"A função primordial da poesia, como a de todas as artes, é ampliar a consciência que temos de nós mesmos e do mundo à nossa volta. Não sei se essa consciência ampliada nos torna pessoas mais corretas ou mais eficientes: espero que não. Mas acho que nos torna mais humanos..."
Essas palavras, do poeta W. H. Auden, vieram insistentemente à minha memória ao repassar mais uma vez, e de forma mais ordenada e cuidadosa, as fotos realizadas por Guy Joseph durante a execução do projeto Terra da Gente Paraíba, dentre as quais foram selecionadas e que estão publicadas neste álbum.
Penso que a arte da fotografia traz em si um mistério, que não está no tema da foto, ou no ângulo escolhido pelo artista, ou em qualquer das questões técnicas de enquadramento, luz, contraste etc. O mistério está no momento do clique. Porque se trata de um momento único e efêmero, que depende tão só da intuição e do talento do artista.
Essas fotos, em sua rica variedade, em sua luxuriante beleza, não se detêm em um tema único. Elas captam o dia-a-dia das pessoas anônimas, seu trabalho, seu vai-e-vem nas ruas, suas festas religiosas; seu carnaval, suas brincadeiras e folias. Vida que se expressa também em seus objetos, nas belíssimas peças de artesanato, na simplicidade de roupas a quarar ao sol, ou da confecção de maçãs carameladas.
Mostram monumentos históricos e pré-históricos, infelizmente nem sempre preservados como deveriam ser, se nesse país se desse a devida atenção à história, à memória e à cultura. E desfilam ante nosso olhar extasiado paisagens cuja existência muitos de nós desconhecemos, como o lajedo do Pal Mateus e as pedras do Capacete, da Caveira e do ingá. Outras vezes os animais são o tema, o nado do peixe-boi, o branco de uma garça contra o azul, ou o voejar de um urubu que corta com majestade um céu em brasa
Não são fotos documentais. O artista não pretendeu com elas fazer antropologia fotográfica, ou uma espécie de registro dos usos e costumes locais, como para uma publicação de geografia humana. Também não teve a intenção de exaltar as belezas da terra, como para um guia turístico, cheio de cenas aliciantes e pitorescas. As fotos falam por si, não necessitam de nenhuma retórica para explicá-las ou apoiá-las.
A gente Paraíba é assim, como toda gente. Vive sua vida, trabalha, luta, ri, chora, dança, abraça e briga. E a gente fica pensando: eu também faço parte desse povo, embora tantas vezes me considere à parte, enquanto me distraio na contemplação egótica do meu umbigo.
As fotos do Guy Joseph talvez não me tenham tornado uma pessoa melhor, como eu gostaria, ou mais eficiente. Mas com toda certeza, como queria o poeta, me tornaram mais humano, e assim também mais sujeito às coisas próprias da minha humanidade.
Tive saudades da minha terra, da minha gente, fiquei orgulhoso em saber que há nela tanta beleza, tantos modos de fazer, de ser, de viver. Espero que todos passem por isso.
Os que têm a ventura de viver nessa abençoada terra, para manter os olhos mais abertos para ela. E os que dela saíram, os paraibanos da diáspora, como eu, que tomem consciência do que estão perdendo. E pensem que nunca é tarde para voltar. Ou como dizia o grande romancista paraibano, "voltar é uma forma de renascer, e ninguém se perde na volta".