Não sei quem teve a ideia de medir nossa idade, não mais por anos de vida, nem por quantas voltas a Terra deu em volta do Sol enquanto cumprimos nossa passagem por aqui, nem pela quantidade de primaveras que desfrutamos na mágica sucessão das estações. Encontraram um singular eufemismo para dizer que estamos mais para lá do que para cá. Isto é, estão medindo nossas idades por cilindradas. Quando esse nosso motor avança adiante das quatro ponto zero, a situação começa a ficar preocupante, pois a partir daí, nessa mecânica surreal, quanto mais cilindradas, menos potência no motor.
Nas perigosas cilindradas em que está girando meu motor, todo cuidado é pouco. Sempre que posso, lá vou eu para oficina (especializada, se possível) tentando uma revisão geral. Carburador sempre abastecido e não com qualquer água. Só filtrada. Lubrificação sempre em dia e nada de forçar uma marcha. Sempre respeitando o conta-giros.
Sem esses cuidados e mais alguns, esta máquina aqui pode bater biela e aí, já viram, o caminho é a sucata.
Mas, tem gente que parece ter vindo de uma montadora de qualidade superior às nossas. Alguém se lembra de Bruna Lombardi? Aquela que fez o papel de Diadorim na TV, lembram-se? Ela é um tiquinho de gente, 1,55 m de altura, linda que só. O motor dessa danadinha contabiliza hoje sete ponto zero cilindradas, mas está rodando como se fosse três ponto dois no máximo. Continua linda, lindíssima. Dá até inveja.
Estou pensando quantas cilindradas a mais essa engenhoca aqui ainda aguenta E aí, meus amigos e minhas amigas, andei conjecturando, onde e em quem eu deveria me espelhar para dar um esticão em meu calendário; ou melhor, nas minhas cilindradas. Vamos à lista.
Estaria contente com mais umas dez. Na família, tenho tios rodando bem e com motor acima das oitenta. Nem precisaram de recauchutagem, estão com o motor tinindo. Cuidaram bem da máquina, não cometeram excessos, por isso essa rodagem toda. Dá inveja também.
Quando me lembro de Oscar Niemeyer que chegou às dez ponto quatro e Luiz Carlos Prestes às nove ponto dois, comecei a aventar a possibilidade de voltar às minhas ideologias dos tempos de mocetão . Pode ser uma receita para uma quilometragem bem além das usuais. Pelo menos é o que esses dois exemplos sugerem. Ou que tal mudar de ares?
O país com as pessoas mais longevas é o Principado de Mônaco, onde ocorre o mais tradicional GP de Fórmula 1. Talvez por isso mesmo lá, em média, os motores chegam a oito ponto dois e mais uns avos. Mudar para lá? Não dá. Haja grana. Lá é tudo muito caro. Devido a essa variável econômica, melhor é eu ficar aqui mesmo no Condado de Jaguaribe.
Já que o jeito é ficar, pesquisei na internet e descobri que segundo a ONU, a expectativa em 2016, é de que o brasileiro chegaria às sete ponto cinco. Pela minha aritmética, tenho só mais três para acrescentar. Quando penso nisso, não durmo.
Mas, há sempre uma luz no fim do túnel. Qual seria essa fonte luminosa? Onde me espelhar? Onde buscar exemplos inspiradores?
Ela, minha mãe, que me achava lindo e como mãe não mente, já fui pensando em Alain Delon, pois no quesito beleza estamos nós dois, pau a pau. Já o motor dele chegou aos oito ponto sete, mas a lataria está deixando a desejar e ali não há funilaria ou lanternagem que resolva. Mas se o meu motor chegar lá, vou me dar por satisfeito.
Pensemos noutra possibilidade ou critério para eu esticar minha quilometragem: Religiosidade! Papa Francisco está nas oito ponto seis, o que eu considero um número de cilindradas que estariam de bom tamanho para mim. Dalai Lama XIV, tem seu mecanismo atingindo oito ponto sete. Só não quero ficar com aquela mania dele. Achei muito feio quando vi na internet. Chico Xavier, o mais notável médium brasileiro, atingiu algo invejável: nove ponto dois. Mas, no caso exige-se muita entrega, desprendimento e caridade, virtudes que não serei capaz de praticar. Então fica difícil. Acabo concluindo que no caminho da fé terei dificuldades com essa mecânica de autos que contabiliza meus dias no planeta.
Então, o negócio é ir levando a vida como Deus permite. Quando dá, vou ao bar do Lulinha (oficina, como chamo esse estabelecimento) colocar um aditivo amarelo, na temperatura certa nessa máquina aqui, prosear com os amigos, celebrar a vida e agradecer sempre pelas cilindradas que conquistei.
É o que dá para fazer.