Chegado à Capital, ao estrear na praça que às oito da manhã já se via repleta em suas mais diversas rodas de conversas, minha ânsia era entrar na roda. Conhecer e dar-me a conhecer com a mesma ingente necessidade de quem buscava o abrigo.
Já haviam me deixado armar a rede num quarto da Casa do Estudante. De forma precária, enquanto o sócio ocupante terminava as férias em Taperoá. O quartinho de porta e janela comportava apenas duas camas, dois sócios.
Ficara um Nóbrega de Santa Luzia, e atravessar uma rede de viés ia depender da chegada de um Vilar, Dorgival, parente dos Suassuna, depois prefeito, governador e, desde cedo e até morrer, jornalista-escritor.
Vilar, Nóbrega, Suassuna, da classe dos fazendeiros de gado e de algodão, alguns deles precisavam recorrer a entidades criadas para os menos abastados. Não era nem por sovinice, mas porque a educação, em pleno século XX, nunca fora exigida como efetivamente imperiosa mesmo pelas lideranças dirigentes. Vinha como dádiva a partir do primeiro rei, talvez o maior deles, a quem se credita o milagre das primeiras instituições culturais e de haver segurado a imensidão territorial do país, falando a mesma língua. Entrou na história popular como um porcalhão a se lambuzar no frango. São coisas que comecei a curtir e até a colaborar a partir dessa praça, e em seu momento mais influente, tentando continuar nela, como bem se vê, sem que a praça exista mais. Nenhuma praça ou recinto em que um bom-dia ajude a nos identificar. Surpreende, bate o coração quando, já não digo amigos, dois conhecidos se saúdam. Às vezes se conhecem mas não se dispõem a falar.
Moro há 22 anos num edifício em que 33 famílias coabitam. 33 famílias, pouco ou mais de 130 pessoas obrigadas a passar por duas portas (elevadores) duas ou três vezes por dia. Se muito, uma dúzia delas se cumprimenta. Dessas, umas três ou quatro em grau de amizade. Duas portas comuns que pressupunham uma comunidade, associação, comunhão.
Entrei a descer, a porta se abriu e com ela um sopro de perfume como atmosfera prodigiosa do novo ano. Envolvia uma senhora que não sei se condômina, com um cachorrinho branco e um mimo de laço verde no pescoço. Procurei um lugar, não sem antes esboçar discreto cumprimento. Foi para a senhora, naturalmente, que se manteve difusa no celular. Demorou bem mais que o tempo do relógio. Até que a porta se abriu e vi que descera só, que os olhos haviam me enganado. Veio à tona, então, aquela busca primeva de diálogo que me levou, numa manhã remota, à janela de Coriolano de Medeiros, debruçado em sua solidão octogenária, sem mais a luz dos olhos. Busca bem-sucedida, tanto para mim que toquei em mão simplesmente imortal quanto para ele em sua esperança com os aprendizes artífices.