O professor José Jackson Carneiro de Carvalho construiu um espaço que é só seu na literatura paraibana e – por que não? – brasile...

O Dostoiévski de Jackson Carvalho

Dostoievski literatura paraibana ensaio
O professor José Jackson Carneiro de Carvalho construiu um espaço que é só seu na literatura paraibana e – por que não? – brasileira. Que eu saiba, só ele, entre nós, logrou estudar, com a profundidade devida, três autores fundamentais das letras universais, Albert Camus, André Malraux e Fiódor Dostoiévski, escrevendo e publicando sobre cada um deles um livro específico, com a qualidade capaz de inscrevê-los, com destaque, na fortuna crítica dos respectivos escritores. Não é pouca coisa, do ponto de vista intelectual, nem aqui, na aldeia, nem em qualquer lugar do mundo.

Chega agora ao público o livro Dostoiévski – As paixões do príncipe idiota, Editora Ideia, João Pessoa, 2022, coroando a obra ensaística do professor Jackson, passados onze anos da publicação de seu livro anterior,
Dostoievski literatura paraibana ensaio
André Malraux – Entre o real e o fantástico, também com o selo da mencionada editora. Onze anos. Parece muito, mas não é. Principalmente se considerarmos o tanto de leituras e reflexões que exige a análise de um romance de um autor complexo como Dostoiévski, largamente – mas não exaustivamente – estudado no mundo inteiro. Sem falar na cuidadosa e paciente escrita, não raro a parte mais difícil – e ingrata – do trabalho. É verdade que o livro agora publicado poderia ter surgido um pouco mais cedo, mas as circunstâncias da vida, aquelas que ninguém controla, fizeram com que este viesse, afinal, a ser o momento propício para o acontecimento. Não há, pois, o que se objetar a respeito, salvo acolher a obra com os merecidos louvores. Tudo no seu tempo, diz o Eclesiastes.

O professor Jackson debruça-se particularmente sobre o livro O idiota, do romancista russo, obra importante da maturidade de Dostoiévski, mas não só, pois, a partir desse romance, vai mais além, abrangendo, de certo modo e em alguma medida, toda a produção romanesca do autor com sua exegese refinada. É o que assevera, no criterioso prefácio, o crítico Hildeberto Barbosa Filho, quando escreve:
Arcevo familiar
“Com Dostoiévski, o percurso é diferente, a visada hermenêutica circula em sítio mais restrito, o objeto de estudo se limita formalmente à paisagem única do romance O idiota. É preciso que se diga, no entanto, que, lendo essa narrativa singular, isto é, rastreando os meandros intrínsecos de sua estrutura multifária e cambiante, o autor, em certo sentido, desloca seu olhar de minucioso analista para a cobertura dos traços marcantes do universo romanesco do gênio russo em sua totalidade. Vê-se, portanto, em foco central, e a partir de lentes mais agudas, O idiota, uma de suas obras decisivas da fase madura, mas também se veem, pelos filamentos associativos da sondagem crítica, os princípios e os critérios narrativos e estéticos que mobilizam o escritor, tanto em obras anteriores, a exemplo de O homem do subsolo e Crime e Castigo, quanto em obras posteriores, como Os demônios, O adolescente e Os irmãos Karamazov”. Trata-se, como se vê, de um ensaio de fôlego, digno de um intelectual de peso, como efetivamente é o escritor paraibano.

Dostoievski literatura paraibana ensaio
Observei que boa parte da bibliografia consultada pelo professor Jackson, na pesquisa que antecedeu a feitura de seu livro, é constituída de obras francesas, no original, ou seja, não traduzidas para o português. Isto deve ser destacado, pois dá uma ideia da erudição do nosso conterrâneo e do nível intelectual que procurou alcançar com seu estudo, lastreando-o nas melhores e mais autorizadas fontes europeias, de tal modo que sua produção nada ficasse a dever àquelas. E não ficou.

Por outro lado, não devemos esquecer, a propósito da sólida formação cultural do autor, seus estudos em instituições católicas, inclusive em Roma, numa época em que tais instituições realmente primavam pelo elevado nível do ensino. A formação intelectual fornecida pela Igreja aos seus membros era, sob muitos aspectos, de nível universitário, nada ficando a dever às melhores congêneres laicas. Tanto é assim que praticamente a totalidade daqueles que deixaram a carreira religiosa terminou por ingressar no magistério das universidades públicas e privadas, usufruindo, na maioria dos casos, de reconhecido prestígio acadêmico.
Acervo familiar
A trajetória de Jackson Carvalho teve esse rico viés, não sendo de admirar, portanto, que tenha chegado a reitor da UFPB, eleito democraticamente, diga-se de passagem.

A publicação desse livro sobre O idiota, de Dostoiévski, deve-se muito, é preciso também registrar, à ação perseverante da professora Célia Carvalho, esposa do autor. Ela compreendeu a importância e a necessidade de dar a público um trabalho de indiscutível envergadura literária, tendo se empenhado, em todos os sentidos, nas questões práticas relativas à edição da obra. Nós, os leitores daqui e de além-aldeia, ficamos todos devedores dessa sua diligência.

O livro já se encontra disponível na Livraria do Luiz, nas lojas do Centro e do MAG Shopping. Recomendo-o muito aos admiradores de Dostoiévski e do professor Jackson, assim como a todos que cultivam a boa literatura. O patrimônio cultural da Paraíba e os paraibanos em geral estão sem dúvida enriquecidos com a publicação dessa obra realmente singular e relevante.

De parabéns, portanto, o autor, a professora Célia e os leitores.

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