As caixas das lembranças perdidas no ar reabertas, as figurinhas coladas nas páginas do álbum reavivado, os jornais com o seu nome assinando alguma matéria esquecida e desimportante pelo tempo que já ocorreu e que ganha novo valor. É quase como uma ficha dos antigos orelhões a fazer uma ligação sensorial com o cheiro de uma flor que se joga através dos galhos pelo muro de um residência agora super vigiada por câmeras e cercas eletrificadas, com o cheiro do mar no inverno ou da batida da água da chuva na terra quente e seca.
Fragmentos das memórias que soltam por dentro dos olhos pinicados, em pequenos pedaços, que são reconstituídos pelo arqueólogo indivíduo a usar cola de tempo para unir peças de quebra-cabeças que insistem em pairar em leve aproximação dentro da mente. Uma peça de roupa, um chaveiro, um ingresso para um jogo antigo, muitas fotografias. A fila de acontecimentos cresce ao longo da vida e com ela a significância das coisas. A ela se junta o cometa que era só algo quase imperceptível no céu, que depois explodiu em fogos em algum mês de junho, que revelou os sóis mais belos e e que se avermelhou mais recentemente.
Da infância solta uma roupa, as luzes do parque de diversão de uma festa, o tênis velho e surrado que protegia os pés no intervalo das aulas, um olhar que sumiu e virou poeira cósmica. Coisas que renascem e ressurgem à nossa frente sem evocação aparente. Mas estamos ali num flash maravilhados pela possibilidade de reviver o que já se foi. Percebê-las é manter chamas vivas e esquentar o presente e entender que futuro precisa ser colhido e ser reconsumido quando deixar de ser novidade. Melhor, ser nova a captura atual do pretérito. O que se chama manter viva a lembrança.
E vez por outra é bom abrir a caixa de mensagens do passado. Isso é diferente de viver sempre dentro dela, pois a prisão ao que já se foi é doentio, atua como âncora solta ao leito do mar a segurar o viver. O passado precisa ser um baú enorme onde são guardadas todas as coisas que vão surgindo pelo caminho Vez por outra vamos lá dá uma espiada para conferir se tudo está no lugar e o que podemos trazer de lição para o presente. E aí usamos a “moedinha” com ranhuras e conectamos as coisas. Só por um instante, sem aprisionamentos.
A insignificância aparente de algo pode ser o maravilhamento de alguém. É o estalo dos dedos, o ruído da canção longínqua, a força da luz indireta da luz lunar na calçada de cimento, o tabuleiro de um jogo antigo cuja caixa meio rasgada só reforça a fragmentação da mente. Cada peça tem um valor. Pois, somos um inteiro feito de muitos pedaços construídos durante a vida.