Foi simples assim. Um certo dia, não faz muito tempo, dei-me conta, demo-nos conta - os pessoenses, os turistas, os moradores do bairro - de que simplesmente o mar do Cabo Branco tinha sumido. E o mais estranho é que sabíamos todos que ele estava lá, no lugar de sempre, mas não o víamos, não conseguíamos vê-lo. Fantasia? Pesadelo? Não. Apenas a velha e sempre surpreendente realidade brasileira.
Explicando: quem passa de carro e até mesmo a pé por boa parte da orla do Cabo Branco simplesmente não consegue ver o mar. Ele está ali, a poucos metros, mas encoberto por inúmeras barracas infectas, feias e poluentes, que se enfileiram, uma ao lado da outra, fechando completamente a linda paisagem para os olhos dos nativos e dos turistas, num espetáculo de irresponsabilidade urbanística e de atentado ao bom senso nunca visto aqui e alhures. Verdadeira coisa de louco.
Carlos Ebert
O prejuízo, claro, é dos pessoenses, da cidade e dos turistas, todos privados da vista do mar e de tudo de bom que decorreria se a paisagem estivesse, como deveria estar, desimpedida e livre para os olhos de todos. Perde-se então a linda vista, perde-se a qualidade de vida, perdem-se os turistas e perdem-se os impostos, todo mundo perde, menos uma dúzia de barraqueiros, protegidos não se sabe por quem, os quais simplesmente se apropriaram da orla cabobranquense e da vista do respectivo mar, como se fossem proprietários exclusivos e irresponsáveis de um dos mais belos e valorizados trechos de nosso litoral.
O jornalista Petrônio Souto, aqui mesmo neste blog, já abordou, de forma mais talentosa, esse verdadeiro drama urbano. Ele que, como eu, reside no Cabo Branco, tendo, portanto, conhecimento de causa do assunto, sofredor que é, diariamente, na carne e nos olhos, desse crime de lesa-comunidade, exposto à luz do dia e da lua, impunemente, como se não fosse nada e a cidade, que é de todos, fosse terra de ninguém, ou melhor, pertencesse aos barraqueiros usurpadores da paisagem. Mas como se duvida muito, e com razão, que providências sejam tomadas, concluí que seria bom voltar ao tema, para mostrar aos eventuais leitores, mais uma vez, o quanto é séria essa situação que nos atinge e fere a todos.
Zelma Brito
O Rio de Janeiro está vivendo atualmente problema parecido com o nosso na orla da Barra da Tijuca, zona nobre do litoral carioca. Lá, segundo o cronista Joaquim Ferreira dos Santos, do jornal O Globo, a ocupação predatória dos quiosques à beira mar está simplesmente fechando a vista marítima para quem passa de carro ou passeia a pé naquela praia. Sem falar na sujeira, na poluição visual e sanitária, no acintoso desrespeito às normas municipais e outros absurdos mais, os quais vieram à tona recentemente com o escabroso assassinato do jovem congolês naquela área, de tanta repercussão nacional e internacional. Em Copacabana, Ipanema e Leblon, também existem quiosques na calçada à beira-mar, mas são mais disciplinados, mais espaçados, mais bonitos e limitam-se a vender apenas água de coco e alguns outros poucos itens, não são restaurantes improvisados, como ocorre aqui em João Pessoa.
E o pior é que essas barracas cabobranquenses vivem em permanente processo de expansão, em metástase, estão continuamente crescendo de tamanho, invadindo a areia, sem que a fiscalização municipal se pronuncie, ao contrário do que ocorre em nossas casas, onde uma simples poda de uma árvore atrai logo a visita de fiscais rigorosos. As barracas se expandem sem nenhuma uniformidade arquitetônica e de materiais, cada uma do seu jeito, gerando uma barafunda visual de mau gosto, inacreditável e inadmissível.
ALCR
O que nós, pessoenses, queremos e até exigimos é uma coisa muito simples: a devolução da vista do mar cabobranquense que já está lá, pronta para ser desfrutada por todos – e que às nossas vistas nos roubaram.