Impressionam-me esses aparelhos de rádio moderníssimos, com dispositivos eletrônicos para encaixe de pen drive e captura de sinais, via bluetooth. Você pode conectá-los sem fio ao telefone celular, ou computador, e pronto: passa a desfrutar dos muitos canais de notícia e música dispostos pela internet ao bel prazer e pelo tempo que desejar.
Todavia, meu espanto maior advém da preferência dos fabricantes pelos modelos retrôs, exigência, evidentemente, da distinta clientela. Afinal, a indústria, qualquer que seja, nada põe no mercado que não possa vender.
Vi um deles de pequeno tamanho com formato e cores de uma encantadora jukebox numa loja do bairro e logo tratei de fotografá-lo. Já em casa, pesquisei os preços e constatei que os daquela vitrine são salgadíssimos. A aquisição por meio de um desses canais de vendas sai bem mais em conta. Mas acho que preciso consultar o preço do frete para melhor avaliação.
Cabe a explicação aos mais jovens: jukebox foi nome dado a um aparelho de som do tamanho de uma geladeira instalado, geralmente, em bares e restaurantes para a propagação de músicas. Fez seu maior sucesso ao longo das décadas de 1950 e 60, tempo da brilhantina, dos chicletes, da meia soquete e das saias plissadas. Os primeiros operavam com inserção de fichas adquiridas no balcão. Você comprava quantas quisesse, fazia sua escolha em teclado com numeração (cada número, uma música) e aguardava o braço mecânico retirar o correspondente disco de uma prateleira depositando-o no prato giratório. Em seguida, outro braço pousava com a agulha, suavemente, nas ranhuras do vinil.
Você, então, havia acabado de fornecer música, em volume alto, para todo o ambiente, gostassem, ou não, das suas escolhas. Reafirmo, porém, que nunca testemunhei uma briga por causa disso, o que já me fez pensar (e escrever) que o criador dessa coisa inventou uma máquina de consensos. Contam-me que há versões modernas da jukebox tão grandes, coloridas e iluminadas quanto as do passado. Mas já sem os discos e fichas de antigamente. Tudo, agora, funciona em circuito eletrônico. Não faço questão de conhecê-las.
Mas retomemos o tema. É impressionante a onda sentimental que nos traz de volta modelos e formas do passado. Vi, dias atrás, pela primeira vez, o funcionamento de um desses radinhos modernos na casa do filho mais velho. Tomei um choque: aparentemente, era o aparelho que minha avó Soledade mantinha na sala de visitas.
Falo, agora, sobretudo, aos colegas de profissão. Peço desculpa aos que disto porventura discordem, mas eu trocaria de bom grado as sintonias de hoje por aquelas da minha infância e juventude. Menos pela programação musical e mais pelo noticiário de melhor critério, se o termo de comparação for com este de agora.
O “Repórter Esso”, de Heron Domingues, parecia-me menos entreguista e tendencioso, apesar do patrocínio. As emissoras falavam com sotaque regional, salvo quando das narrações, em ondas curtas, de Jorge Cury, Waldir Amaral, Walter Abrahão e outros do gênero, para aficionados do futebol, no Brasil inteiro.
Naquele tempo, você não corria o risco de sair de casa, na Paraíba, com informações no carro sobre o trânsito da Marginal Tietê, em São Paulo. As emissoras ainda não se dependuravam em satélites à custa do desemprego da prata da casa.
A velha Tabajara, paraibana da gema, nos trazia locuções sem “dgi” e “tchi”. A propósito, juro como ouvi a “Rádio Caipira”, em um São João de Campina Grande, saudar o público com um sonoro “Bom Dgia!”... Cabe o reparo: não me queixo do sotaque sulista, mas da perda do nosso.
Percebo que eram mais proveitosos os dias da nossa confiança nas pílulas de vida do Doutor Ross e em que Melhoral não fazia mal. Sinto falta do tempo em que levávamos mais em conta a boa intenção daqueles que púnhamos nas casas legislativas e nos postos de mando do município, do estado e do país pela força do voto.
Acho, portanto, que não ocorre à toa o fato de os atuais aparelhos de rádio buscarem alguma semelhança com os do passado. A memória coletiva, por certo, deve andar em busca de velhas e melhores sintonias.