Como uma conversa com minha filha – ainda menina – ampliou a visão que eu tinha da construção de personagens como Jesus, Moisés e o super-homem.
Houve um dia em que Andréia – mais ou menos como na foto tirada por Miguel dos Santos em seu ateliê ainda no Jaguaribe – rodeou meu birô, viu nele as ilustrações de vários livros abertos e perguntou:
⏤ O que tanto lê sobre Jesus?
Mostrei-lhe o bico-de-pena de Gustavo Doré, em que o bebê Moisés é colocado dentro de um cesto de junco, no Nilo, pra escapar da matança de todos os meninos hebreus, promovida pelo faraó.
⏤ Lembra-se de que o rei Herodes também manda matar todas as crianças, na infância de Jesus... e de que só ele escapa? Pois isso se repete com Moisés, no Egito, e, na Índia, em que o tirano é Kansa, o menino é Krishna, este aqui. Agora veja os gêmeos Rômulo e Remo quando são, também, postos num pequeno barco, no rio Tibre, tal como o Moisés no rio Nilo e... veja aqui: Sargão I, no rio Eufrates. Veja esta mulher implorando: “Ó Rio Asva. Eu, Kunti, filha de um rei, fui amada pelo deus Sol, que me deu este filho, que será um chefe poderoso na Índia, chamado Kama. Leva-o para o rio Ganges e salva-o!”
Eu ia explicar que as coincidências nas estórias daquelas crianças se deviam ao cumprimento da viagem do sol pelo zodíaco, em que há o momento em que a constelação de Virgem se move para um espaço sem estrelas – que se torna o deserto – seguida pela constelação de Dragão, monstro que representa todos os tiranos, ... mas não tive tempo:
⏤ Oxente – Andréia disse – é o que também acontece com o Super Mouse!
⏤ Como assim?!
⏤ O planeta em que ele nasceu vai explodir, né? – disse, didática ⏤ , mas aí o pai põe ele ⏤ ainda bebê ⏤ num foguetinho, como esse cestinho, e só o nenê escapa quando tudo se arrebenta, o foguetinho vindo pra Terra.
Caramba!
Aquilo fora sugado da história da origem do Super-Homem, com o planeta Krypton explodindo e o super bebê escapando na maquete da nave que seria “uma arca do espaço”, a ser produzida pelo pai do menino, Jor-El! Não à toa, Goebbels – ministro da propaganda de Hitler – ao ver histórias em quadrinhos com o Super-Homem lutando contra nazistas, dissera que ele era judeu! – e seus criadores, de fato, eram.
Quando o romance “A Verdadeira Estória de Jesus” ia ser lançado, consegui do lendário Adolfo Aizen ( 1907-1991 ) da EBAL – Editora Brasil-América Ltda – autorização para reproduzir a página do gibi em que a origem do Superman acontece.
E o melhor é que aquilo me fez ver que tais arquétipos iam além das religiões: que Branca-de-Neve — sofrendo a tentação da Bruxa com a maçã — é a mesma Eva tentada pela serpente. E que ela, ressuscitada por um beijo de um príncipe, é a mesma Bela Adormecida ressuscitada pelo beijo de outro príncipe, a mesma valquíria Brunhilda ressuscitada pelo beijo de Siegfried.
Conclusão: meu livro ampliou-se a partir daquela estupenda conversa com Andréia.
(Trecho da 'AUTO B/I/O GRAFIA' do autor a ser lançada)