Era verdadeiramente um bosque, que começava nos sítios que escorriam para a Lagoa e vinham ondular-se nos baixios de mangues contornado hoje pela avenida Ayrton Senna. Era como este bosque de Tambiá se apresentava a quem vinha menino do sertão, convertido cedo no professor Coriolano de Medeiros, quando plantou seu preciosíssimo “Dicionário Corográfico”, em 1911. Que livro nos legou!
Agora, quando já se dispensa livro para entrar na geografia do mundo, ou quando, de um clique instantâneo avisto daqui a rua em movimento onde mora ou trabalha a neta Lays, em Madrid, é que o dicionário de Coriolano ultrapassa os fins puramente geográficos a que se propôs. De dado geográfico passou a relíquia do tempo, da vida em transformação.
Ainda bem que, dispondo de todos os avanços da informática, tenha surgido quem lhe fizesse a justiça de reconhecer os mais diferentes valimentos, reeditando-o através do IFPB, sob o reitorado do professor Cícero Nicácio, ao se comemorarem os 140 anos de Coriolano.
Mas voltemos ao bosque do Tambiá, guardado a sete chaves no livro de Coriolano, tão verde e bem mais extenso em sua flora escrita e bem escrita, lavrada a bico de pena.
Estacionei beirando o oitizeiro ao lado da rádio CBN, hauri o que soprava de ar, e como estavam reformando o gradil procurei uma brecha para ver como se achava a mulher em cio que o escultor Abelardo da Hora deixou derreada nos jardins da Cabo Branco ... E quem vejo bicando o umbigo daquela harmonia excitante em suas formas de cal e gesso?
Ora quem! Uma criaturinha que me faz lembrar outra obra fundamental, “Aves da Paraíba”, de outro grande paraibano, o velho Heretiano Zenaide, migrante do horto precioso que ele cultivou na usina que lhe pertencia, e que o futuro dono não perdeu tempo em conservar quando se apossou da Usina Tanques.
E quem me levou a essas antiguidades de toque saudoso? Ninguém que possa despertar atenção nos meninos de rua. “Ninguém não...”, direi como o padeiro de Rubem Braga, que rompia a madrugada e o sono dos outros na entrega do pão. E que era compensado com esse diálogo:
(“Quem está aí? – perguntam lá dentro. / Ninguém não, é o padeiro.”)
Ninguém não, apenas o voo de repetidos e nervosos saltos da lavandeirinha confiada, alegre, “na sua preferência pelos arredores humanos” como a descreve o doutor Heretiano. Tão confiada, bicando os arredores sensuais dessa mulher que Abelardo da Hora nunca supôs viesse enfeitiçar lavandeiras.
“A graça e vivacidade com que se cumprimentam os casais, as carícias que se trocam de asas abertas, entre cantigas, a mansidão confiada que não encontra símile nas outras aves, criaram-lhe um ambiente de simpatias populares”. E são, diz o povo, as lavandeiras de Nossa Senhora.
Faltam-me os outros livros do Dr. Heretiano Zenaide: Livrinho dos nossos animais, Meu arbóreo Cariri. Imperioso é que não faltassem aos estudiosos de hoje, às estantes universitárias, às bibliotecas públicas.