O escritor João Guimarães Rosa é conhecido pelo caráter revolucionário e, obviamente, universal de sua obra, com características marcadas pelo chamado hiperregionalismo, e o exemplo mais marcante é, sem dúvida, “Grande Sertão: Veredas”. O detalhe é que alguns pesquisadores também encontraram em textos de sua vasta produção literária elementos que poderiam ser identificados como narrativas fantásticas, especialmente nos primeiros contos, dentre estes, com destaque para “A terceira margem do rio”, que integra as “Primeiras Estórias”.
Rosa teria sofrido influência de alguns escritores europeus, especialmente dos séculos XVIII e XIX, como o “gótico” Horace Walpolle (O Castelo de Otranto, dentre suas obras principais) ou Howard Phillips Lovecraft (O chamado de Cthulhu é um exemplo), além do americano Edgar Alan Poe, cuja matriz literária teria influenciado, não apenas Rosa, mas toda uma geração de escritores. O que talvez justifique os aspectos mais relevantes da obra de Rosa e que marcaria seu trabalho em toda a sua obra, afinal.
Esse aspecto é bem destacado pela professora Maria Martins Gama-Kalhil. Em seu artigo “A literatura fantástica de Guimarães Rosa antes das Primeiras Estórias” (2012), ela revela ter identificado a confluência desses elementos, por exemplo, em “O mistério de Higmore Hall”, de Rosa, com “A queda da casa de Usher”, de Poe. Não que se vá afirmar que a literatura de Guimarães Rosa esteja relacionada diretamente à de Poe, ou seja dela uma consequência imanente, mas parece impossível não identificar em sua literatura elementos do sobrenatural, seja pela eventual influência de Poe ou pela literatura de Walpole e Lovevraft, seja, como pontua a pesquisadora Gama-Kalil, pela fluência na corrente dos mitos e contos primordiais da oralidade. (GAMA-KALHIL, 2012).
Narrativa fantástica
O conceito da narrativa fantástica foi, inicialmente, cartografado pelo teórico russo Tzvetan Todorov, e seria uma narrativa a oscilar ante a possibilidade de uma explicação natural e outra sobrenatural. Para Todorov, o “fantástico é hesitação experimentada por um ser que só conhece as leis naturais, face a um acontecimento aparentemente sobrenatural” (TODOROV, 1981). Sob essa perspectiva, o fantástico emerge como um efeito decorrente do registro de acontecimentos estranhos e insólitos no plano da narrativa, bem como da possibilidade de se fornecer explicações racionais para esses acontecimentos.
Todorov também atribui uma importância fundamental ao leitor, que precisa se integrar ao universo dos personagens, a partir do trabalho e, claro, da competência do autor. E o primeiro “trabalho” seria o leitor superar a sua própria descrença.
“O fantástico implica pois não só a existência de um acontecimento estranho, que provoca uma vacilação no leitor e o herói, mas também uma maneira de ler, que no momento podemos definir em termos negativos; não deve ser nem “poética” nem “alegórica”. ” (TODOROV, 1981)
Sob essa perspectiva, o leitor, ao perceber a presença do sobrenatural, do improvável, vê o fenômeno como uma espécie de transgressão à sua experiência usual de realidade, um confronto ao seu conjunto de expectativas a respeito do real. Como consequência, termina por compartilhar da hesitação e do medo do personagem, e, quando não totalmente evidenciado na narrativa, é o leitor, quem decidirá qual a solução que deverá dar a este fenômeno aparentemente sobrenatural.
É, na verdade, o leitor quem irá, à sua maneira, preencher o buraco negro das dúvidas, fazendo conexões lógicas com sua história, com o que ele entende por real para, finalmente, tomar uma decisão sobre o sentido do texto.
