os canteiros, arcadas e alamedas góticas daquele lugar. Que magia!...
Ao voltar da padaria, avistei as gárgulas nas bordas das cornijas que, dessa vez, pareciam me acenar do alto da igreja convidando-me a uma visita. Não resisti. Logo após entrar, ao sentir o velho cheiro de cedro e incenso, típico dos templos e conventos medievais, uma sensação de paz e reverência encheu meu espírito embevecido.
Pus a sacola de compras no chão, ao lado da primeira cadeira, e me sentei. Soltei as vistas pela nave, sustentada por arcos e colunas que compunham a grandiosa arquitetura solenemente exibida sob a tênue luminosidade da manhã. Ao fundo, suaves feixes de luz eram filtrados pelo magnífico vitral iluminando o altar, Decerto canalizavam os bons fluidos que abençoam as casas de recolhimento cristão.
Igreja de Saint Séverin (Paris) Romanceor / Serge Melki / Chris06
Fechei os olhos, acalmei o coração, deixei a mente respirar a paz daquele instante, e pensei: Como é incrível a força de Jesus Cristo! Nascido em condições tão simplórias, em uma região pobre e distante, foi perseguido, incompreendido, difamado, caluniado, maltratado, assassinado, e, ainda assim, deixou uma imagem que atravessa séculos e milênios, incólume e fulgurante, capaz de manter, na grandeza de sua mensagem, pungente e imorredoura vibração de amor. A única capaz de irmanar povos e idiomas neste elo mágico que se faz presente em qualquer templo em que se pregue o Bem.