Particularmente, não tenho de que me queixar. Uma pessoa de hábitos e haveres comuns, guindada a um ofício dos mais perecíveis, não havia de obter mais favores da gente letrada e do público - e por mais tempo - do que este pequeno caboclo que, por acidente, foi colocado nas santas mãos de D.Antonina Freire Ibiapino, tornada Rodrigues depois de deixar as vestes de beata e casar com Manuel Avelino, construtor braçal de uma engenhoca nos fundões entre Areia e Alagoa Nova.
Estive lá na semana passada, recebido fidalgamente, oitenta anos depois, pelos donos atuais do Vitória, o belo casal Deyse-Aquiles Leal, versão moderna e gentil da ancestral aristocracia do engenho, casa e capela.
A paisagem é outra, hoje, outra a hegemonia da cana que cobre o meu antigo mundo sortido de fruteiras e de roçados variados. Em lugar da rapadura, açúcar do pobre, moem-se agora toneladas e mais toneladas de cana que vão adocicar com hálito de melaço a imensa clientela de aguardente conquistada mundo afora e em todas as classes sociais.
Minha crônica, sobretudo em “Sítio que anda comigo” está impregnada desses cheiros e sabores...
Achei sempre difícil ou muito enganoso avaliar o quilate do meu artesanato. Não é fácil fazer a própria depuração.
As Notas do meu lugar foram escolhidas com a parceria de confrades que já se foram como Nathanael Alves, Martinho Moreira Franco e Luiz Crispim, para inaugurar a Editora Acauã, em 1978. Um sítio que anda comigo teve a ajuda forte de Ângela Bezerra de Castro; Filipéia e outras saudades é que é de toda a minha culpa, aliciado pela leitura de Celso Mariz, Coriolano de Medeiros e Juarez Batista, escritores de vocação que me seduziram para a história da Paraíba.
Ao lado do verde, do ar sutil de que já falava o governador holandês Elias Herckman, me senti em casa nesta cidade, as ruas de entrada sem muita diferença das cidades do meu interior. Convivendo numa Casa do Estudante de interioranos sertanejos e brejeiros, não era outro o sentimento entre eles. E me senti em dívida com a cidade próxima dos seus 400 anos, merecendo a consideração em prefácio do historiógrafo José Octávio.
Com os olhos no chão, coletânea de hoje, me pareceu justificar-se porque nenhum desses meus três livros suscitou reedição. Notas do meu lugar levou quarenta anos para esgotar. Apenas Café Alvear e Retrato de memória pareceram me pedir uma reedição melhorada. Depois vieram as novas, dessa fase do adeus ao jornal impresso, acolhidas pela A União de todos os tempos.
Minha dívida com a crítica começou pelas Figuras e Fatos, último livro do venerável Celso Mariz, editado em 1976. Flagra-me vindo de Alagoa Nova, passando por Campina “onde não sei se foi estudante ou vagabundo – diz ele.
Não vou nomear aqui a lista interminável de incentivadores de ontem e de hoje que se seguiram ao grande Celso de meio século atrás. Iria omitir, passar pelo pior dos remorsos para quem escreve.
Coube espontaneamente a Juca Pontes, que vi nascer nas artes do editor insuperável, tomar a si a feitura desse novo livro. Com ele veio juntar-se novamente a mim Flávio Tavares, a quem eu já não podia mais pedir, pelo tanto que lhe devo. A recolha e sucessivas seleções é mais de Paulo Emmanuel do que minha, ele muitas vezes constrangido com a depuração. Se o leitor não quiser perder tempo indo mais adiante, fique com a epígrafe que fui buscar em Fernando Pessoa.