Mas, conforme postula o escritor e crítico literário espanhol David Roas, o processo de leitura de uma narrativa fantástica é, em essência, um processo circular, no qual o leitor é levado a levantar hipóteses, a partir, especialmente, do seu horizonte de expectativas e do seu repertório pessoal mais lógico, que devem ser confirmados pelo texto, cujas partes que estão sendo analisadas precisam, de alguma forma, convergir com o próprio texto, mesmo que se estabeleçam relações com o universo alheio à sua concepção de realidade. (ROAS, 2014)
Roas, entretanto, diverge de Todorov quando postula que não é apenas o olhar sobrenatural que caracteriza a narrativa fantástica. O espanhol defende como o que poderia marcar o gênero seria a forma como o sobrenatural aparece dentro de um universo muito similar ao real. Nele, a sua função é “desestabilizar limites, questionar a validade dos sistemas de percepção do real que todos compartilhamos”. Para Roas, o fantástico faz o leitor perder a segurança diante do real. (ROAS, 2011).
Roas também se distancia de Todorov, à medida em que argumenta como o pensador húngaro, ao atribuir considerável primazia para a definição do fantástico e também do estranho e do maravilhoso ao leitor, está privilegiando um elemento secundário e não o principal, que seria a ambiguidade. Tanto quanto outros pesquisadores, Roas também mira sua conceituação do fantástico, do estranho e do maravilhoso nessa ambiguidade que se presentifica na narrativa a partir da presença do elemento sobrenatural.
Sob a perspectiva de Roas, vamos encontrar em Remo Ceserani (O fantástico), alguns dos elementos que costumam pontuar a narrativa fantástica, como a ênfase dada aos procedimentos narrativos no próprio corpo da narração, narração em primeira pessoa, capacidade projetiva e criativa da linguagem, a busca pelo envolvimento do leitor através dos elementos de surpresa, terror ou humor, a passagem de limite e de fronteira, a ocorrência de um objeto mediador, as elipses, a teatralidade, a figuratividade e o detalhe. (CESERANI, 2006)
É, portanto, sob a perspectiva de Roas que pretendemos compreender o conto “A terceira margem do rio”, que integra a coletânea “Primeiras Estórias”. (ROSA, 2015)
O conto
No conto “A terceira margem do rio” encontramos a narrativa em primeira pessoa de um filho que testemunha uma decisão surpreendente do Pai, que, já em idade adulta, mas ainda lúcido, contrata a construção de uma canoa e, diante da perplexidade da família e amigos próximos, lança-se ao rio e, ainda mais surpreendente, nem empreende viagem, como se poderia esperar, e nem mais desembarca. Lá permanece como se estivesse numa certa terceira margem, “não pojava (subia) em nenhuma das duas beiras”.
Para a mãe, a atitude do pai poderia ser uma nova opção de vida, irresponsável, de abandono à família e seus deveres, um desordeiro a romper com o contrato social da gente humilde e trabalhadora, que luta do viver em meio a tantas adversidades. No entender da mãe, o pai desgarrara de suas responsabilidades sem uma explicação plausível, e isso poderia ser compreendido como loucura. Não a loucura “normal” dos que lutam para viver diante da insanidade daquela vida de dificuldades, mas uma loucura de propósito, para se isentar de seus compromissos com a família. E isso causou indignação à mãe, mas do que propriamente a estranheza.
O insólito desse comportamento, na verdade, estranha a todos, além da mãe. Também os filhos, os “parentes, vizinhos e conhecidos” da redondeza. No entanto, há talvez um elemento importante, que, aparentemente, não seja devidamente considerado pela mãe, mas implicitamente intuído pelo filho narrador. O fato de que o pai talvez já não responda mais por suas decisões e que, na verdade, esteja, tanto quando a força da correnteza, levado por uma outra correnteza, como um chamado do insondável.
Então, a sua decisão talvez já não seja mais da ordem do mundano, mas do sagrado. A mãe não parece compreender, quando diz: “Cê vai, ocê fique, você nunca volte!” O filho enfrenta o olhar do pai, e reage com uma súplica: “Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?” E o pai homem “cumpridor, ordeiro, positivo”, apenas abençoou o filho num sinal de negativa, saiu “entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo – a sombra dela por igual, feito um jacaré, comprida longa”.
