Observo que Eitel Santiago de Brito Pereira vem aos poucos fazendo o mesmo percurso intelectual que fez seu pai Joacil a partir de certa fase da vida: caminhar cada vez mais do direito para a literatura. O que é compreensível, pois, para os verdadeiramente vocacionados, as letras literárias têm uma capacidade de encantamento maior que as jurídicas. Principalmente em tempos em que o direito, pelo menos aqui no Brasil e sob determinados aspectos, não tem se apresentado muito atraente nem edificante. Com isso, ganha a literatura paraibana sem que se perca o reconhecido jurista.
Com vários livros publicados, uns mais jurídicos e outros mais literários, Eitel já provou suficientemente que pertence à república das letras. Isto por seu domínio das regras da língua e por seu estilo, requisitos indispensáveis a todo escritor. Sua formação acadêmica é jurídica, sim, mas suas vastas leituras literárias, acumuladas desde a juventude, dão-lhe a base necessária para atuar literariamente com desenvoltura. O que não constitui novidade, já que desde sempre, entre nós, verifica-se esse curioso e produtivo conúbio entre literatura e direito, de que são exemplos, além de Joacil e Eitel, e cada qual com o seu tamanho e a sua especificidade, José Américo de Almeida, Osias Gomes, João Lélis, Virginius da Gama e Melo, Juarez da Gama Batista, Carlos Romero e Luiz Augusto Crispim, dentre muitos outros. Pelo Brasil afora, é a mesma coisa, provavelmente como resultado do nosso histórico bacharelismo.
De sua produção mais literária, podem ser destacadas três obras: O Direito em Vidas Secas – Ensaio em homenagem a Graciliano Ramos, Veredas da Liberdade – Ensaios Literários, Filosóficos e Religiosos e José Lins do Rego – Dois Estudos, todos com o selo da Editora Ideia, mesma casa que agora dá a público seu mais recente trabalho, Impressões Esparsas. Nestes quatro livros, sem prejuízo de outros textos publicados em veículos diversos, vê-se claramente a força do ensaísmo literário no conjunto do seu labor intelectual.
Amigo do autor desde os bancos universitários, conheço sua precoce admiração pela poesia de Augusto dos Anjos, provável origem de seu gosto pela literatura, sem falar, é claro, na inafastável influência paterna. Provido de memória prodigiosa, Eitel recitava de cor, para deleite dos colegas, praticamente todos os poemas augustianos, emprestando-lhes sempre a entonação adequada, o que fazia toda a diferença. É muito possível que ainda hoje, já grisalho mas plenamente lépido, consiga repetir a façanha. Em Eitel, sabe-se, esse talento declamatório anda de mãos dadas com a oratória, esta sempre presente em sua atuação política.e forense.
Este recentíssimo Impressões Esparsas constitui uma reunião do que o autor chamou de “crônicas, resenhas e registros”, textos que, segundo ele, estavam guardados em sua escrivaninha, à espera de serem recolhidos, eventualmente aprimorados, juntados em livro e dados à luz, para que não se perdessem no olvido, destino certo das palavras apenas jogadas ao vento ou que, a despeito de escritas, não logram alcançar o prelo. O autor deve ser daqueles (eu também) que acreditam que o que não vira livro desaparece, mas também sabe que nem tudo merece virar livro. Enfim. O volume inclui também discursos proferidos por Eitel em ocasiões diversas, alguns dos quais, por sua temática e aprofundamento, podem ser tidos como verdadeiros ensaios literários, a exemplo do feito na APL em homenagem póstuma ao escritor Otávio Sitônio Pinto.
Certamente por modéstia, ele nomeou os textos que compõem o novo livro de “impressões”. Não deixa de estar com a razão, se levarmos em conta que, em certo sentido, tudo que falamos ou escrevemos constitui impressões ou delas são o resultado. Pelo inescapável filtro de nossa subjetividade passam até mesmo as coisas e experiências mais objetivas, como bem sabem os cientistas de espírito mais largo. Entretanto, eu diria que, em seus escritos, ele vai além das meras impressões, para atingir o patamar mais alto das reflexões, principalmente naqueles de viés mais ensaístico, nos quais se percebe, com clareza, o trabalho do meditado pensamento. E aí o ajuda muito, não tenho dúvida, a bagagem cultural que vem acumulando desde jovem, para além, muito além dos livros jurídicos.
Em sua Apresentação, Eitel confessa que “a vontade de ser escritor sempre se fez presente no meu espírito”. Isto diz tudo sobre sua prolífica e ascendente carreira no mundo das letras, literárias ou não. Vê-se que ele tem procurado cumprir aquele nobre desejo juvenil, tornando-o uma realidade, acima dos desafios. Não é fácil. Mas, como sabem os que o conhecem, coragem e disposição nunca lhe faltaram.