No dia 11 de junho de 1822, cerca de três meses antes do Grito do Ipiranga, reuniram-se na Capital da Paraíba, o Senado da Câmara e a Junta Governativa da Província, com “os votos geraes do Povo desta cidade”, para deliberarem sobre a situação pela qual passava o Brasil. Como resultado da sessão, cuja ata contou com cerca de 140 assinaturas, decidiu-se encaminhar ao Rei D. João VI um manifesto em que os paraibanos pediam ao monarca português para que fosse concedido ao Príncipe Regente D. Pedro a “Delegação do Poder Executivo para todos os Negocios do Brasil e isto para não ser obrigado a recorrer ao velho mundo, para obter qualquer decisão, officio, graça ou Mercê, como estava determinado pelas ultimas deliberações provisoriamente tomadas”.
Para o historiador Irineu Ferreira Pinto aquela deliberação seria “a primeira tentativa na Província de separação de Portugal, nesta época”. No texto do documento encaminhado ao Rei eram apresentadas as principais razões que fundamentavam o pedido:
“Sendo o Brasil uma parte integrante da Monarchia Portugueza e uma parte que mereceu a S. Magestade a consideração e a categoria de Reino, ser-lhe-ia, sem duvida, desairoso voltar a dependencia de colonia para ir procurar os seus recursos e todos os titulos de que necessitar, milhares de legoas, atravessando o oceano, com os incommodos, riscos e despezas que outrora soffrera e que fizera o seu atrazo. Quer, pois, o Povo desta cidade gozar realmente da liberdade civil que offerece a Constituição que jurou, e que expontaneamente adheriu”
A deliberação da reunião foi, também, encaminhada, quatro dias depois, por meio de ofício, para José Bonifácio de Andrada, que era então, no Rio de Janeiro, Ministro dos Negócios do Reino do Brasil. O documento expressava a gratidão da Província e dos paraibanos ao Rei D. João VI, a quem era creditada a “emancipação e a elevação deste Continente á Categoria de Reino”, mas, acrescentava que, para “conservar tão altas atribuições” e “se ter entre si todo o seu recurso, não ir mendigal-o a estranho hemispherio”, fazia-se necessário, conforme expressava o teor do documento, “ter a representação de um Povo Livre, Constitucional e gosar de todas as regalias e privilegios que lhe devem ser inherentes, tendo no seu mesmo Paiz, um ponto deste vasto e rico continente, o Poder Executivo, donde lhe demandem as graças e a justiça”.
José Bonifácio, Ministro de Estado e deputado por São Paulo, apresentou o manifesto da Paraíba para o Príncipe Regente adicionando comentários finais que realçavam a lealdade que os paraibanos demonstravam para com D. Pedro, ao contrário do apoio duvidoso que, naquele momento, o futuro Patriarca da Independência observava em outras Províncias:
“Digne-se pois, V. A. Real a tomar debaixo da Egide da sua particular protecção e sabedoria a este bom e leal povo da Paraíba do Norte que tão sincera e filiarmente se entrega todo aos Paternaes Braços de V. A. Real ao mesmo tempo que em outras Provincias, ainda desgraçadas, de cujas luzes e civilização deveriamos esperar maior patriotismo, e mais decidida união e fraternidade, ainda reina o espirito infernal da discordia e do machiavelismo”
Em 31 de julho, realizou-se na Cidade da Paraíba, uma “grande e Extraordinaria Vereação”, com a participação das principais autoridades da Província, com a finalidade de deliberar acerca das eleições dos representantes paraibanos à Assembleia Constituinte que seria instalada no Rio de Janeiro. O decreto de convocação para a Constituinte havia sido editado em 3 de junho e as Instruções para a escolha dos constituintes saíram em 19 de junho. As Instruções determinavam que, “para facilitar as reuniões dos Eleitores, ficam sendo (só para esse effeito) Cabeças de Districto, os seguintes: [...] na Provincia da Parahyba: Cidade da Parahyba, Villa Real, Villa da Rainha da Campina Grande”. A sessão realizada na capital da Paraíba tinha o objetivo de adotar as providências para o cumprimento do decreto que mandava “hir desta Provincia sinco deputados para a Assembleia Geral, e Constituinte deste Reino do Brasil”.
