Somos todos, presentemente, passageiros de um navio em perigo. Alguns já perderam até a esperança, e aceitam em silêncio a fatalidade de uma catástrofe que sua covardia torna mais certa. Entretanto, alguns, se sobreviverem ao naufrágio, recusam-se a morrer sem ter feito tudo para salvar, não as matérias mortas, mas, as forças vivas, os calores espirituais, que são as chamas onde se acenderão novos focos.
Ora, neste crepúsculo, em que os homens, não distinguindo mais as luzes humanas, não respeitam, senão, as máquinas cegas e as massas gregárias, ainda mais cegas, o médico aparece como o último dos clarividentes, como um dos últimos conservadores do que não deve desaparecer.
Ele conserva o privilégio da reflexão: o exercício de sua arte lúcida obriga-o constantemente a perceber o indivíduo no meio da coletividade.
Ele distingue o homem e os homens — o homem que é o mesmo em toda parte, a despeito das diferenças étnicas, o homem que é o semelhante de seus “semelhantes”, o homem que é a espécie como a folhagem da árvore, é a reunião das folhas — e os homens, que são as pessoas na diversidade de temperamentos e de caracteres, os homens dos quais , cada um reage na saúde e na doença, de maneira diferente do vizinho e dos seus possíveis interlocutores.
E, nesta civilização que detesta o silêncio e receia a meditação, o médico deve, contudo, concentrar-se: vendo que o seu papel é mais necessário, sua ação se estende na brutalidade dos novos costumes e dos novos tempos(tome à direita e siga, e não se importe em destruir), sua tarefa não é somente de defender a vida contra a morte, mas, reanimar aqueles que esquecem o respeito e o próprio sentido da vida.