Um dos textos de Rubem Braga de que mais gosto é sobre uma feira que o cronista descreve da janela do seu apartamento em Copacabana. Quando ele o escreveu não se acrescentava o adjetivo “livre”, pois as feiras eram por natureza um espaço de liberdade. Tudo ali se vendia, tudo estava ao alcance do olho do freguês.
Braga mostra o que pode haver de belo naquele ajuntamento aparentemente banal. Destaca, por exemplo, uma mulher que sopesa um molho de hortaliças com um “experiente carinho”. E estende o olhar lírico ao conjunto de pessoas simples que, sem ambições de riqueza, vendiam suas mercadorias para sobreviver.
Das muitas vezes em que fui à feira com a minha mãe, guardo a lembrança das barraquinhas de frutas, legumes, doces, e do enfático apelo dos vendedores. Me chamavam a atenção os balaieiros, que corriam em direção aos possíveis clientes com seus enormes cestos na cabeça. Tinham um preço fixo para acompanhar os fregueses e conduzir as compras até as suas casas, mas era possível barganhar e conseguir um valor mais baixo.
Acertado o preço, eles seguiam as patroas por entre as barracas. O peso dos balaios ia aumentando, mas aqueles exímios equilibristas os mantinham na cabeça sem os tocar. Não havia desvio nem tropeço que fizesse as mercadorias caírem. Isso deixava admirada a criança que eu era.
A feira tinha um quê de circense também pela variedade dos tipos. Nela havia os palhaços – vendeiros que chamavam os clientes com ditos engraçados – e os contorcionistas, que apertados em suas barracas apregoavam a qualidade dos produtos.
Hoje ainda há feiras, mas não com o prestígio de que desfrutavam antigamente. Elas foram suplantadas pelos supermercados, cuja variedade de ofertas, a assepsia das instalações e a ordem na apresentação das mercadorias trouxeram comodidade ao fastidioso exercício de ir às compras.
É pouco provável que o velho Braga fizesse uma crônica sobre os supermercados. Eles se impuseram pela praticidade e são uma conquista inevitável da vida moderna, mas lhes falta a liberdade que as feiras ao ar livre propiciavam. Se protegem do sol e da chuva, tiram às crianças o prazer de circular por caminhos imprevistos e às vezes se deparar com os tipos mais estranhos.
Sou um adepto da modernidade e considero o supermercado um avanço (nada mais tolo do que ir de encontro ao progresso), mas em nenhum deles encontro o prazer que eu tinha, por exemplo, ao surpreender um vendedor de roletes ou algodão doce e pedir à minha mãe que os comprasse para eu saborear ali mesmo.
A feira, como a praça, é do povo. E se não tem condores, como o céu do poeta, tem passarinhos e outras aves que encantam os meninos. Tem o cheiro das frutas e o vozerio do povo. Tem enfim a diversidade social, que nos faz perceber melhor o pulsar da vida.