Um novo manifesto, datado de 3 de agosto, - que não foi incluído por Irineu Ferreira Pinto na sua indispensável obra “Datas e Notas para a História da Paraíba” - foi enviado ao Príncipe Regente pelo “Senado da Camara da Cidade de Parahiba do Norte” reafirmando o apoio dos paraibanos a D. Pedro. O documento somente foi publicado na edição nº119, de 3 de outubro de 1822, do jornal “Gazeta do Rio”, que funcionava como uma espécie de “diário oficial” da Corte:
“Senhor. – O Senado da Camara da Cidade da Parahiba do Norte, reconhecendo em Vossa Alteza Real o Salvador do Brasil, a quem os Ceos havião reservado para fazer a felicidade deste Reino, e sustentar os seus preciosos Direitos tão injustamente violados pela perfidia de seus irmãos de Portugal, olhando a Vossa Alteza Real, como a única taboa da sua salvação no meio das vagas, que lhe ameacavão o naufragio da mais penivel recolonização [...] agradece do amago da sua Alma, e em nome dos habitantes desta Capital e seu termo a Vossa Alteza Real o immensuravel
Beneficio de se haver declarado [...] o Defensor Perpetuo deste Reino do Brasil [...]
He doloroso o pensar, que o Congresso das Cortes em Lisboa abusasse da nossa boa fé por tal maneira, que trahisse o Direito da Natureza e das Gentes, querendo para os Europeos a liberdade, para os Brasileiros a escravidão [...] sem se lembrar que os Portuguezes Europeos só poderião reinar outra vez no Paiz de Cabral, se tivessem o seu Throno sobre cadaveres, cinza e ruinas.
Os habitantes desta Capital e seu termo [...] jurão a mais firme adhesão, a mais constante fidelidade á Augusta Pessoa de Vossa Alteza Real, a quem querem por Chefe e Centro do Poder Executivo [...] Elles rogão ao Senado, que offereça em nome delles a Vossa Alteza Real os seus bens, os seus braços, o seu sangue, as suas vidas; e sacrificio não ha, a que se não submettão voluntariamente a fim de sellar a Independencia do Brasil [...] Dignos do nome Parahibano, dignos descendentes dos Vidaes, elles marcharão a passo firme pela estrada da gloria; pois que o único sentimento que inflamma todos os corações he o de preferir a morte á antiga escravidão”
He doloroso o pensar, que o Congresso das Cortes em Lisboa abusasse da nossa boa fé por tal maneira, que trahisse o Direito da Natureza e das Gentes, querendo para os Europeos a liberdade, para os Brasileiros a escravidão [...] sem se lembrar que os Portuguezes Europeos só poderião reinar outra vez no Paiz de Cabral, se tivessem o seu Throno sobre cadaveres, cinza e ruinas.
Os habitantes desta Capital e seu termo [...] jurão a mais firme adhesão, a mais constante fidelidade á Augusta Pessoa de Vossa Alteza Real, a quem querem por Chefe e Centro do Poder Executivo [...] Elles rogão ao Senado, que offereça em nome delles a Vossa Alteza Real os seus bens, os seus braços, o seu sangue, as suas vidas; e sacrificio não ha, a que se não submettão voluntariamente a fim de sellar a Independencia do Brasil [...] Dignos do nome Parahibano, dignos descendentes dos Vidaes, elles marcharão a passo firme pela estrada da gloria; pois que o único sentimento que inflamma todos os corações he o de preferir a morte á antiga escravidão”
Os registros documentais que foram apresentados, referentes a manifestações da Província da Paraíba em apoio ao Príncipe Regente, em período anterior ao marco simbólico do Grito do Ipiranga, mereceram da parte de D. Pedro o reconhecimento pela solidariedade que fora a ele conferida pelos paraibanos durante o movimento da Independência do Brasil. Essa gratidão de D. Pedro para com a Paraíba, demonstrada quando já era Imperador do Brasil, pode ser avaliada pelas palavras do deputado José da Cruz Gouvea proferidas na tribuna da Assembleia Constituinte na sessão do dia 4 de junho de 1823. Cruz Gouvea afirmou no seu discurso que, em março de 1823, ouviu do Imperador as seguintes palavras quando, em nome da Câmara da Vila Nova da Rainha, o felicitou pela sua aclamação:
“A Provincia da Paraiba, Senhor, é aquella que tem sido firme, certa e constante”.