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Decadência da filosofia no mundo atual?

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Antes de mais nada, registre-se que este não é um texto alarmista, visto que não guarda semelhança com outros que pululam por aí, disseminados pelas redes sociais. É tão somente uma constatação da realidade que nos cerca. Ou, para ser menos combativo, um ponto de vista acerca de nosso zeitgeist atual.

Diante da evolução (ou involução) da humanidade nas últimas décadas, vivemos em um mundo cada vez mais amorfo, insípido, tecnocrata, uma sociedade baseada em números e estatísticas.
O espírito humano continua sendo o mesmo, no entanto lança seus movimentos rumo a um estágio de colapso, progredindo em uma escala de apatia e insensibilidade. Não é preciso participar de um brainstorming para chegar a tais conclusões.

Sobrevivemos em um universo “pós geração X”: estamos inseridos na era do consumismo tecnológico, do cinismo político, da ironia afetiva, do descompromisso e da frieza, enfim, uma espécie de deboche blasé da realidade que nos cerca. É a chegada da era em que tudo e nada acontecem, em uma realidade enfadonha e, ao mesmo tempo, caótica, envolta em um racionalismo cego. Aos poucos, vamos nos robotizando. É uma imagem batida? Sim, há muito existe no imaginário popular pós-moderno, mas, infelizmente, vem se tornando real.

Os projetos grandiosos da filosofia desmoronaram nos últimos tempos. A própria ideia de “verdade”, que os gregos já perseguiam há mais de dois milênios, está sendo atacada por todos os lados, pelo menos nos últimos trinta anos.

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Kelle
Computadores cada vez mais inteligentes, infinitas inovações tecnológicas, pós-estruturalismo, desconstrutivismo, infinitos “ismos” e outras “cositas más” pós-modernas acabaram, de igual forma, por contribuir para tornar o mundo caótico e obsessivo, na exata medida de tentarem compreender o caos e as obsessões dele. Parece ser um mundo novo, mas é a representação da velha ideia do cachorro que persegue o seu próprio rabo.

Emergiu, supremo, o império da crítica à ideia de um tradicional racionalismo/empirismo que era tão caro ao Iluminismo e, voltando um pouco mais no tempo, ao conhecimento filosófico clássico. Nossa moderna era pós-estruturalista é como uma
Torre de Babel: há espaço para todos dentro dela, mas ninguém se entende.

As ideias libertárias das três grandes revoluções da História (a fundamental Gloriosa, a assertiva Americana e a confusa Francesa) parecem ter sido misturadas a uma fumaça cinzenta onde se digladiam estruturas de poder, discursos de ódio, retórica identitária e ideologias oportunistas.

É um processo de negação de um pensamento de viés mais humanista que está em curso, minando as clássicas aspirações da filosofia a ter resposta para tudo. A sociedade vive hoje a era da especialização do conhecimento: para um dado problema, podemos encontrar a resposta utilizando alguma ferramenta específica da técnica ou da ciência.

É tudo muito simples e superficial, como escolher um produto em uma prateleira de uma loja, ou como fazer compras pela internet. O grande impasse é que a técnica e a ciência não têm respostas para todas as questões que assolam uma sociedade extremamente angustiada.

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Após o século XX assistir boquiaberto à ascensão e declínio de regimes totalitaristas e coletivistas de direita e de esquerda, com todos os seus horrores nele embutidos, nosso atual mundo pós-moderno, ainda repleto de um cientificismo materialista exacerbado, é um arremedo de arcabouço político e institucional, um imenso entulho de leis, normas e regulamentos que reforçam incertezas e desigualdades. A democracia que foi prometida às massas virou uma espécie de populismo barato e demagogia vulgar embalada por “memes” de redes sociais – um espelho da ansiedade que tomou conta do mundo contemporâneo.

Nesse contexto, é bem possível que a filosofia tenha se reduzido, por exemplo, ao terreno da ética profissional ou esteja apenas à procura de pequenas formas de conhecimento válido. Talvez tenha virado uma comezinha mercadoria do
imenso supermercado do conhecimento humano, como tantas outras.

Insones, perdidos no meio desta longa viagem na noite das incertezas e imersos em alguma rede social, agarramo-nos a pensamentos do tipo ready-made, que definem, de forma caricata e uniforme, tendências políticas, grupos sociais, modos de agir, formas de pensar.

As redes sociais e suas “bolhas” ideológicas que inviabilizam o diálogo dão o tom de monotonia da hodierna mente humana. Não há mais espírito crítico e ideias originais: como uma manada hipnotizada, seguimos o que a grande mídia dita, ou o que notáveis gurus de canais do Youtube pregam, enfim, o que é mais “cool” aos olhos de todos que nos cercam, seja isso, diga-se de passagem, com conotação progressista/esquerdista ou conservadora/direitista, o que nos faz, também, entrincheirarmo-nos em nossa guerra contra “o outro”, ou seja, aquele que pensa diferente de nós.

Diante desse novo mundo dominado pela inteligência artificial e a grande rede mundial de computadores, resta a pergunta: o homem manda nos algoritmos, ou os algoritmos mandam no homem? O ser humano ainda é, de fato, dono de seu próprio nariz? Até que ponto a indústria de software influência — ou monopoliza — nossas vidas?

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Kelle
A tecnologia avança a passos largos, as pequenas revoluções operam-se todos os dias. Eticamente, porém, o homem regride. Virou refém de um egocentrismo infindo. Nunca se viu tanta carência: queremos ser amados ao extremo, precisamos da aceitação imediata desse “outro”, ao mesmo tempo em que travamos uma guerra diária contra ele. Bem-vindos ao mundo dos pseudointelectuais e subcelebridades da internet.

A filosofia parece ter virado um mero anexo de algumas empresas, uma espécie de “sub RH” destinado à melhoria do ambiente de trabalho. Outrora, construções teóricas megalomaníacas criavam palácios suntuosos de conhecimento, ao passo que pensamentos iconoclastas pareciam que podiam incendiar o mundo inteiro.

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Kelle
O que vemos atualmente é a patética exibição de pseudopensadores em canais do YouTube para um séquito de seguidores desprovidos de senso crítico, de falsos profetas do saber em redes sociais – no plano nacional e internacional —, pessoas com pouca bagagem ou apenas algum verniz intelectual, que, se fossem alunas em uma academia cujo corpo docente tivesse mestres da envergadura de um Eric Voegelin ou um Vicente Ferreira da Silva – só para ficar em nomes mais recentes —, não serviriam nem para abrir portas para eles.

Hoje, a pobre filosofia parece contentar-se em ocupar algumas saletas bolorentas em amorfos prédios de um calculado saber humano. Estruturas morais e éticas, antes firmes e bem construídas, parecem, em poucas décadas, ter-se desmoronado. A fé cega na razão, na ciência e no progresso talvez agora esteja nos cobrando alguma conta que não foi paga. O caos está nos vencendo, por enquanto...

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