É quase algo como o “be or not to be”. Uma dúvida shakespeariana que vai tomando conta de minhas noites mal dormidas.
Ah, como é difícil suportar esse outono de minha vida, essa estação sombria, cinza, sem o colorido dos anos que já ficaram para trás nas folhinhas dos calendários... São essas páginas que vamos descartando do anuário pregado em alguma de nossas paredes que nos levam a essas reflexões taciturnas.
Ah, como é difícil suportar esse outono de minha vida, essa estação sombria, cinza, sem o colorido dos anos que já ficaram para trás nas folhinhas dos calendários... São essas páginas que vamos descartando do anuário pregado em alguma de nossas paredes que nos levam a essas reflexões taciturnas.
Quais reflexões? Vou contar a mais cruel de todas elas: A exiguidade de tempo que dispomos ainda nessa concessão que a vida nos concede. Isso mesmo, estou aqui tentando algumas conjecturas acerca do tempo que ainda me resta aqui por estas dimensões.
O que fazer com ele, o tempo? Como não desperdiçar as oportunidades que a cada dia rareiam mais e mais.
Não tenho mais tempo para procrastinar coisa alguma, o que quero ou desejo não dá mais para ficar deixando ao sabor do depois. Tem que ser agora. Já!
Aos amigos que por um motivo qualquer, uma atitude minha, fiz estremecer alguma relação de benquerença, quero ir ligeirinho solicitar meu pedido contrito de indulgência. E o faço aqui publicamente. Não quero rusgas para arrastar pela brevidade do meu futuro. Quero estar em paz. Aceitem um abraço sincero de reconciliação e se fui eu o afrontado, o injuriado, já queimei essas lembranças. O mesmo perdão que roguei um pouquinho atrás é o mesmo e com igual intensidade o que ofereço aqui. O que passou, passou. Não é assim que se diz?
Penso aqui naqueles amores breves, imorredouros da juventude que jurei entre um copo e outro e que na manhã seguinte nem sequer me lembrava mais, digo que foram absolutamente sinceros e infinitos, mas posto que eram chama, apagaram-se com a ressaca do dia seguinte. E por terem sidos verdadeiros, mesmo que por breves instantes, não venho aqui solicitar absolvição por tê-los vivido, mas dizer que valeram a pena e a vida teria sido menos colorida sem eles.
Ah, se pudesse voltar no tempo... Teria visto mais vezes o Sol nascer e depois vê-lo se esconder no final das tardes.
Ficaria mais com meus filhos, teria ido mais ao cinema com eles. Dividiríamos aquele saco enorme de pipocas e mergulharíamos juntos naquelas fantasias como que se essas tivessem sido criadas exclusivamente para nós.
Como pude não lhes ensinar como se constrói uma pipa e depois nos ventos de julho empiná-la num duelo de astúcias com os outros meninos da rua? Não ensinei como se enrola o barbante num peão para depois fazê-lo girar cheio de vontades no chão batido, de terra. Nem deixei minhas meninas brincarem de médicas comigo, tirarem minha temperatura, aplicarem uma injeção no braço (no pai a injeção tem que ser aí). Tudo de mentirinha, como as meninas sabem fazer muito bem.
Nos domingos de chuva, deveria ter permitido que invadissem minha cama durante minha preguiça domingueira. Ter-lhes contado naquelas horas mais histórias do que contei. Muito mais.
Fiquei devendo pelo menos uma refeição do dia com eles, ter perguntado da escola, das tarefas e ajudá-los em alguma dificuldade.
Essas lembranças castigaram-me à noite. Sei que não fui um mau pai, mas fui deixando muita coisa para depois, depois... E deu no que deu. O “agora” é preciso nas duas conotações da palavra: o de necessidade e o de exatidão. O “depois” é imponderável. Pode ser que sim, pode ser que não.
Preciso abraçar a prole, todos já com suas famílias, a mais jovem ainda meio receosa em dar continuidade a essa mágica construção das descendências. Tempos difíceis, alega. Espero que leia esses rabiscos e se anime.
Julho está chegando. Quero dar um esticão até meu torrão, rever muitos amigos de juventude, parceiros de sonhos e loucuras. Rever quem puder rever. Meus tios e tias queridos, meus irmãos, meus primos e primas e, principalmente, os netos.
Quero abraçar essa gente no próximo mês. Eu que em matéria de meses já vivi 872 deles, isso sugere que meus abraços devem ser para já. Com tantos meses no currículo pode não haver o depois. Não é assim?