Um ano depois, sem a presença física de Walter Galvão no meio de nós, redações de jornais e rádios continuam silenciosas sem en...

Réquiem para Walter Galvão

Um ano depois, sem a presença física de Walter Galvão no meio de nós, redações de jornais e rádios continuam silenciosas sem entender sua partida repentina.

Em junho de 2021, minha filha recebeu dois livros que ele havia publicado no começo do ano, autografados. Dias depois, com a aragem da noite veio a notícia de sua morte, quando recolhíamos lembranças de décadas de múltipla empatia.

Partiu de modo inesperado, sem despedida, carregado pelo vento frio da madrugada.

Acervo familiar
Não chorei a perda do amigo porque todas minhas lágrimas já foram vertidas, mas guardarei o calor da mão tantas vezes estendidas e o abraço como patrimônio de memória. Uma memória alimentada por ideias durante quatro décadas de conversas amenas, fosse nas redações quando trabalhávamos juntos ou durante eventos culturais.

Walter foi uma pessoa que recolheu amizades e as conservou como um presente. Ao tempo da redação de A União, quando funcionava na Rua João Amorim, ele repórter principiante, encontrei-o revelado na experiência da atividade no jornal. Esbanjava conhecimentos em debates culturais e nas conversas durante intervalos da lida. Estivemos juntos em outras redações, sempre com a mesma afinidade e reciprocidade na troca de experiência.

Modelados na convivência alimentada a cada reencontro, sempre estivemos na proximidade das leituras de crônicas, artigos e troca de livros.

Galvão partiu cedo. Relativamente cedo, levando em conta que aos 64 anos de idade, no seu caso, despontava muito vigor para as artes.

@walter.galvao.39
Construtor de textos primorosos, atuou na poesia, na música, na crônica e no jornalismo crítico.

Foi modelo de profissional íntegro e humanista garimpado na riqueza do relacionamento e na sinceridade do abraço, por isso faz muita falta.

A olhar para o que deixou publicado, vemos um homem em buscar de harmonia entre o Cósmico e as pessoas. Sempre preocupado em construir uma sociedade fraterna.

Tinha elevada sensibilidade para a arte de escrever e reconhecia poesia no que observava. Praticava uma poesia construída nas emoções. Poeta que valorizou a vida, sentia as dores dos que não tinham agasalho.

Nunca se teve notícias de que Walter Galvão havia magoado alguém com palavras ou gestos.

Era poeta que retratava a alma, foi grandioso na acolhida de jovens autores e de poetas desolados que buscavam nas páginas dos jornais a acolhida de suas produções.

@clarice.galvao.7
Dono de uma escrita comprometida com as causas do povo, as opiniões dele estarão sempre atuais.

As redações dos jornais sempre precisaram de sua presença, porque na Imprensa atuava com desenvoltura em todas as áreas.

Das páginas dos jornais saiu para o livro com a mesma grandeza, e na vida profissional teve destacada passagem pelo serviço público.

Dotado de excepcional percepção dos meandros da profissão, ele fez prosperar o jornalismo crítico, soube descobrir inquietações da alma e escreveu artigos que ajudam a entender as mudanças da sociedade de sua época. Sem ele, acredito, o jornalismo paraibano empobreceu. Foi jornalista com elevado grau cultural, criterioso na seleção de opiniões, escrevia com clareza para expor suas ideias. Idealista, apontava a literatura como forma de criar a identidade nacional e a poesia como lenitivo.

Mantivemos salutar camaradagem durante décadas. Ele retribuía com expressiva polidez a essa convivência, não apenas comigo, mas com todos os que se aproximavam dele.

Em toda sua vida soube cativar pessoas e junto de si hospedou grandes amizades. Em tudo o que praticava fazia crescer a admiração por ele.

@walter.galvao.39
Calmo, tinha gestos que atravessaram as fronteiras da alma para harmonizar ações fraternas. Uma mente aberta às diversidades, sempre a debater alternativas para o mundo em nossa volta.

Em 1987, publicou pequeno livro “É provocando que a gente se entende”, uma coletânea de textos, espécie de elegia de alguém inconformado, no qual apresenta uma visão social. Seu último livro é justamente um estudo sobre a obra máxima de Karl Marx, “O Capital”. Toda sua obra é um multiverso do pensar crítico. É preciso rever o pensamento de Galvão, tão verdadeiro, tão atual. Não existe muita diferença nos tempos atuais do que ele escreveu em 1987: “O Brasil é um circo de horrores”.

A redação do jornal ficou mais triste, vazia e fria. Há um ano tentamos repor sua ausência na lembrança dos seus gestos protagonizados com elevada simplicidade, e na valorização da amizade que sabia conservar.

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