O rompimento da ordem vigente se expressa no texto, quando Rosa relata essa estranheza de todos, com a suspeita de uma “doideira” do pai, ou poderia ser o “pagamento de uma promessa”, ou poderia ser, quem sabe, “o escrúpulo de estar com alguma feia doença... se desertara para outra sina de existir, perto e longe de sua família dele”.
O detalhe é que, a despeito da separação com a família, mantém um laço com o filho, não dele se aproxima, mas aceita sua generosidade. Na narrativa, há a permanente tentativa de se aproximar do pai, mas em vão. “Nosso pai passava ao largo, avistado ou diluso, cruzando na canoa, sem deixar ninguém se chegar à pega ou à fala.” (No detalhe, “diluso” seria um neologismo formado por “dis”, negação, e “lusus” do verbo “ludere”, iludir). Mas, o filho, e apenas ele, é que estabelece alguma estreiteza com o pai:
“Depois, no (dia) seguinte, apareci, com rapadura, broa de pão, cacho de bananas. Enxerguei nosso pai, no enfim de uma hora, tão custosa para sobrevir: só assim, ele no ao-longe, sentado no fundo da canoa, suspendida no liso do rio. Me viu, não remou para cá, não fez sinal. Mostrei o de comer, depositei num oco de pedra do barranco, a salvo de bicho mexer e a seco de chuva e orvalho.”
E é como se, por um arquétipo qualquer, estivesse alimentando os mortos. O tempo passou, a família seguiu sua sina, em busca de outros “sobressaltos” que fossem. A mãe, a irmã com seu marido e filho, o outro irmão, todos se foram dali. Mas, o filho-narrador se manteve preso ao compromisso insólito com o pai: “Eu permaneci, com as bagagens da vida. Nosso pai carecia de mim, eu sei.” E assume esse estado de melancolia, quando diz ser “homem de tristes palavras”, que busca uma reparação (Melanie Klein), ao assumir: “De que era que eu tinha tanta, tanta culpa?... Sou doido?” O relato acompanha, como se vê, um processo de despojamento de si mesmo, numa viagem constante à margem do rio, a procura do pai.
E, quando o filho envelhece, não certamente por acaso, assume características físicas do pai: “Às vezes, algum conhecido nosso achava que eu ia ficando mais parecido com nosso pai.” Que, verdade, já devia ter outras feições, imagina o filho:
“Mas eu sabia que ele agora virara cabeludo, barbudo, de unhas grandes, mal e magro, ficado preto de sol e dos pelos, com o aspecto de bicho, conforme quase nu, mesmo dispondo das peças de roupas que a gente de tempos em tempos fornecia.”
Parece a descrição de um fantasma, um “bicho”, ente do outro mundo, uma figura, com algumas variações, mas tão comum no imaginário popular: o espectro cabeludo, ou barbudo, as unhas grandes. Uma viração. Aquele que assusta, que vem das profundezas ou sabe-se lá de onde mais. Mas, é a impressão que resta.
Finalmente, já velho, o filho solitário decide encarar o seu destino, enfrentar o seu medo e se determina a convocar o pai, para que, enfim, possa, quem sabe, compreender ou superar a sua dor. Elaborar as suas angústias, preso à margem do rio, o mesmo rio que corre, corre e sempre traz e também leva a figura paterna, agora um trasgo, certamente na forma difusa do sagrado assustador.
“Com um lenço, para o aceno ser mais. Eu estava muito no meu sentido. Esperei. Ao por fim, ele apareceu, aí e lá, o vulto. Estava ali, sentado à popa. Estava ali, de grito. Chamei, umas quantas vezes. E falei, o que me urgia, jurado e declarado, tive que reforçar a voz: — "Pai, o senhor está velho, já fez o seu tanto... Agora, o senhor vem, não carece mais... O senhor vem, e eu, agora mesmo, quando que seja, a ambas vontades, eu tomo o seu lugar, do senhor, na canoa! ..." E, assim dizendo, meu coração bateu no compasso do mais certo.”
