Eu havia escutado esta narrativa por intermédio do inesquecível amigo Josélio Gondim, mas só recentemente, numa das minhas idas a São Paulo, pude checar detalhes.
Esse tal Zé do Pé era muito conhecido da boemia intelectual de São Paulo nos anos 60 e frequentava as mesmas mesas no Bar do Museu, no Paddock e outros “templos” da época.
Deu-se que numa noite do restaurante Paddock adentrou (gostaram do termo?) Walther Moreira Salles. Passou rente à mesa ocupada por Zé do Pé e alguns intelectuais paulistas, todos saboreando seus uísques, e dirigiu-se para o outro lado do restaurante. No raro momento de silêncio que se seguiu, Zé do Pé comentou:
— Olha só, o Walther passou e nem me cumprimentou. Deve ter sido porque estou nessa mesa de pobres.
Os amigos começaram a gozar... que conversa era aquela de conhecer Walther Moreira Salles? O homem havia sido Embaixador do Brasil nos EUA., Ministro da Fazenda e era “apenas” o dono do Unibanco. Como poderia um Zé do Pé qualquer ser amigo dele? A gozação durou mais uns minutos e enfim partiram por outros assuntos. Meia hora depois Zé do Pé pediu licença e levantou-se.
Ocorre que ele ficara de olho na mesa onde estava Moreira Salles. Ao ver que o banqueiro levantara para ir ao banheiro fez o mesmo sem que os companheiros de mesa percebessem.
Pacientemente, ficou lavando as mãos e enfim teve ao seu lado Walther Moreira Salles, que começou também a lavar as mãos. Cumprimentou o banqueiro e emendou:
— Doutor Walther, o senhor não me conhece, porém todos aqui sabem quem eu sou. Pode perguntar ao maitre Jaime ou ao gerente Assis. Eu queria um pequeno favor seu e não é dinheiro emprestado. É que eu menti para os meus companheiros de mesa dizendo que o senhor era meu amigo. Me desculpe, mas foi mais forte do que eu. Porém se o senhor não se incomodar,
ao sair poderia só dar um adeus para mim, dizendo meu nome? Sou conhecido como Zé do pé.
Moreira Salles achou graça na história e como não iria lhe custar nada concordou com o pedido, não sem antes decorar o nome do seu mais novo amigo de infância.
Saíram do banheiro separadamente, cada qual para sua mesa e Zé do pé ficou satisfeito por nenhum dos amigos ter desconfiado da patranha que armara.
Meia hora depois Walther Moreira Salles foi saindo do restaurante e lembrou-se do pedido. Chegou bem perto da mesa deles, o que fez com que as conversas cessassem e dirigiu-se a Zé do Pé: “Ô Zé, me desculpa, não te vi quando cheguei. Forte abraço”. Em seguida foi saindo, deixando embasbacados os amigos de Zé, que disse:
— Para de encher meu saco, Waltinho.
Não se sabe se o banqueiro ouviu, mas os amigos de Zé do Pé passaram a tratá-lo de modo muito fidalgo desde então.