Custa acreditar que esta bela e fogosa cidade já foi tão pequena que sabíamos de cor os nomes de quase todos os proprietários dos autom...

João Pessoa cresceu

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Custa acreditar que esta bela e fogosa cidade já foi tão pequena que sabíamos de cor os nomes de quase todos os proprietários dos automóveis, identificando as placas dos veículos. Um dos meninos Varandas sabia-as todas. Recordo que a placa número 1 era do Dr. Mororó, a 2 do Dr. Eunápio Torres, se não me engano a 7 era do Dr. Atílio Rotta...

Com os telefones dava-se o mesmo. Muito antes dos nossos telefones terem a numeração limitada a 4 algarismos havia nas casas uns aparelhos pretos, com enormes pilhas atrás, que eram atendidos pelas telefonistas quando acionada uma manivelazinha. Lembro de uma vez que minha mãe queria falar com uma amiga e contactou a operadora. Ao pedir para que ela completasse a ligação até a casa da dona fulana, a telefonista foi certeira: “- Nem perca seu tempo, Creusa. Eu a ouvi combinando com a vizinha de irem ao comércio hoje de manhã”. Sigilo zero.

Ana Costa
João Pessoa era tão pequena que conhecíamos todos os "avoados" daqui. Nenhum deles violento. Macaxeira, a pé pelas ruas, pensava dirigir um automóvel, aumentava a velocidade, passava marchas e parava nos sinais. Um dia, foi à loja dos meus pais e pediu uma lâmpada de 200 volts. Só tinha de 100 volts. “— Então me dá duas”. Lógica incrível, hein? Já Carboreto de louco não tinha nada. Ia de bar em bar com uma pasta 007 vendendo isqueiros e canetas. A clientela ria-se de sua suposta loucura, mas, na verdade, era um Nasrudin paraibano. É dele a célebre frase de que "para ser doido na Paraíba tem que ter muito juízo". Consta que teria sido atropelado e que morreu à falta de qualquer socorro. A conferir.

A. David Diniz
Caixa D’agua era poeta, sempre soluçando, sempre vestindo ternos brancos. Dizia: “— Aqui na Paraíba só eu e o Comendador Renato Ribeiro Coutinho usamos branco”. Cheguei a prefaciar um dos seus inúmeros livros. Tenho de cor seu mais belo verso: “Eu tinha nas minhas mãos somente sonhos”.

Mocidade era intelectual. Fazia discursos belíssimos no centro da cidade, às vezes batendo nos políticos. Dizem que certa vez o Governador João Agripino lhe perguntou quem pagava suas refeições, sua hospedagem e ainda lhe dava um estipêndio mensal via loteria estadual? Ele disse que tudo aquilo era bancado pelo Governador. Dr. João subiu o tom: “— Então, com tudo isso, como é que você fica fazendo discursos falando mal do meu governo?”. Ao que Mocidade desabafou: “— Ah, Dr. João, é assim mesmo. Governo foi feito para sofrer”. Terminado o mandato do Dr. Agripino, Dr. Ernani Sátiro assumiu o governo e Mocidade foi logo se chegando ao novo poderoso para continuar a receber as benesses do poder. Com sua voz tonitruante o novo Governador fulminou:

“— Amigo velho, você é doido de João Agripino, os meus doidos eu estou trazendo de Patos”.

João Pessoa cresceu. Saudades daqueles tempos.

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  1. Anônimo2/9/22 23:37

    Que texto verdadeiramente fiel nos anseios dos tempos

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  2. Seu nostálgico e brilhante texto, Marcos Pires, me transportou aos saudosos tempos de estudante do Liceu.
    Me vi caminhando da Lagoa ao Pavilhão do Chá, onde tomava o ônibus para o bairro de Cruz das Armas. Nesse trajeto,, não raro, parava para observar de perto os icônicos personagens da velha João Pessoa.
    VALEU, caro cronista!
    .

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  3. Perdoe a intromissão nessa recordação, mas tomo a liberdade de lembrar David - o proprietário da Great Western e Senador da República, com seus icônicos charuto e sua gravata de listas.

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