Não será difícil perceber a discrepância entre grande parte dos trabalhos que constituem a Fortuna Crítica do EU. Mas, como diria o próprio Augusto, "Tudo convém para o homem ser completo".
Existem estudos que se tornaram clássicos, pelas verdades estabelecidas há muitas décadas, pelo reconhecimento pioneiro da poesia instauradora de nova concepção estética nos meios literários brasileiros, incompreendida e recusada por "cantar de preferência o horrível ". São trabalhos insistentemente repetidos, sempre que se retoma o assunto.
Existem estudos que se tornaram clássicos, pelas verdades estabelecidas há muitas décadas, pelo reconhecimento pioneiro da poesia instauradora de nova concepção estética nos meios literários brasileiros, incompreendida e recusada por "cantar de preferência o horrível ". São trabalhos insistentemente repetidos, sempre que se retoma o assunto.
Há os que nada acrescentam. E, ainda mais, os que se equivocam desde o ponto de partida para a apreensão do fenômeno poético e se extraviam no percurso da leitura, sem jamais chegar ao essencial.
Finalmente, existem aqueles que voltam às questões fundamentais e, acompanhando-lhes a evolução histórica, logram redimensioná-las, preenchendo lacunas existentes, aclarando pontos obscuros, completando soluções apenas entrevistas.
Apesar dos descompassos críticos, o saldo é positivo. Isso é tudo. Isso basta. E, como prova de superação das idiossincrasias, o estudioso de Augusto dos Anjos encontra hoje, para muitas das questões suscitadas pela "poesia de tudo quanto é morto", respostas seguras e convincentes, porque apoiadas em sólidas realidades textuais.
Sendo assim, talvez já constitua uma impropriedade ainda encarar o EU como um problema, no quadro da Literatura Brasileira. Na verdade, este parece suficientemente elucidado em seus aspectos mais polêmicos. Neste sentido, os estudos de Lúcia Helena e de Ferreira Gullar são marcos indispensáveis e esclarecedores.
Desenvolvendo modelos teóricos construídos com "dados da época e da situação da obra investigada" portanto, suficientemente aparelhados para revelar "dinâmica do fato literário em sua totalidade", os dois ensaios iluminam, de forma definitiva, o texto do poeta paraibano. Neles encontram-se tratados, com absoluta propriedade, temas que, ao longo dos anos, se tornaram constantes em relação ao EU, tais como: a escola literária, a linguagem, a biografia do poeta, a filosofia e o cientificismo, entre outros.
Não se trata, evidentemente, de supervalorizar o presente em detrimento do passado, de separar, num procedimento maniqueísta, a boa e a má crítica, admitindo, preconceituosamente, que o mais novo é sempre o melhor. É fácil verificar que esta seria uma conclusão descabida, pois muitos dos textos de agora não suportariam que seus autores se permitissem a reflexão sugerida por Rilke: "Sou, de fato, obrigado a escrever?"
Do que se tem publicado sobre Augusto dos Anjos, é preciso distinguir, antes de mais nada, o que é crítica literária do que não pode ser assim considerado, por insuficiência metodológica ou porque não tem como objeto de estudo o fenômeno poético. Esta intersecção geradora de equívocos se constituiu e continua a constituir-se em resistente obstáculo para o verdadeiro entendimento do EU.
Com efeito, as conclusões realmente críticas não se excluem, não precisam ser refutadas, mesmo que entre elas exista um considerável espaço de tempo, propiciando a inovação da linguagem e dos recursos analíticos. Assim é que, depois dos estudos de Lúcia Helena e de Ferreira Gullar, a resposta enfática de Orris Soares sobre a escola literária a que Augusto pertenceu, ainda mais se reforça, agora apoiada em razões que ultrapassam "o individualíssimo sentir".
Fica evidente que o salto não foi assim abissal. Este processo acumulativo passou, naturalmente, pela formulação do professor Eduardo Portella em Uma Poética da Confluência, como por outros esforços construtivos. E o resultado é que o encadeamento de visões acabou por responder à Literatura Brasileira a que escola pertence ou não pertence a poesia de Augusto dos Anjos.
Tudo faz crer, portanto, que o problema não reside em, um dia, ter sido a crítica biográfica ou impressionista. Mas em não ter sido crítica. Ou, por outro lado, em permanecer apenas biográfica ou impressionista, desconhecendo as conclusões e potencialidades do seu tempo.
Sem perder a perspectiva histórica, a consciência das possibilidades e limites espaço-temporais, o leitor poderá refazer este percurso ascensional em relação a muitas outras questões de fundamental interesse para a compreensão do EU. Os principais equívocos estão refutados e já não se pode falar em "infortúnio crítico", como há onze anos, quando o Instituto Nacional do Livro lançava a coletânea organizada pelo professor Afrânio Coutinho.
Os estudiosos de Augusto dos Anjos dos Anjos encontrarão "lavrado o campo, a casa limpa", "a mesa posta". E o texto do EU em desafio, esperando que novos ensaios se disponham a colocar "cada coisa em seu lugar".
Lamentavelmente, entre os futuros trabalhos faltará um que ficou em notas. Aquele que revelaria em Augusto "trágico sem a sua hora". Que, buscando nos mais diferentes níveis, a transcendência dos elementos configuradores do poético, encontraria, na presença da evolução e da ciência, a fatalidade com outro nome, "fatalidade que tudo vai fazer fenecer e perecer". Que descobriria no tema da morte a colocação não apenas "do poder da Morte ou da simples destruição. Mas a presença do fracasso, do aviltamento, da dor, no que ela tem de humilhante, do sofrimento inútil do homem - tudo isso que mais o mancha do que mata". Que entenderia "a eloquência de Augusto como solução (artística)" - o ensaio que o professor Juarez da Gama Batista não teve tempo de escrever.