Em período de Copa do Mundo as lembranças surgem à mente. Sim, eu já fui um pequeno craque, um dos inúmeros brasileirinhos que correm atrás de uma bola seja lá de que tipo de material ela tenha sido produzida, mesmo que de improviso, para desbravar campos, ou trecho de terra batida desértico de grama, mas cheios de sonhos. Pés de liberdade, em chuteiras ou descalços, driblavam adversários reais e imaginários, venciam retrancas, faziam gols.
Claro, a memória gosta de relembrar os bons momentos. Se eu era um craque? Hummm! Posso dizer que tive várias fases como futebolista infantil/juvenil. Na infância, confesso, como se diz no dicionário dos peladeiros, era um autêntico perna de pau. No máximo, como um auto-elogio, posso afirmar em minha defesa que era esforçado, praticamente um sinônimo de ruim de bola. Geralmente, era o último a ser escolhido na divisão dos times ou, muitas vezes, ficava do lado de fora esperando a próxima partida. Ou seja, sobrava!
As lembranças mais claras desta fase estão relacionadas às topadas dos dedos dos dois pés, fruto dos chutes errados e acidentes em campo. Por sorte, escapei sem ossos quebrados. O que já foi um grande fato devido ao meu histórico autodestrutivo de acidentes domésticos. Nesta fase, as lembranças do futebol são mais de pequenos ferimentos.
Bem pequeninho, a busca pela bola que saiu de jogo resultou na sola do pé esquerda cortada por uma lata. Sangue, lágrimas e nada de futebol. Por volta dos oito anos, um novo corte (não da equipe), agora na mão ao tentar chutar uma bola. Gol feito, mão esquerda rasgada. Por volta dos 11 anos, novo trágico relacionamento com a bola. Uma pisada num osso no mato ao resgatar, mais uma vez, a pelota que saiu pela linha de fundo. Coleção de ferimentos ampliada, um corte profundo no pé direito e ganhei uma nova cicatriz que decidiu me fazer companhia até os dias atuais.
Criança, vascaíno, era época de imaginar ser Roberto Dinamite. Os rivais, flamenguistas, eram Zico, Andrada, Tita, enfim, uma coleção de craques. Na adolescência, idos dos anos 1980 para 1990, tempos de imaginar reproduzir as jogadas do francês Platini ou do alemão Rummenigge. Bom, Maradona e o carrasco Paolo Rossi não tinham muitos atrativos para o jovem jogador peladeiro.
Como a teimosia também gera frutos, insisti na carreira de peladeiro. E lá pela adolescência consegui melhorar um pouco de nível e intimidade com a pelota. O pé ficou mais aprumado e até fiz meus golzinhos. Até medalha de campeão em campeonato de travinha (aquela do campinho pequeno com três jogadores) ganhei no Bairro das Indústrias, o famoso B.I.
Ampliei o leque de atleta e até futebol de salão fui jogar com o time do bairro. Os acidentes continuaram a acontecer. Na quadra, já adulto, fraturei o polegar esquerdo na ânsia para fazer um gol. Objetivo alcançado, tento marcado e mão esquerda engessada por 15 dias.
A carreira futebolística considero encerrada. Posso até tentar correr atrás da bola novamente, mas com a quase certeza que vou “apanhar” da pelota. A mente até tem as jogadas bem definidas, mas o corpo físico meio que se recusa a obedecer as ordens do cérebro. No caso, é melhor não teimar. Portanto, volto os olhos para a televisão e me saio melhor como telespectador e metido à comentarista boleiro.