Tirante as conquistas da tecnologia no âmbito da saúde, cuja aplicação não depende de mim, sempre emperrei em assimilar e me apropriar do que se louva como progresso tecnológico. Não sou contra, e embora tenha levado muito tempo para mudar de teclado, e veja a um palmo dos olhos o asseio luminoso do texto eletrônico, mesmo assim ainda me ressinto da segurança da linha batida fiche no papel. Por mais rebatido, por mais sujo que tenha terminado o texto datilográfico.
Não uso além de 1 por cento das disponibilidades do celular. As ouças, coitadas, vêm se arranjando graças ao telefone fixo, uma conquista de 1977 instalada na casa 41 da Salvador Batista. Foi festa entre os de casa, combinada a hora para Giovani Montenegro, Nathanael Alves e Lourdes Luna inaugurarem a campainha.
Mas ainda tem o rádio, mesmo que as calçadas e os alpendres do interior mais profundo se liguem hoje e a qualquer instante com o Morro do Alemão ou com algum plantador de café no norte da África.
O rádio talvez escape da superação completa. Vem puro na voz do falante e na música que transmite. Em mangas de camisa, a notícia como ela é, direta, acontecendo quase por si mesma; o gol, o lance de guerra, os mais diversos cenários, ricos ou pobres, sem limites de lente, ao alcance infinito da imaginação.
Nessa expectativa deve pesar muito minha suspeição. Ouvi falar do mundo pelas ondas do rádio, a guerra, a frase de Churchill, o cerco terrível de Berlim, a queda de Getúlio, o gol mortal em interlúdio com as vozes das Batista, de Dalva de Oliveira, de Marlene, tudo despejado no balcão de seu Nequinho por vozes poderosíssimas. Vozes que vinham de longe com as cenas de nitidez que dispensavam o favor da tela e dos nossos olhos. O discurso humano, do locutor ou do orador, era bem mais poderoso.
Na televisão, hoje, eu me limito ao filme, ao jornal da noite e ao "Globo Rural", no qual se vê a melhor aplicação tecnológica dos grandes capitais estrangeiros e nacionais em terras que o poder público continua devendo à reforma agrária.
Em sua coluna da semana passada, Fernando Vasconcelos adverte para o fim do carro popular. O mercado do carro de status, pelo que entendi, é estimulado pela própria política fiscal.
Graças ao bom Deus, a carne seca, o feijão chocha bunda, o queijo de coalho e o cuscuz não entram nisso. E, por milagre, a rapadura.