Li, certa vez, uma crônica de Danuza Leão (fui sua fã e leitora na Folha de São Paulo aos domingos, e na Revista mensal Cláudia), na qual ela começava assim: “Momentos são coisas bobas e boas que nos acontecem e que não notamos; se notássemos, poderíamos ser mais felizes”. E ela, então, enumera os seus pequenos instantes de felicidade junto a seus gatos, na praia, no chuveiro etc...
Fiquei a imaginar quais seriam esses meus momentos e, quando dei por mim, a lista não tinha mais fim. O limite das pequenas e grandes coisas cada vez ficava mais tênue. Também refleti que a certeza maior de reconhecer esses instantes só vem com a maturidade. A Juventude tem urgência de grandes acontecimentos, emoções, e resta saber o que é grande, ou será mesmo pequeno?
Munida dessa equação, que se inverte cada vez mais, e gracias a la boa vida, venho há alguns anos desenvolvendo essa filosofia das pequenas coisas. E lá vai a lista dessas minhas pequenas coisas grandiosas:
Antes de qualquer coisa, a capacidade de contemplação, do devaneio e de perambular: Eis a questão!
Percebi que nesta lista, feita meio que aleatória, meus prazeres gastronômicos estiveram em alta... Isto com certeza não é bom sinal... Além de engordar, é sinal de que andei enveredando pelos caminhos da inversão dos prazeres, outros ainda mais saborosos.1
A festa que é o meu quarto. E a delícia da minha cama, principalmente se estou cansada, chegando em casa, ligando o ar e pernas para cima! Em lençóis brancos, pois já tive roupa de cama laranja e até hoje fiquei com fotofobia...2
Tomar café aos domingos. Levantar, fazer meu café de rainha, botar aqueeeela mesa cheia de guloseimas, que cuidadosamente compro aos sábados na P&C ou Bonfim; sentar sem pressa, sozinha, pois todos dormem, e passar horas lendo os jornais do dia. O caderno Cultura do Estadão principalmente...3
A combinação: pão, queijo e vinho tinto. Com pingos ralos de chuva, uma cachaça Serra Limpa com caju, ou ainda vodka Wyborowa com o peixe defumado das saudosas festas de Natal da casa de Tek Kuleska e Teresa Mitsunaga.4
Outra combinação, não etílica: café fresco fortíssimo, pão e queijo coalho assado, e tapioca quentinha.5
Ir a aeroporto! Adoooooooooooooooro! tenho sempre a sensação que estou embarcando para London London, Paris, ou Nova York... Fantasias de uma viajante. Cc. O filme Simplesmente Amor.6
Receber um telefonema surpresa. E beijo na boca! E como era bom ouvir Hum Hum do meu amado quando passava meu batom vermelho rouge/ruby.7
Dirigir pelas BRs cantarolando, ou falando sozinha de coisas boas ou ruins. É , eu falo sozinha...8
Cinema à tarde. Matinê! com direito a café expresso antes ou depois.9
Comprar um brinco novo! (Entenda-se brinco como uma metáfora! Pode ser colar, pulseira, anel, e todos os balangandãs).10
Falar ao fone com as irmãs Bebé, Teca e Claude. E claro com as amigas também. Sobre as coisas boas ou más da vida.11
Almoçar feijão do dia (sem carne nenhuma), com jerimum amassado, pimenta, farofa, arroz e salada verde. E de noite ? sopa de feijão também. Amo esse cardápio do dia a dia.12
Chegar em casa numa sexta à tarde, e ter a casa limpíssima, cheirando à água sanitária, tudo limpo, óleo de peroba. Um bolo de laranja na mesa para o café, e uma sobremesa "Prá Comer” (biscoito champanhe) na geladeira, para o final de semana. Ou ainda aquele pote do doce dos céus na geladeira -
Ambrosia (que mamãe fazia como ninguém).13
Chegar em casa cansada e me esparramar na minha cama querida, assistir à Saia Justa no GNT, nas quartas-feiras, e ao Café Filosófico aos domingos.14
Quando passo o dia arrumando, e me sinto vitoriosíssima, por ter conseguido botar ordem nos armários e estantes. Mas essa alegria só dura até eu tirar a próxima peça. O meu temperamento des-organizada só me dá trégua por alguns instantes...15
Nos tempos de rata de praia, e que eu tinha um prazer imenso de voltar a pé para casa, meio dia, com o sol escaldante nas costas... A vida muda não?16
Nessa mesma praia, depois de torrar ao sol, banho de mar delicioso, a parada no primeiro boteco e o primeiro gole de uma cerva geladíssima, num copo americano...17
Ainda na praia, quando eu ia caminhar sozinha, com minha bolsinha peruana, e dentro dela uma manga espada toda amarelinha ou das pintadas, depois de suar bastante, sentava na beirinha mar para chupá-la com todos os prazeres de uma manhã ensolarada...18
Fazer feira, e escolher meus matos (rúcula, escarola, endívia, alface americana, hortelã, manjericão, alecrim) e outra guloseimas. Se for ao ar livre então...19
Começo de mês. O dia que chegava a Revista Cláudia em casa; quando comprava a Marie Claire, e todas as outras revistas que
sempre gostei (Bravo, Cult, Elle, Bons Flúidos). Adorava parar na Banca do Mag Shopping, e folhear as Revistas; as bregas também: Caras por exemplo! Também me interesso pela vida de Selton Melo e de Wagner Moura... e Brad Pitt e Ralph Fiennes e Javier Bardem e tantos outros do mundo da fantasia.20
Quando dava uma boa aula! “Um lugar Fora de Poder” — como disse Roland Barthes —, onde “a honra é geralmente uma sobra do poder;... a sua subtração, sua parte intocada, em que o professor não tem outra atividade senão a de pesquisar, de falar... e de prazerosamente sonhar alto sua pesquisa...”.21
Quando assistia a uma boa aula. Entenda-se por aula qualquer coisa prazerosa que se escuta: palestra, boa conversa, discussão etc, como era minha aula de Estudos Fílmicos, na pós-graduação em Letras, com a Professora Genilda Azeredo.22
Lia e me deliciava com as crônicas de Martha Medeiros no Caderno do Domingo; ou as de Danuza na Folha; ou Adriana Falcão e Milton Hatoum, no Estadão, assim como as de Bráulio Tavares e Gonzaga Rodrigues no Jornal da Paraíba — hoje n'A União e aqui no ALCR — e Martinho Moreira Franco, também n'A União.23
Não fazer nada! Adoro o ócio! Principalmente se você tem o que fazer fora dele.24
Ir à Livraria Cultura, perambular pelos livros, tomar café com biscoito de nozes (em Recife, hoje extinta), e quando era possível, em São Paulo, e virar livro e filme! E biscoito fino!25
Escrever uma crônica, e dizer no final, Puxa fui eu que escrevi isso? Ficou legal!26
Nos tempos juninos ir ao Mangai para a fartura das canjicas e pamonhas. E Pão de Macaxeira.27
Dançar! Mas aí já estou enveredando pelos graaaaaaaaaaaaaandes prazeres!28
Dormir com os filhos em casa!Ao final da leitura, embaralhem tudo, pois, às vezes, o pequeno prazer é dançar, e o grande, me enrolar no edredom, com um olho na TV e o outro sonhando...