A memória guarda o ruído ensurdecedor, o cheiro da tinta emanada das entranhas de chapas de ferro, do monstro mecânico com uma esteira lateral com os exemplares de papel jornal meio que vomitados de maneira organizada pela rotativa. Estacionada em um espaço grande, a estrutura lembrava a máquina cheia de engrenagens que engoliu Carlitos no clássico “Tempo Modernos” do genial e sempre atual Charles Chaplin.
Moderna e antiga aquela mecânica forma repetitiva de impregnar no papel ideias, notícias, histórias, fotografias, fatos e ficções. Fascinante mundo da impressão. Barulhento processo geralmente noturno de noticiar. Jornais, revistas, livros, gibis... num mundo impressionantemente impresso. Feito um dragão, a impressora avança no rito de misturar papel e tinta. Em resumo, fascínio, uma impressão inesquecível.
O mesmo tipo de arrepio quando no estúdio a luz acende vermelha: “No ar”. É, literalmente, um sinal solto no ar que voa levando vozes que na mente de cada um ganha imagens ao serem captadas em receptores distantes. A voz que atravessa mares, montanhas, cidades. O ritual da leitura do prefixo para identificar qual a sintonia. Vozes com ideias, músicas e até ruídos mágicos. Sintonizar é sinônimo escutar, uma das essências do saber viver em coletividade.
Outra caixinha que tem o “No ar” como referência. No caso, a mágica de enviar imagens junto com sons. A caixa há muito se transformou praticamente numa placa. As mãos comandam a infinidade de possibilidades do que já foi apenas em preto e branco. A primeira vez em cores foi para mim inesquecível. “Sessão da Tarde” e os dizeres nos idos dos anos 80: “Esse filme foi originalmente produzido em preto e branco”. Hã!? Pois é, mas assisti a uma versão de “A Guerra dos Mundos”. Clássico é clássico. E ainda tenho a lembrança que o primeiro filme na TV colorida foi em P & B.
Eis que surge a internet. Criação revolucionária em estado puramente virtual. E tudo acelerado! A visualização, viralização e o esquecimento em velocidade furiosa. O tato mudou de sentido, o toque aciona, mas não toca. Tudo está mais perto, mesmo distante. A realidade já não é palpável.
Novos mundos, embaralhamento mental. E, ao mesmo tempo, uma impressão fascinante. Em todos, há o olho, mais ainda, o olhar, a juntar máquinas, mundos e traduzi-los.