Há 21 anos, morreu George Harrison. Dos quatro Beatles, o guitarrista teve a trajetória mais espetacular. Vindo de uma família muito ...

George

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Há 21 anos, morreu George Harrison.

Dos quatro Beatles, o guitarrista teve a trajetória mais espetacular. Vindo de uma família muito pobre, aos 17 anos tornou-se uma das maiores celebridades do planeta. Entrou no túnel de delícias do mundo material com sua carteirinha de milionário aos 20 anos e emergiu do outro lado como um homem que resumia seu propósito na vida a uma busca incansável para responder a três perguntas: quem sou eu, por que estou no mundo e para onde vou.

É dele o melhor álbum independente de um ex-Beatle. All Things Must Pass é uma obra-prima, em que funde letras filosóficas com música sofisticada. Transcendental é a palavra adequada para definir um trabalho que tem joias como Isn't It a Pity e Beware of Darkness.

Com o fim dos Beatles, finalmente George pôde gravar as próprias músicas. Tinha na gaveta tantas canções rejeitadas por Paul McCartney e John Lennon que pôde fazer um álbum triplo, louvado pela crítica e imediatamente alçado pelo público à categoria de lendário. Grande parte dessas canções refinadas havia sido alvo de zombaria ou desprezo e substituída por peças de qualidade bastante inferior.

Durante toda a sua jornada, George apostou na sobriedade, no cultivo do espírito, no desapego e nas ações humanitárias. Sobreviveu a uma tentativa de assassinato, ao fim de um casamento e aos desregramentos que a fama lhe trouxe. Aos poucos, suas canções se tornaram celebrações da vida e dos valores mais altos.

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George Harrison ▪ 1943—2001 ▪ ImagemDark Horse / DGs
Os gestos de solidariedade sempre foram abundantes. Do financiamento de filmes do grupo Monty Python aos concertos beneficientes para socorrer a população de Bangladesh, abatida por fome, inundações, genocídio e doenças. Harrison foi o primeiro a organizar um mega show a fim de arrecadar dinheiro para caridade. Realizado em agosto de 1971, no Madison Square Garden, em Nova York, o Concerto para Bangladesh rendeu um álbum e um documentário que destinaram ao país asiático mais de US$12 milhões, via UNICEF.

O chamado Beatle quieto era, em verdade, um inconformado que se desafiava constantemente e tinha, além do talento excepcional como instrumentista e compositor,
um humor ácido que só os anos de meditação domaram. Na época dos Beatles, compôs canções irônicas (Piggies, I, me, mine), delicadezas de amor (Something) e hinos como a grandiosa While my Guitar gently weeps e Here comes the sun. Abriu-se à cultura indiana e apresentou ao ocidente um dos maiores citaristas clássicos, Ravi Shankar. O álbum que os dois gravaram, Chants of India, traz cantos sagrados em sânscrito e é uma das preciosidades da carreira de Harrison.

No documentário “Get Back”, de Peter Jackson, vê-se George deixando os Beatles em janeiro de 1969, aborrecido com postura arrogante de McCartney e o descaso de John Lennon. No mesmo dia ele escreveu a música Wah-wah, na qual traduz sua frustração: “Você fez de mim uma estrela tão grande, mas não me vê chorar, não me ouve suspirando”.

Numa de suas últimas entrevistas, comentou a rapidez com que a vida passou: “Não levou muito tempo entre os 17 e os 57 anos”.

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The Beatles: Ringo Starr, Paul McCartney, George Harrison e John Lennon ▪ ImagemApple / EMI / Divulg.

Ringo Starr e Paul McCartney foram vê-lo pouco antes de morrer. Emocionados, os dois lembraram a bravura, o bom humor e a serenidade com que o amigo lidou com o diagnóstico de câncer no cérebro e no pulmão. Ringo chorou ao narrar a despedida: “Eu estava saindo para Boston porque minha filha tinha um tumor no cérebro. E disse: Bem, você sabe, eu tenho que ir e as últimas palavras que o ouvi dizer foram: Você quer que eu vá com você? Esse era o lado incrível de George”.

A brincadeira inocente foi sua derradeira mensagem de força e alegria ao amigo. Digno de quem escreveu Art of dying.

O testamento musical foi o álbum póstumo Brainwashed. Nele, a voz frágil sussurra os versos de Raising Sun: “No sol que nasce você pode sentir sua vida começando, o universo brincando no seu DNA. Você tem um bilhão de anos”.


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  1. Parabéns à autora pela homenagem ao quieto e "grande" George Harrison.
    "Piggies", do Álbum Branco, é uma das mais deliciosas e inteligentes músicas do quarteto de Liverpool, oportunamente lembrada no texto.

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