A manhã do domingo subitamente ensolarado acabara de raiar, envolta no gostoso clima invernal renovado pelas chuvas, quando até os afazeres mais banais se sublimam na magia do momento presente. E eis que percebemos ele chegar, indo direto para um recanto na parede de tijolo. Trazia nos braços uma trouxinha de argila úmida, com a qual começou a modelar um pequeno círculo. Logo vimos que era o alicerce de uma nova casinha.
A destreza sob a qual o marimbondo manipulava o barro com as mandíbulas e ajuda das patinhas era impressionante. Fui logo atrás de um celular, pois aquilo merecia ser registrado. Quando voltei, ele havia sumido, mas a casinha estava lá, iniciada com uma delicada casquinha, em um círculo perfeito.
Logo retornou. E dessa vez, deu para ver mais de perto que havia no bico outra porção de argila. Imediatamente ele retomou o trabalho, numa espantosa sincronia, contorcendo-se em várias posições, concentradíssimo na feição do novo casulo, bem ao lado da porta do nosso depósito.
Sua absorção era tão intensa que não dava importância alguma à nossa presença, mesmo quando eu aproximava a câmera para captar mais de perto o notável acontecimento.
Em poucos minutos, a casinha estava pronta, parecendo um pote de cerâmica em miniatura, com uma pequena abertura em forma de gargalo, colado à parede. Aquele fenômeno, para mim divino, deixou-me encantado pelo resto do dia. A cena sempre voltava à lembrança com emocionada ternura. Ficava imaginando onde ele ia buscar aquela argila…, como sabia traçar um círculo tão perfeito e construir uma coisinha tão linda e delicada como aquela?
À noite, no aconchego da brisa junina, ouvindo o Adagio da Gran Partita de Mozart, concluí: Era Deus que estava ali presente, guiando aquela “obra”, mostrando-nos que o Universo é mesmo um só tecido, com inteligência própria, onipresente. O mesmo Deus que fez Mozart compor o adagio desta partita, tão belo como a casinha do marimbondo.