Afrodite, Ártemis, Hera, Atena, Deméter, Héstia... O que elas têm em comum? Além de serem deusas, imortais, elas têm em comum a sua singularidade, signo de subjetivações distintas, específicas, concernentes ao domínio de cada uma, ao seu âmbito de atuação.
Diferentemente dos deuses, cujas funções específicas circunscrevem-se mais a uma topografia e a uma atuação mais concreta — Zeus, ao mundo superior, morada dos deuses; Hades, ao mundo ctônico, subterrâneo, morada das almas dos mortos; Poseidon, aos rochedos e mares; Hefestos, deus ferreiro, ligado a sua oficina no Olimpo; Ares, a guerra sangrenta - as deusas atuam, dentro da hierarquia divina, como pilares, no entanto, forças abstratas, verdadeiros dínamos, sem as quais o mundo faleceria.
Afrodite, vinda das águas do mar, nascida do esperma ejaculado do pênis de Urano após ser decepado pelo filho Cronos, traz, em sua essência, a pulsão de vida. Ela se faz presente em cada ser desejante.
Hera, soberana, traz em si a força da realeza. E é nesse âmbito que ela atua, seu ser desejante, como força motriz e mantenedora da instituição do casamento, pilar da sociedade em que é senhora.
Atena, guerreira e artesã, é a deusa do estratagema. Seu desejo de guerra expressa a sua inteligência. Filha de Métis, personificação da Astúcia, a deusa exprime força e criatividade.
Deméter, deusa dos grãos, traz em si a fecundidade como expressão do seu ser desejante. Ela é quem alimenta os homens, fazendo brotar a terra. Deméter é nutrição, vida para os mortais.
Héstia, deusa da lareira, do lar, é a expressão do fogo que alimenta a vida e que possibilitou nada menos do que a civilização. Ela preserva a religiosidade, a família e a continuação das gerações.
Pensar a subjetivação de cada um desses femininos, é pensar em singularidade. O ser desejante que pulsa em cada uma das referidas deusas define suas características particulares, sendo elas fundamentais como forças mantenedoras do cosmo.
Ártemis, deusa casta por decisão própria, senhora dos bosques, é a deusa caçadora, cuja força está representada nas flechas que direciona aos cervos que caça. Ela é a força selvagem, indomável.
Ártemis, caracterizada portando o arco e a flecha, é a deusa da caça e dos bosques. O animal a ela consagrado é o cervo, denotando a sua natureza selvagem e indomável. Filha de Zeus e de Leto, opta pela castidade após presenciar o sofrimento da sua mãe ao dar à luz seu irmão gêmeo Apolo, ajudando, inclusive, no parto. Deusa virgem, decide não passar pela mesma dor que a mãe, dispensando os trabalhos de Eros e prescindindo do enlace amoroso. O séquito que a acompanha é formado por jovens virgens como ela. Se alguma delas quebrar esse princípio, é punida e expulsa do grupo.
A despeito de ser virgem, é interessante observar que as armas que a deusa carrega consigo, o arco e a flecha, denotam a sua ação ativa, fálica. Seu feminino é ativo, pois ela mira para atingir a natureza selvagem que são os animais por ela caçados. Quando ultrajada, é com elas que fere o adversário ou aquele que tentou, de alguma forma, violá-la. A sua escolha em se manter casta exime-a da vulnerabilidade do sofrimento, tanto por não haver a possibilidade de parir uma criança, quanto por não ser tomada pelo gozo do sexo ou pela inquietação do desejo erótico. Com sua ação, é ela que está no comando, é ela que detém o poder.