E, então, talvez nem tenha sido surpresa para o filho, quando o pai, convocado, respondeu à sua saudação com um gesto “o primeiro, depois de tamanhos anos decorridos!” E remou em sua direção até a margem do rio, e então o filho não resiste...
“E eu não podia... Por pavor, arrepiados os cabelos, corri, fugi, me tirei de lá, num procedimento desatinado. Porquanto que ele me pareceu vir: da parte de além. E estou pedindo, pedindo, pedindo um perdão. Sofri o grave frio dos medos, adoeci. Sei que ninguém soube mais dele.”
Essa cena do conto certamente conduz a se imaginar a presença de um fantasma, um esconjuro do filho que precisa purgar suas culpas, quase um exorcismo de seus pecados (que pecados?). E, finalmente, o filho pede que, ao morrer, o “depositem também muna canoinha de nada, nessa água que não para, de longas beiras: e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro – o rio”. E o fato é que, não tendo se preparado para a morte, como o pai, ele supõe que será encontrado pela morte e, depois de morto, colocado na canoa dentro do rio. Para reencontrar o pai, enfim, mas sem o susto fantasmagórico.
O fantástico na narrativa
Em muitas culturas, o rio se apresenta como uma simbolização do mistério da existência do homem. O homem estaria numa das margens, digamos, a margem de cá, e, por meio da morte, ele atravessa o rio para o lado de lá, que seria o além. A mitologia grega, por exemplo, cita Estige e Aqueronte como os rios da morte, que levavam ao Hades.
Hades, conforme a cosmogonia grega, era descrito como sendo um submundo, o lugar para onde iam os mortos, nos limites dos oceanos ou das profundezas ou extremidades da terra. Era o reino da morte, e poderia ser considerado a contrapartida escura do brilho do Monte Olimpo, que, obviamente, correspondia ao reino dos deuses. Hades era um reino invisível aos vivos e foi criado exclusivamente para os mortos. Portanto, sua referência, se consistente, na verdade, se intencional da parte de Rosa, faz estreitar a relação com o sobrenatural.
Se como afirma Roas, o objetivo do fantástico seria “desestabilizar os limites de segurança, problematizar as convicções coletivas, questionar a validade dos sistemas de percepção da realidade comumente admitidos” com o concurso e a conivência do sobrenatural, temos neste conto de Rosa os elementos que caracterizam uma narrativa fantástica, a partir, inclusive, de um de seus elementos mais marcantes, que é o do narrador em primeira pessoa, o filho.
Um aspecto relevante, que convoca a borda geográfica da ação, tão presente como uma imaginativa terceira margem do rio, onde habita o pai, a figura do pai, que sobrevive ao tempo e, um dia retorna, para um acerto de contas, do qual o filho foge.
“La noción de frontera, de limite infranqueable para el ser humano, se presenta como preliminar a lo fantástico. Una vez establecida a existencia de dos estatutos de realidad, la actuación de lo fantástico consiste en la transgresión de este limite.” Na tradução livre: “A noção de fronteira, de limite intransponível para o ser humano, é apresentada como preliminar para o fantástico. Uma vez estabelecida a existência de dois estatutos da realidade, o desempenho do fantástico consiste na transgressão deste limite.” (ROAS, 2001)
O pai, em sua viagem para o insólito, termina por assumir um caráter sobrenatural, que é previsto por Roas como uma característica fundamental da narrativa fantástica. Roas prevê, inclusive, uma invasão desse sobrenatural no mundo real, a partir dos elementos narrativos, que parecem substabelecer uma tal inabilidade de explicar essa invasão por meio da razão, um elemento indiscutivelmente presente no conto.
Ora, o pai faz uma viagem em sua canoa barco no rio, onde permanece sozinho com sua loucura, num cenário em que parece traduzir uma estreita relação com o encontro da morte, mesmo aparentemente num sentido simbólico. Nesse sentido, o pai também palmilha um caminho no rio e a viagem que ele faz parece ser uma espécie de cruzada no retorno ao ancestral, ao animalesco, ao assombroso, uma vez que decide ficar numa terceira margem, nem falar com ninguém. Sem ser gente desse mundo, enfim.
