A necessária prova do café e do vinho. Os amargores diferenes na mesma boca. Um beijo rubro, vermelho, indomável. A alternância da língua...

Café e vinho, amargores

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A necessária prova do café e do vinho. Os amargores diferenes na mesma boca. Um beijo rubro, vermelho, indomável. A alternância da língua a experimentar sabores, amores, odores. Daqui é possível ver tudo, talvez não compreender um mundo, mas mundos. O copo pela metade da negritude inebriante da alma, a taça meio cheia da embriaguez do corpo. Feito sol no Sertão a desfalecer verdades, construir sonoridades ao pé do ouvido, erguer brindes.

Em pequenos intervalos, o aromático amargo do café, o aveludado amargor do tinho vinho quase seco, feito a terra do encontro futuro, provavelmente
Kira Heide
meia molhada pela chuva. É como um clarão de fogueira artificial do outro lado da rua, a embaçar olhos com areia, secreções de céus que entardecem embriagados pela hora e surgem dos grãos amigos do frio.

Ora café, ora vinho, ambos sobreviventes da geada. Preparo para estranhos paladares, do amor louco sem hora marcada. É o encontro do amargor do líquido com a língua, sensorial antena, a deslizar garganta adentro. Olhos que se fecham por um instante, o decifrar de prazeres, gemidos antes do silêncio. Garrafa e bule guardam aromáticos conteúdos. São mais que embalagens, são protetores, elementos fundamentais, guardas de honra para a hora aprazada.

A estranheza da boca é igual aos ouvidos diante dos versos atípicos de um poeta do apocalipse. O café e o vinho, amargos ao extremos, caminhos para se manter lúcido, estradas para a lunática viagem. A delícia molhada meio que desesperada alcança mais distante, dita à noite, ordena a caótica batalha que prossiga, avance pela madrugada até o ordenhar das palavras de um novo dia. A expectativa é vasta, a certeza é rasa, a vontade é plena de se molhar com o amargo. No final, uma pitada de sal da carne doce salgada.

Todd Diemer
A xícara já vazia é o desarmargor que desarma a resistência, a taça de volta ao estado transparente reflete que o tinto se misturou ao sangue. Em ambos os casos, bebidas diluídas pela essência da vontade do desejo. Uma nova configuração até saltar pelos poros ao longo da eterna noite de horas marcadas para se findar. Uma espanta o sono, outra provoca o sonho, ambas levam ao momentâneo gozo.

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