Ah, esse ar de turista. Um jeito de quem não está nem aí… E não está mesmo. O mundo que ele percorre é outro, bem distinto do que a história soterrou.
Torres, arcadas, câmaras suntuosas onde reis dormiam com suas esposas – e, em não menos luxuosos anexos, com as belas concubinas – já não são os mesmos de outros tempos. Falta o que lhes dê vida.
Torres, arcadas, câmaras suntuosas onde reis dormiam com suas esposas – e, em não menos luxuosos anexos, com as belas concubinas – já não são os mesmos de outros tempos. Falta o que lhes dê vida.
São imagens descarnadas, esqueletos preservados para a contemplação nostálgica (por vezes indiferente) dos que querem escapar ao cotidiano enchendo os olhos com outros espaços. A tudo o turista olha com um enlevo dúbio, misto de admiração e exaspero (por que se tem de enfrentar tantas filas?).
Museu do Louvre (Paris) Monique Renne
Tudo muito parecido com hoje – só que mais bonito! Bonito! Dessa beleza que a distância e o mistério imprimem ao que se desfez no passado. Ou que permanece intacta por já não existir o que a tisnava com a mancha da injustiça ou do opróbrio. Mas nisso o turista não quer pensar – do contrário, não seria turista. Depois de um longo périplo, e de tantas fotos, ele rumina com um prazer muito pouco espiritual o variado café da manhã que no dia seguinte tomará no hotel.
Denise e Chico Viana (França)Acervo do autor
Millôr escreveu que turismo é prostituição, referindo-se certamente à penetração de estranhos em lugares com os quais não têm nenhuma afinidade. As atrações lhes são oferecidas por um bom dinheiro. Devem então se mostrar pródigos também nas compras e nas gratificações – o que não é de todo ruim pois faz marchar a economia, que é a matriz de tudo.
A viagem permite que a gente sinta como andam as coisas lá fora. E não estão muito diferentes daqui. As TVs mostram violência e corrupção, que parecem a tônica do capitalismo moderno. Já os radinhos de pilha dos motoristas de táxi, complementando o noticiário, dão conta do ânimo do povo.
Denise e Chico Viana (Portugal)Acervo do autor
Eventos como esse não mascaram a poesia e a gratuidade que existem em viajar, romper as amarras da rotina, adentrar outras geografias e espreitar no rastro do tempo um presente perdido, que amanhã será o nosso.