Todos os sábados eu leio as crônicas do engenheiro Carlos Pereira de Carvalho, de quem sou leitor assíduo.
Assim que recebo o meu exemplar, o primeiro caderno que pego é o de Cultura. Lá na segunda página me deleito com os deliciosos passeios no passado em nossa cidade, promovidos por Carlos Pereira.
Geralmente ele escreve sobre o seu bairro de meninice e adolescência, Jaguaribe. Mesmo considerando a diferença de idade dele para mim, naquele tempo os anos passavam lentamente, e a vida nos bairros de João Pessoa, inclusive no Tambiá que eu morava, eram muito parecidas. O fato é que o seu tempo parecia-se muito com o meu tempo, mesmo anos depois, com pequenas diferenças.
Assim que recebo o meu exemplar, o primeiro caderno que pego é o de Cultura. Lá na segunda página me deleito com os deliciosos passeios no passado em nossa cidade, promovidos por Carlos Pereira.
Geralmente ele escreve sobre o seu bairro de meninice e adolescência, Jaguaribe. Mesmo considerando a diferença de idade dele para mim, naquele tempo os anos passavam lentamente, e a vida nos bairros de João Pessoa, inclusive no Tambiá que eu morava, eram muito parecidas. O fato é que o seu tempo parecia-se muito com o meu tempo, mesmo anos depois, com pequenas diferenças.
Pois bem, a crônica deste sábado foi O Sábado de Aleluia de antigamente. Uma delícia! Ao ler, passei a recordar como eram as Semanas Santas de minha infância e juventude.
Começa que era uma semana chuvosa, boa para dormir, pois só tinha aulas nas segundas e terças-feiras.
Estudávamos num colégio católico marista, o Pio X, e no Domingo de Ramos eu acompanhava Mamãe até a missa, na sua confortável Capela. Mamãe me pedia para arrancar alguns ramos dos coqueiros da nossa casa. Com muita habilidade, a nossa empregada fazia uma cruz com alguns dos ramos. Ao longo da semana pouco se estudava, pois aconteciam vários eventos para os alunos: palestras, novenas, terços e a confissão preparatória para a comunhão.
A confissão era muita apreciada por nós, porque saíamos da classe com a desculpa de confessar. Nas filas para o confessionário acontecia de tudo, a maioria inconfessável. Mas não sei se chegava ao conhecimento do capelão do Pio X, a quem confessávamos rapidamente, pois ele tinha um hálito anti-social, sensível mesmo através da tela do confessionáio.
As missas para a comunhão começavam ao amanhecer do dia, Como tínhamos que ir em jejum, pois era pecado alimentar-se antes da confissão, era comum alunos desmaiarem, acometidos de hipoglicemia, que naquele tempo chamávamos de “turica”.
Mas tinha o lado bom: as missas eram ocasiões para conhecermos as meninas dos outros colégios. Era quando praticávamos o doce exercício do flerte! Que muitas vezes rendia namoro.
Nas Semanas Santas aguardávamos com boa expectativa a Quarta-feira de Trevas: era a oportunidade de passar um dia inteiro sem enfrentar a chatice de um banho, pois era pecado tomar banhos nesse dia santo. Mesmo que chegássemos emporcalhados em casa.
Chamava à atenção de todos nós a procissão do Senhor Morto. É que geralmente aconteciam coisas, digamos, fantásticas quando o cortejo passava ao longo da Rua Duque de Caxias.
Uma vez, no momento exato em que o andor passava na frente do Clube Cabo Branco, uma chuva de cartas de baralho derramou-se sobre o cortejo!
Acontece que nesse exato momento Pedro Cordeiro acabara de perder uma pequena fortuna no reservado do primeiro andar do clube. Com raiva, jogou todo o baralho pela janela.
No cortejo, viram-se os bajuladores correrem para tirar cartas de cima do governador João Agripino e do Coronel Candal, comandante da guarnição federal.
Outro ano, no momento em que o cortejo passava em frente ao foto que ficava ao lado da loja O Faqueiro, de Seu Ciro Medeiros, as portas da sacada do primeiro andar se abriram e apareceu a esposa do fotógrafo, seminua, o robe aberto, gritando: “Socorro! Segurem este monstro!” Parece que nesse exato momento ela estava tendo uma “discussãozinha” com o marido, que era muito ciumento.
O Sábado de Aleluia era também muito esperado por nós, pois era quando acontecia a malhação do Judas da casa de Seu Alberto Teixeira. O Judas era defendido por Fernando, Beto e Artur Teixeira com unhas e dentes. E espingarda Bala U!
A brincadeira começava na véspera, na noite da sexta-feira. Os rapazes se juntavam para roubar o Judas. Geralmente não conseguiam. Mas às vezes usavam algum estratagema para desviar Fernando para o outro lado da casa, que era enorme.
Participavam dessas batalhas o meu irmão mais velho, João Neto, Marcelo Porto, Marito, Carlos Joubert, Guilherme D’Ávila Lins, Tatá Monteiro, Afrânio Boquinha, Gilson Caveirinha, e outros rapazes corajosos.
Mas invariavelmente o destino do Judas era mesmo a fogueira que Seu Alberto fazia. A fogueira era a mais alta da Capital: da altura da casa! O Judas era despedaçado por explosões de fogos, contidos nele, ou arremessados.
Mas o Judas mais famoso da cidade era o da Vila dos Motoristas, em Jaguaribe. Geralmente era matéria da página policial dos jornais do Domingo de Páscoa, devido aos episódios que aconteciam, derivados das batalhas pelas tentativas de roubar o Judas, que era defendido pela turma da pesada da Vila dos Motoristas, liderada pelo famoso Galego da Vila, que trabalhava no Banco do Nordeste.
O Galego era famoso, temido em toda a Capital. A sua presença numa festa era vista como mau agouro: era sinal de que aquela festa ia terminar mais cedo. E terminava.
O Domingo de Páscoa era mais tranqüilo: íamos à missa bem cedo, depois tomar banho na praia de Tambaú, e voltar para almoçar em casa com toda a família. E sair correndo para pegar a sessão da tarde no Cine Rex. E depois, sair para flertar no quem-me-quer na Lagoa, até a hora de ir para casa jantar.
Hoje tudo está mudado. Essas tradições, parece que desapareceram. A internet, as infames redes sociais, o modernismo acabaram elas. Talvez ainda reste algum Judas. E nada mais.
É uma pena, pois as novas gerações ficaram privadas dos prazeres que nós experimentávamos. Não sabem o que perderam.
Ah! Já não se faz mais Semanas Santas como antes...