Seria completa a edição redesenhada de A União desse novo 2 de fevereiro se o telefone houvesse me chamado logo cedo para o “Visse?” de Martinho Moreira Franco. “Visse?” assim como está escrito, apanhado no subjuntivo para a efetividade de uma obra nova aos nossos olhos. Um visse nada estranho à linguagem familiar ou de entre amigos. E vício só raramente evitado, que me lembre, das minhas relações, apenas pelo doutor Celso Mariz, escritor que adoçava a gramática: “Tens alguma novidade? Viste o filme do Vladimir sobre o patriarca?”!
Era quase sempre assim que eu e Martinho Moreira começávamos o dia. A admiração ou o espanto vindo sempre dele, que normalmente se antecipava à leitura e à apuração perspicaz e de quando em quando irônica do que lia. Lia tudo, até editais.
Era assim meu precioso amigo. Definia a página, apontava as chamadas de vitrine, a melhor foto, mas nunca tentou paginar. Arrumar, escolher as vestes, os tipos, não era com ele. Mas vinha dele, da estética de seu olhar, o aprovo definitivo.
Na verdade foi um grande presente esse que os arquitetos gráficos do jornal agregaram à sua rica história. Eu conto de 1951 para cá, eu mesmo no artesanato da página, trabalhando com materiais indúcteis, tentando restaurar ou simplesmente imitar primores de páginas tipográficas de oficinas outras, mais ricas. A União dos anos 1920, que não sei se não era mais bem feita que O País, da capital federal. Ainda alcancei mestres como o impressor Valdemar Nicolau, “chapistas” como José Freire, paginadores como Nelson e Chambrão, gente diretamente vinculada ao fazimento da página. A biblioteca da Academia guarda com o zelo mal pago de suas duas únicas funcionárias, Tânia e Marilene, pequenas relíquias de tintas e linhas seculares das nossas oficinas. Coisas que não podemos pôr as mãos suadas. Revendo os arquivos do jornal é que se pode bem avaliar o salto dado pelo visual de hoje, que já vinha se insinuando desde as mudanças anteriores feitas na presente gestão.
Não fica só no visual. O verdadeiro leitor de jornal, o que demora tempo na reflexão, o que não lê por cima, não demora menos de uma hora para se inteirar do que lhe interessou. Levei mais de duas horas na edição do último domingo. O jornal me situando no jogo de interesses externos sobre a Ucrânia, nação de muitos donos, e, mais próximo de nós, no papel do novo Centro Tecnológico em que foi transformado o Colégio das Neves. E muito mais: querendo me ver livre para ler Hildeberto, Sitônio, as meninas de cabelos grisalhos, lindas meninas, e o noticiário me segurando. De braços abertos para cima, o papel a um palmo dos olhos, e o jornal me prendendo. Uma vontade danada de perguntar a Naná, a William por que não aderir ao tabloide ou ao jornal de Juarez Batista, do tamanho dos franceses e ingleses de hoje? Atenuaria o sacrifício dos meus braços. Mas vem a edição redesenhada, grande e leve, salvando um padrão clássico, histórico, que merece todo o respeito.
Só faltou mesmo o imprimatur do Martinho, que a missa de ano vai lembrar amanhã, e que daqui do meu íntimo estarei com ele.