Quando Barcelona está pronta,
eis o Gaudí.
Eis o Velásquez que chega, quando está pronta Madri.
Pronta, Paris tem Rodin; e Amsterdam,
o Rembrandt.
Geralmente se diz que sem a Revolução Russa não teria havido um cinema como o de Eisenstein, poesia como a de Maiakóvsky, nada como a música de Prokofiev, do mesmo modo que sem Pancho Villa e Zapata não teria existido, no México, nada parecido com aquele trio de gigantescos muralistas - Siqueiros, Orozco e Ribera.
Não aceito a tese com muita facilidade. Os enormes Tolstoi, Dostoievsky e Tchékov foram do tempo dos czares. Arte tanto brotou no teto da Sistina como nas cavernas de Altamira e Lascaux. Pense no que seria a memória de Canudos e do Conselheiro sem o genial “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, ou de Dublin sem o Joyce dos “Dublinenses” e do romance “Ulisses”, ou de Londres sem Shakespeare e os quadros de Turner, ou, mais recentemente, sem a bela caminhada da “Mrs. Dalloway” de Virginia Woolf., pela capital britânica. Nova Iorque, sem dúvida, é Nova Iorque graças às fotos de Feininger, ao Frank Sinatra e à Lisa Minelli cantando “New York, New York”, ao “Manhattan”, de Woody Allen - que abre com a “Rapsody in Blue”, de Gershwin – outra marca registrada da megalópole -, além do romance “Fogueira das Vaidades”, de Tom Wolfe.
William Turner / Caverna Lascaux / Capela Sistina
Que seria da Bahia do século passado sem Jorge Amado, João Ubaldo, Caymmi e Glauber? De Alagoas sem Graciliano? E do interior paraibano sem Ariano, Zé Américo e Zé Lins?
Quando me acerquei da época dos Guararapes pra escrever meu romance “A Batalha de Oliveiros” (Prêmio INL, Ed. Itatiaia, 1989), apesar da qualidade literária de algumas obras consultadas, como “O Valeroso Lucideno e o Triunfo da Liberdade”, de Frei Manuel Calado do Salvador, mais a “História dos Feitos Praticados por Nassau durante oito anos no Brasil”, de Gaspar Barléu, ambos do século XVII, senti, graças à minha paixão pela pintura holandesa, que incluiu Vermeer, Frans Hals e Rembrandt, estar faltando alguém – daqui - que juntasse tais narradores a artistas visuais tão soberbos num só épico. Claro: tivemos Frans Post e Eckhout, mas foram ... flamengos... e menores. Arrisquei alguns fragmentos disso, nesse meu livro, mas há espaço para muito mais.
Johannes Vermeer / Frans Hals / Rembrandt (Fuga para o Egito)
Gostei imensamente de ter participado como ator de “O Som ao Redor”, porque, nele, o cinema – pela primeira vez – abordou a classe média urbana nordestina contemporânea. Venho tentando fazer o mesmo com a nossa João Pessoa. Em 97 publiquei “Shake-up”, pela UFPb, no qual a cidade, em 1930, é personagem principal, mas a obra não repercutiu, apesar do posfácio de Barreto Neto e de um comentário de Hildeberto Barbosa extremamente positivos. Nem repercutiu “Arkáditch” – publicado pela Ideia, com a vida da cidade nos anos 90. Nem “Relato de Prócula” – ed. A Girafa -, em que – tal como em A Cidade e as Serras”, do Eça de Queiroz, e de “Ana Karenina”, de Tolstoi – juntei Pombal, do alto sertão, e João Pessoa de hoje, foi prêmio da Funarte e da União Brasileira de Escritores, do Rio, etc, etc, mas prêmio, sozinho, não resolve, e também não emplacou.
Dizem que quando o povo está pronto, o mestre aparece. Faço parte do caldo de cultura para que isso aconteça.