“Queremos seguir espalhando poesia pela cidade”
Tudo começou em um ato político em São Paulo para registrar a presença e existência de escritoras e mulheres que trabalham com literatura nas cidades, nos países e no mundo afora. A inspiração para a foto veio do registro histórico de 1958 intitulada “Um grande dia no Harlem” do fotógrafo Art Kane, que eternizou o marco dos anos de ouro do jazz.
No último dia 9 de julho, um grupo de mulheres — organizado pelo “Sarau Selváticas”, por Aline Cardoso e Anna Apolinário, em parceria com a Editora Triluna — reuniu-se no Hotel Globo para registrar essa foto, como também participar de trocas, Sarau, Lambe/Lambe. A fotógrafa Vanessa Pessoa gentilmente nos cedeu sua arte. Foi a 7ª edição do Sarau e a 1ª Feira Literária de João Pessoa. E as meninas arrebatam:
“Lançamos hoje o primeiro molotov que dará início a um incêndio que ninguém poderá conter. Porque a energia que moveu cada cada uma até o Hotel hoje, é resistência e é vontade que perdura. O mais importante é o que acontece entre vocês, o encontro, as redes, o diálogo e o reabastecimento das forças... É vital fortalecer a pressão popular para as pautas do Livro, Leitura, Literatura e bibliotecas. Para que a nossa cena cultural se fortaleça e amplifique, precisamos participar das gestões e das tomadas de decisões junto ao poder público municipal e estadual. São as políticas públicas que asseguram os nossos direitos.”
A escritora Maria Valéria Rezende fez os anúncios e o chamamento para o próximo Mulherio das Letras (coletivo literário feminista que reúne cerca de sete mil escritoras, editoras, ilustradoras, pesquisadoras e livreiras, entre outras mulheres ligadas à cadeia criativa), marcado para novembro, na Usina Cultural Energisa. Valéria, como escritora — e muito mais como uma divulgadora das letras —, ofereceu a sua casa, um espaço gregário e literário, onde escritores/as e amigos/as reúnem-se para papos e ideias, para dar prosseguimento ao que ela já ativou há alguns anos: o entrosamento/encontro/diálogo entre as mulheres escritoras.
Há algumas semanas, quando um grupo foi criando para esse evento, fiquei impressionada com o número de escritoras. Quase cem! Que beleza! As mulheres sempre escreveram! E, aos poucos, ou aos muitos, foram escrevendo suas entranhas, seus cotidianos, sua imaginação, suas histórias, ficcionais ou biográficas, seus poemas da vida, eróticos, corpo, resistência, devaneios, e tudo o que a literatura permeia, aponta e se basta. Não poderia citar todas aqui, mas algumas: Suzana Gonçalves, Larissa Rodrigues, Mendes, Marineuma de Oliveira, Débora Rosa, Débora Ferraz, Jennifer Trajano, Maria Brasil, Luísa Gadelha, Sandra Raquew, Ana Lia, Nara Limeira, Ana Coutinho, Marília Valengo, Isadora Lira, Wyrlla Rebeca, Cibele Laurentino, Clarissa Moura, Regina Lyra, Valeska Afora, Maria Valéria Resende. Que com a força e os panos coloridos para cobrir as mesas de plástico do hotel Globo, enfileiravam os seus livros, por entre as mangueiras e o por do sol da cidade baixa do rio Sanhauá.
Fiquei impressionada com o número de mulheres tão jovens. Que bom que as meninas estão furando o bloqueio da escrita canônica e pelos anos afora, masculina. Queria muito conhece-las mais de perto, também me apresentar, mas ontem, o encontro era outro. A foto!
E na hora do registro, nos apinhamos na ladeira do Centro Histórico, por entre gargalhadas, dores lombares (algumas mais velhas!), irmandades, carinhos e afetos dessas mulheres que gostam de escrever, e também de fazer política com a literatura. Se mostram. Revidam. Resistem. E Acontecem!
Instagram ▪ @adelaideana
Eu agradeço por ter participado. Adoro conviver com gente jovem. Jovens mulheres. Fico a pensar se tivesse essas oportunidades na minha juventude. Talvez tudo tivesse sido antes. Ou não! E quem há de negar que o tempo é assim lógico? O acaso? A sorte? O prumo? Nada se controla.
Andar por essa região linda do Centro da capital paraibana (há anos não ia) foi também um passeio na memória e nas saudades. A beleza dos coloridos dos casarões abandonados. As cores fortes do casario. A vista magnífica dos telhados (lembrei dos quadros que o artista Flávio Tavares tão bem retratou/retrata). Saudades do Parahyba Café e de tantas noitadas. Da loja de Ritinha e Ramon, na qual eu gostava de garimpar. Saudades do meu pai, com o seu escritório ali na região, e depois na Praça. A visão da igreja de São Pedro Gonçalves, para onde ele gostava de nos levar aos domingos, para ver a missa das 8. Claro que a gente chiava por acordar cedo, mas, já que ia, eu mergulhava no sagrado do ritual.
Naquele dia 9 de julho, enquanto tirava a foto histórica com as mulheres escritoras paraibanas, eu também me arvorei em lembranças do tempo.