Nós, mulheres, levamos muito tempo para compreender o nosso corpo. Às vezes, a vida inteira! De alguma forma nos é negado — quase proibido — esse contato e nos deparamos, de supetão, com as mudanças radicais que temos que experimentar:
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As menstruações ▪ sempre diferentes umas das outras, agregando uma série de incômodos e inconvenientes (quando não, dores e medos!) fortalecidos por preconceitos e estigmas que marcam o ciclo como algo feio, sujo, fedorento, indesejado;2
A gravidez (para muitas) ▪ um mundo de subjetividades e ao mesmo tempo de concretudes que surgem, a cada lua, e que acontecem dentro da gente, nesse corpo quase desconhecido;3
Na sequência vem o parto ▪ natural ou não, é a culminância dessa experiência. A gravidez e o parto transformam nosso corpo num "aparelho" inexplicavelmente poderoso, visceral e animal. Vem a produção de leite, a amamentação... percebemos um par de peitos diferentes, com outra função, desabrochando um outro tipo de amor e prazer. Viramos um bicho alimentando outro bicho e por bastante tempo, somos apenas isso! Pronto! Nem conhecemos um corpo e já precisamos aprender sobre um outro. Vamos ter que lidar com esse novo corpo enquanto aprendemos a maternidade. A maternidade envolve muita coisa, mas o ponto de partida e o de chegada não somos nós, é o outro. Então o corpo, corpo, corpo mesmo, fica bem longe de nosso foco. Socialmente é estabelecido que nosso corpo é um bem coletivo, como se pertencesse a todo mundo! As regras estão postas e pronto! Você não decide porque não conhece e você não conhece porque não decide;4
Chega então, com o passar dos anos, a menopausa ▪ O momento em que os hormônios nos abandonam. Dizem adeus! Ouvi dizer, certa vez, que o cachorro é o maior amigo do homem e o hormônio, o da mulher.O fato é que sem eles, mais uma vez, somos jogadas no precipício cheio de desconhecimento, e pleno de experiências desafiadoras! Ih! Não só os hormônios nos deixam, é muito mais que isso! Aqui, estamos mais sós do que nunca!
Esse corpo que nos acompanhou na jornada da vida mais uma vez muda! Sem ser para fazer brotar a beleza da juventude ou para cumprir a missão de povoar o mundo! A mudança é marcada pela falta: falta de vitalidade, falta de energia, falta daquele padrão de beleza que nos foi imposto até aqui! O mais desafiador na menopausa é entender que nosso metabolismo mudou. Engordamos de qualquer forma! Retemos líquidos! O estômago fica dilatado! As roupas não cabem mais e as que cabem nem sempre combinam com a autoimagem que temos. É fogo! Por falar em fogo...
Como lidar com o calor arrebatador? Como lidar com esse suor excessivo que invade nossos momentos de trabalho, de lazer, de descanso? Como lidar com a pele, com o cabelo, com as unhas perdendo o viço, a força e o brilho? Como lidar com as dores nas articulações, com a insônia, com a irritabilidade sem sentido? Como lidar com a vontade de chorar por tudo e com a instabilidade emocional que nos atormenta? Nada é fácil nesse momento da vida das mulheres que sentem os sintomas da menopausa!
Escuto falar, aqui e acolá, de felizardas que não sabem o que é isso e fico pensando de onde vem esse merecimento...
Enquanto isso, nós, as menos privilegiadas, ficamos nos agarrando às pequenas esperanças de que isso ou aquilo vai resolver nosso sufoco. E nada! Nada resolve! Nem o tempo! Ficamos atentas às descobertas anunciadas na divulgação de produtos milagrosos. E nada!
O danado é que o mundo segue, sem imaginar o que passamos. A vida segue incólume às montanhas que temos que ultrapassar todos os dias. Sem perceber, nos largamos ao relento várias vezes e nos resgatamos de novo. E de novo…
Cada uma de nós está só consigo mesma num esforço profundo pela luta diária e pela lucidez! Sim! Manter-se lúcida é necessário e difícil. Na nossa história, muitas mulheres foram internadas como loucas, histéricas, nessa fase da vida, por puro desconhecimento da sociedade de uma maneira geral da existência da menopausa e seus efeitos. "Triste, louca ou má..."
Fico pensando se os homens passassem por isso, quantas soluções eficazes já teriam sido expostas à sociedade e como nós, mulheres, já seríamos "treinadas" a detectar os sintomas e acolher nossos homens, ajudá-los.
Com as mulheres é um pouco diferente.
O grande desafio fica em nossas mãos: encarar o desconhecimento da sociedade, a dificuldade de nos enxergar nessa fase da vida. O grande desafio é aprender a segurar nas mãos umas das outras e nas nossas próprias mãos, nos colocarmos em nossos colos, não nos abandonarmos nunca!
Estou buscando essa porta que me conduzirá ao amor próprio, ao autocuidado. Aprender a ficar comigo mesma e adentrar a sala das "mulheres sábias". Vou chegar lá! Vamos chegar lá mulheres!
Vamos acender uma fogueira e dançar ao redor do fogo. Sentindo, finalmente, o nosso corpo maduro e são gritar: Viva!