As velhas casas escoam seus sapatos a cada chuva, a cada partida Mas há um íntimo que perpassa a ausência: O peso da...

Ao farfalhar das sombras

poesia capixaba jorge elias neto
 
 
 
As velhas casas escoam seus sapatos a cada chuva, a cada partida Mas há um íntimo que perpassa a ausência: O peso das solas, dos passos, das meias volta indecisas, do andar em devaneio e um certo calor despido de inocência Velhas casas, cenário do canibalismo dos justos, dos que se largam sobre o espaldar do trono da misericórdia Sobre o seu manto-chão resiste as crostas dos dias, o gozo dos loucos, o furta-cor do arrependimento, a pele corrompida.
VAGAROSO
Busque o caminho mais longo, já que as folhas de outono se espalham entre as trincheiras e se vê melhor o sem fim do eterno instante quando se pisa na mansidão da trégua . Busque o caminho mais longo, já que a verdade se arvora nas bocas tortas como beijo que espuma certezas, e o silêncio se disfarça nas sombras tristes. Busque o caminho mais longo, já que a crença ou sua ausência é a vaidade de muitos e a loucura de tantos outros, e o que se chama paz pouco tarda no olhar da inocência.
QUAL A FACE QUE SE DÁ AO TAPA?
Do lado de cá do muro da eternidade, plantam-se lírios e desavenças, e na parede de (h)eras encravadas a certeza da escalada dos justos se perde sob as avencas pensas.
ECO
... calar é fazer sua própria confidência.
Jorge Verly
Voz, calombo na barriga do vácuo, remorso, parto prematuro, um furo na bexiga perfeita do silêncio.
PAI
No chão lavrado se faz premente o fruto. Se o em torno repele, formam-se na pele sulcos dilatados donde escorrem incertezas. No vão arado se faz presente o bruto. A lida cobra. Paga-se pelo sonho que se tece, pelo brilho que se derrama. No pião lançado se faz latente o grito. É torpe cada lance que se desgasta. Auroras resgatadas não dão sentido ao farfalhar das sombras. No dom caçado se faz urgente o luto. Muitas coisas resumidas, distorcidas, não cabem no bolso sem fundo, na profundeza do engasgo.
MÃE
Que espanto este corte, a encruzilhada da despedida, onde seu nome virou reminiscência, e a dor, negociada, é outra dor, já não tragédia, mas um acidente previsto, um sussurro de morte, uma saudade e um relance de saber-se amado.
CORTE PROFUNDO
A carne é de todos nós, mesmo quando cortada e exposta em histórias esquecidas A carne é de todos nós, mesmo que perturbe nossa estada no paraíso A carne é de todos nós, e já é tarde para não reconhecermos nela nossa fisionomia A carne é de todos nós, e mesmo sem cheiro tem memória e um sorriso cínico de cumplicidades.

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