A primeira vez que eu ouvi alguém falar a respeito do assunto foi numa conversa com o meu cunhado Edmundo Sebadelhe Valério, de saudosa memória: Toda esta vida que estamos vivenciando na Terra, por mais complexa e laboriosa que possa parecer, não passaria de uma experiência químico-física, num laboratório de seres de uma civilização muitíssimo avançada.
Ouvi, achei interessante, mas do alto dos meus 17-18 anos, na época, eu ri e achei que era uma coisa absolutamente impossível o que ele me dizia. Aceitei como uma provocação. Depois que vi o filme Homens de preto (Men in black, EUA, 1997, direção de Barry Sonnenfeld), com os excelentes Tommy Lee Jones e Will Smith, antes do tapa, uma luzinha acendeu no cérebro e começou a piscar com insistência. Se os leitores lembram, no final do filme, a tão buscada galáxia, que poderia desencadear uma guerra interestelar e destruir completamente a Terra, não passa de uma bola de gude, em que se encerra todo o universo conhecido, usada como uma peça de jogo infantil.
O que mudou dos meus 17-18 anos para os meus 51? Muita coisa. A facilidade com que a informação começou a circular deixou ao alcance de leigos um conhecimento do universo, antes restrito aos especialistas, que se pode resumir da seguinte maneira: vivemos num planeta diminuto, orbitando em torno de uma estrela idem, circunscrito a uma galáxia, entre bilhões de galáxias. Nos meus 66 anos, a mudança ainda foi maior: o universo que se enxerga hoje, através dos telescópios eletrônicos ultramodernos, é infinitamente menor do que aquele que ainda não se enxerga. Ou seja, do ponto de vista das grandezas astronômicas, a Terra é como o traço, para marcar aquele candidato que nem é citado nas pesquisas eleitorais.
A partir daí, eu comecei a dar atenção à luzinha piscante. Hoje, ela ainda pisca, muitas vezes com a mesma frequência, mas para outras coisas, não mais para a viabilidade além da brincadeira do filme Homens de preto, uma ironia, para falar de nossa insignificância como seres que acreditam ser a quintessência cósmica. Tenho a mais absoluta certeza de que somos exatamente o que o meu cunhado Edmundo Valério falou, tão provocativamente.
Seres de inteligência avançadíssima estão com uma experiência, cujo cerne é a Terra, em andamento no seu laboratório. A Terra, como planeta que se encontra numa posição privilegiada em relação ao Sol. A grande pergunta é: por que este planeta não progride ou quando progride o faz de maneira tão lenta? Trata-se de um astro sólido, com muita água, oxigênio, temperaturas que permitem várias formas de vida, inclusive a mais perigosa, a racional, mas que encontrou um mecanismo nas leis para buscar se conter e se defender de si mesma. Tudo tendia para uma experiência muito promissora.
Depois de milênios — na nossa cronologia – de experiência, os cientistas intergalácticos observaram que, apesar de avanços em alguns pontos, havia algo que colocava toda a experiência a perder. Constataram, então, que a experiência sempre desandava, em certo recanto do paraíso terrestre, denominado por seus habitantes de Brasil. Pois é, meus amigos. O Brasil estava colocando a experiência à beira do fracasso, depois do esforço de alguns anos – na cronologia deles – e de muito investimento financeiro e em recursos humanos, da parte do CNPq lá deles. O que fazer? Decidiram excluir o Brasil da experiência. Não, não foi, simplesmente, excluir o Brasil. Em tempos difíceis, como os atuais, os cientistas, por mais renomados, experientes e competentes que fossem, seriam denunciados por falta de empatia e tachados impiedosamente de excludentes e, claro, seriam cancelados, para usar um termo da moda. A decisão foi de colocar o Brasil num tubo de ensaio à parte, para tentar descobrir qual era o problema que emperrava a experiência e a impedia de ir à frente.
Pois bem, depois de um certo tempo, descobriu-se que o maior problema do Brasil era a eleição. Calma, aquela civilização avançadíssima considerava a eleição um grande avanço do passado, embora não a utilizasse mais, pois seus habitantes haviam dado um salto de autossuficiência governativa. O estágio de inteligência em que se encontravam desobrigava a necessidade de eleições e de líderes. Todos sabiam o que fazer e o fato de se comunicarem por impulso telepáticos não permitia que houvesse algum atentado ao indivíduo ou à sociedade. O crime ou a exploração da boa-fé, simplesmente foram erradicados, o que os levou a estudar a Terra, para considerar a viabilidade de se aplicar o mesmo sistema no nosso planeta.
O problema, detectado pelo cientista Plato, era o seguinte: a cada quatro anos, na eleição para o líder máximo do Brasil, havia uma espécie de reinicialização do sistema. O Brasil estava sempre recomeçando, porque nada do que o líder anterior fizera estava certo. O líder atual tinha de começar tudo de novo: educação, saúde, economia, transporte, segurança, tecnologia... O interessante é que quando os cientistas intergalácticos foram a fundo na pesquisa, descobriram que todas as mudanças sugeridas a cada novo governo eram, na realidade, para que tudo continuasse da mesma maneira: uma casta de privilegiados no poder, uma sobretaxação de tributos e o grosso da população na miséria física e intelectual...
A decepção foi grande e decidiram deixar de lado o Brasil, enquanto cuidavam do restante do planeta Terra. Passados alguns anos, a experiência que fora esquecida chamou a atenção por causa do surgimento de fungo, no tubo de ensaio. Os cientistas exultaram. Flemingus, um dos notáveis, viu no fungo a possibilidade de uma renovação, decidindo estudar que tipo de vida se propagara ali no tubo de ensaio mofado. A última notícia que me chegou é que os cientistas retornarão à experiência, só vão deixar que o fungo se alastre mais um pouco, o que não é difícil, dadas as circunstâncias, para terem mais material de estudo coletado. Sossirius, o filólogo e linguista deles, que trabalha como porta-impulsos telepáticos daquela civilização, fez uma declaração sobre o fato: Mrmxyzptlk Kltpzyxmrm. Com muita dificuldade, pois trata-se de uma língua monossilábica, aglutinativa, consonantal e tonal, fiz a tradução para a língua portuguesa e obtive a seguinte afirmação: para melhorar, ainda vai piorar muito.