Torço pelo Botafogo desde que, menino de calças curtas, vi Garrincha atuar no time. Posso dizer que minha escolha se fez certa por pernas tortas, como é a escrita de Deus.
Com o tempo, passei a identificar Garrincha como a melhor representação do emblema do time – a estrela solitária. Seu drama pessoal, marcado pelo alcoolismo e por uma ingenuidade que o levou a ser explorado por empresários do futebol, dava-lhe um brilho que repercutia no meu ânimo de torcedor. Ele era também a alegria do povo.
Com o tempo, passei a identificar Garrincha como a melhor representação do emblema do time – a estrela solitária. Seu drama pessoal, marcado pelo alcoolismo e por uma ingenuidade que o levou a ser explorado por empresários do futebol, dava-lhe um brilho que repercutia no meu ânimo de torcedor. Ele era também a alegria do povo.
Cheguei a vê-lo jogar no Maracanã – gordo, lento, mas ainda capaz de empolgar os espectadores ao fazer uma de suas gingas e quase “entortar” um adversário. Morreria pouco depois, mas continuei botafoguense. Um pouco por fidelidade à memória dele.
O que nos leva a preferir um time, em detrimento de outros, nada tem de lógico, objetivo, racional. Daí se falar em “mística” do futebol. Escolhemos uma agremiação, assim como a pessoa amada, por obscuras razões inconscientes; e dessa escolha derivam-se outros vínculos, com os quais o primeiro objeto eleito se associa. Ainda hoje, sempre que vejo o Botafogo jogar, penso em Garrincha.
Fiquei botafoguense, repito, e hoje participo (sem fanatismos) dos percalços e alegrias do clube. Atualmente vivemos um bom momento, ocupando o primeiro lugar na tabela do Campeonato Brasileiro. Grande parte desse sucesso deve-se ao técnico Luís Castro, que por sinal acaba de deixar o clube para treinar o AlDuhail, do Qatar.
A saída de Castro suscitou uma polêmica renhida entre os que compreenderam a opção do treinador e os que o criticaram por abandonar a equipe em momento tão auspicioso. Seria uma espécie de “traição” ou, pior ainda, um abandono à grande “família” de torcedores.
Achei engraçada essa última ponderação, pois não vejo no apego dos torcedores a um técnico nada de “familiar”. O que define, ou deve definir, uma família? Entre outras características, a presença reconfortante e solidária nos bons e maus momentos. O amparo nas situações difíceis e o empenho desinteressado em, caso o indivíduo venha a cair, lhe dar a mão e ajudá-lo a se reerguer.
Ora, alguém já viu isso na relação entre técnicos e torcidas, sejam de que esporte for? O torcedor é sobretudo egoísta. Ama no time, com o qual está identificado, sobretudo a si mesmo. E tanto festeja os treinadores nos momentos de vitória, quando os escorraça, e se puder os trucida, nas ocasiões em que o time perde.
Luís Soares é um profissional e deve escolher quem lhe pagar melhor. Essa é a regra do jogo. Ficar no time para agradar à “família” botafoguense me lembra, guardadas as devidas proporções, um tipo de sacrifício a que Garrincha mais de uma vez se submeteu: jogar com os meniscos afetados, sob o efeito de analgésicos, pois a sua ausência frustraria os torcedores e faria diminuir a renda da partida.
Apesar de saber que a direção do clube compactuava com isso, não deixei de torcer pelo Botafogo. O motivo? O brilho da estrela, que em mim nunca se apagou.