O mestre Kuòān Shīyuǎn descreveu a história da experiência humana antes do século XII e trouxe uma interpretação Zen Budista dos dez e...

Um animalzinho e um homenzinho

mitologia classico sertoes
O mestre Kuòān Shīyuǎn descreveu a história da experiência humana antes do século XII e trouxe uma interpretação Zen Budista dos dez estágios integrantes do caminho da perfeição em outra perspectiva. Os estágios são touros. Muito da mitologia grega associa nosso eu animal a um touro voraz e desconhecido à solta em nossas entranhas.

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Nessa mesma tradição foram descritos o Minotauro, cabeça de touro e corpo humano, e o Centauro, metade humano metade cavalo, os quais demonstram a ligação desses animais vivos dentro dos humanos, à espera de suas descobertas adormecidas. No Centauro, o animal é dominado e, no Minotauro, o animal domina o indivíduo.

Essas associações contam sobre a existência de nosso núcleo de consciência animal que se preocupa em sobreviver e procriar, motivado pelos instintos de sobrevivência, e também possui valores como honra, fraternidade, justiça e beleza, que nos desenham humanos com alma.

Quando nos consideramos seres humanos, nossa parte mais característica predomina sobre o animal. Porém, muitas pessoas têm sua forma externa igual a animais com dentes afiados.

Platão desenhou nosso íntimo contendo um animalzinho e um homenzinho, amarrados dentro de nossos corpos, ávidos para sair a andanças mundanas.
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Dentro de você um deles está mais forte e arrasta o outro com facilidade e esperteza. O alimento entregue a esse forte é você quem decide entregar. Você escolhe qual dos dois vai passar a míngua e ser subserviente ao outro.

Em sua dança do tempo, a vida urgente apressa você a decidir muitos atos e a escolher os melhores textos, mesmo que venham com lamento e dor, tendo em suas mãos inseguras a decisão de soltar o cutelo da guilhotina no primeiro que cruzar os seus olhos.

Guimarães Rosa, em seu clássico "Grande Sertão: Veredas", descreveu as batalhas de jagunços, com muito sangue coragem e violência, desfilando os animais daqueles homens à flor de suas caras, em pleno sertão brasileiro, envolto a pobreza e dissabores humanos. O bando de jagunços de Joca Ramiro, a partir do recrutamento com Riobaldo, iniciou a primeira guerra jagunça.

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Nessa mesma toada, criou-se uma terceira geração de um mesmo bando, quase uma tribo, com rituais e roupas típicas, encontradas em nossa periferia urbana, onde acontece um baile funk e a guerra entre bandidos e policiais. Esse é o filme de Guel Arraes que reinventa o clássico de Guimarães Rosa em tempos de milícias.

Não há espaço para o homenzinho de Platão, tampouco para o domínio do Centauro. A poética do Rosa virou drama nessa sociedade cruel que quer fazer festa enquanto tem gente morrendo.

Mas o Brasil é uma civilização incrível, feita com memória de muitos retalhos cerzidos pelo ouvido e que, apesar do lado violento, deve ser vivido corrido, como ler o clássico de Guimarães, para bater em você e criar uma sensação.

Torço para que vocâ consiga amarrar seu animal até o final da leitura.

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