Há que se observar também como a narrativas tanto convoca a evidência do fantástico, como acata uma ambiguidade, que se torna um signo indissolúvel da história, em que Rosa põe todas as possibilidades à disposição da interpretação do leitor, um conluio importante na fusão com o autor, que é também uma característica marcante dessa narrativa. O pai “podia” estar de “doideira”, ou doente de uma “feia doença”, ou “pagando promessa”, ou de “pescaria”, tantas são as possibilidades. Da ordem do “pode ser”.
Outro elemento importante são as elipses. É notório que Rosa promove as lacunas, como parte de sua conspiração com o leitor. Quando, numa das passagens do texto, o narrador fala do quanto levava comida às escondidas para o pai no rio, a mãe, que provavelmente suspeitava, mas, “muito não se demonstrava”. O texto é muito rico em elipses, e deixa muito subtendido, tal como se comporta a própria oralidade, onde o autor foi buscar inspiração.
Num texto que trata da vasta obra de Rosa, Lenira Marques Cotize assume, na mesma linha de Roas, como o sentimento do inverossímil (presente no conto) incomoda o leitor, causa estranheza, porquanto a pesquisadora entende como as transgressões são um dos sedimentos mais notáveis da literatura fantástica, pode-se dizer, imprescindível. E essa estranheza normalmente é levada ao extremo, o que ainda mais timbra a singularização do fantástico, que arrebata o leitor e o torna cúmplice e algoz em alguns casos. (COVIZZI, 1978).
Finalmente, temos no texto os sistemas temáticos caros ao fantástico, como a noite (quando o filho vai ao rio), a escuridão (no rio), o mundo obscuro (da terceira margem), a insinuada vida dos mortos (quando há o reencontro do filho com o pai), a loucura (que se expressa nas dúvidas do filho), a aparição do estranho, do irreconhecível, e mesmo o nada, em que, finalmente, se resume a vida do filho, após o encontro que não houve. Todos elementos intrínsecos da narrativa.
Considerações finais
O que se perseguiu neste trabalho foi a possibilidade de catalogar o conto “A terceira margem do rio” como uma narrativa fantástica, de João Guimarães Rosa, um autor mais conhecido como hiper-regionalista, mas que, na tessitura de suas primeiras peças literárias parece transparecer uma certa influência de autores como Poe, Walpolle, Lovercraft e outros, da corrente do fantástico e do gótico.
Parece inequívoco que Rosa dialogou de certa maneira com uma corrente de literatura estrangeira na linha do fantástico, verticalizando seu discurso literário no universo do real e do sobrenatural, rejeitando, de certa forma, o familiar e conectando com o estranho, num ambiente de ambiguidade, utilizando inclusive a modalização para comparecer com a dúvida.
Para essa prospecção, utilizamos ferramentas oferecidas principalmente por teóricos como Todorov e Roas, à medida em que compreendemos a narrativa fantástica como ancoradouro que abriga e tece sua trama com o sobrenatural, por meio de uma certa subversão ou fratura do real, um conflito que opera em favor do fantástico, e estabelece o laço que o autor busca como leitor, para compor a sua obra.
Neste conto de Rosa faz todo sentido o que proclamou o pesquisador espanhol em um de seus mais notáveis textos sobre o fantástico, qual seja: “Lo fantástico, por tanto, va a depender siempre de lo que consideremos como real, y lo real depende directamente de aquello que conocemos” ou, na tradução livre, “o fantástico, portanto, sempre dependerá do que consideramos real e o real depende diretamente do que sabemos”. (ROAS, 2001)
E, por fim, não surpreende a maestria como Rosa conduz a narrativa do conto. É inquestionável. Impressiona o domínio que ele assume na condução segura do texto, valendo-se de elementos do fantástico, tanto quanto se apropria da oralidade num contexto regional para compor um texto, quanto como ao mesmo tempo impõe um signo universal em sua obra.